25/11/2019

A Arte Na Geografia Cultural: Explorando o Universo Emocional Por Meio de Imagens

A ARTE NA GEOGRAFIA CULTURAL: EXPLORANDO O UNIVERSO EMOCIONAL POR MEIO DE IMAGENS

                                           FERNANDO FERREIRA PINHEIRO [1]

                                               MARINHO CELESTINO DE SOUZA FILHO[2]

                                           REGINALDO DIÓGENES DE FRANÇA [3]

                                           CARLOS ALBERTO BOSQUÊ JÚNIOR[4]

                                           CLARIDES HENRICH DE BARBA[5]

                                               ARONI MATOS DE OLIVEIRA6

RESUMO

Este artigo, produzido por meio de pesquisa bibliográfica, procura apresentar a Arte na Geografia Cultural, mostrando que é possível obter aprendizagens significativas no espaço escolar, a partir de aspectos artísticos culturais, levando em consideração a leitura das obras de Arte da artista plástica e escritora Rita Queiroz.  

Palavras-chave: Arte. Geografia Cultural. Artista Plástica. Universo Emocional. Imagens.

ABSTRACT

This article, produced through bibliographic research, seeks to present Art in Cultural Geography, showing that it is possible to obtain significant learning in the school space, from cultural artistic aspects, taking into consideration the reading of the works of Art by the plastic artist and writer: Rita Queiroz.

Key Worlds: Art. Cultural geography. Plastic artist. Emotional universe. Images.

1 Introdução

A Arte dialoga com a finalidade de ver o mundo “com outros olhares, ou seja, culmina com uma interpretação crítica e reflexiva sobre o mundo e seus eventos, nesse universo, a globalização causa uma fragmentação étnica, ideológica, fragilizando a identidade dos povos, por isso, um dos objetivos desse estudo é demonstrar que a Arte como ciência constitui teorias aplicáveis numa gama de fatos humanos ricos de análise científica.

Nesse sentido, a Arte engloba todas as criações realizadas pelo ser humano, expressando uma visão sensível de mundo, trazendo-nos uma multiplicidade de significados personificados por meio das obras de Arte, as quais possuem uma enorme carga simbólica.

Assim, de acordo com Geertz (1989), o homem pode ser visto e entendido como ser simbólico. Além disso, em conformidade com Almeida (2005), pesquisador da Geografia Cultural, o território é o lugar do vivido, a partir do percebido e do concebido, ou seja, do mundo vivido. E a Cultura nessa acepção é definida pelas relações históricas de um povo, que dão sentido ao mundo vivido num território que se torna lugar da convivência, porque a Arte além de possuir esse caráter simbólico, ela dialoga com o território, com o espaço, dialogando ainda com a cultura, por meio de sua simbologia que a expressa.

Nessa perspectiva, o espaço a ser discutido, nesse trabalho, é o ambiente escolar, pois a escola é um local propício para ensinar e aprender Arte através da leitura das obras da artista plástica Rita Queiroz, por isso, o principal objetivo desse artigo é fazer um paralelo entre a obra de arte de Rita Queiroz e as possiblidades de leituras em Arte nos espaços escolares, valorizando as identidades regionais em contextos amazônicos. Nesse aspecto, podemos tecer alguns questionamentos, a saber: é possível obter aprendizagens significativas no espaço escolar a partir de aspectos artísticos culturais, levando em consideração a leitura das obras de Arte da artista plástica e escritora Rita Queiroz?

Nesse contexto, construiremos esse texto, considerando-o sob dois aspectos, são eles:  inicialmente, abordaremos questões sobre paisagens, espaço geográfico, territorialidade e identidade cultural fundamentadas na expressividade demonstrada nas pinturas de Rita Queiroz. Após isso, focaremos nas leituras das obras de arte, tecendo algumas reflexões acerca das possibilidades de abordar os conteúdos regionais, a partir do componente curricular Arte.

Por fim, apresentaremos as considerações finais, relacionando-as à observação, leitura e contextualização sistemática das pinturas da artista acima mencionada, como possiblidade de ferramenta didático-pedagógica em sala de aula.

Nessa perspectiva, no item 2 desse trabalho, assinalaremos questões inerentes às representações de identidade e territorialidade nas obras de Arte.

2 Representações de identidade e territorialidade nas obras de arte

De acordo com Serpa (2008), a compreensão geográfica sob o enfoque cultural se desenvolve, a partir dos anos de 1970, com a descoberta da fenomenologia e a nova curiosidade pelo sentido dos lugares. Os estudos sobre espaço vivido oferecem novas perspectivas sobre a variedade do mundo e sobre o modo como ele é percebido, valorizado, pois, Consoante Serpa (2008):

A primeira característica deste tipo de abordagem cultural é a atenção quase exclusiva dada ao indivíduo. O que conta doravante é a experiência direta de cada um, a sua maneira de perceber e sentir as coisas e os seres. O contexto não desaparece, mas ele é concebido como o conjunto das impressões que já modelaram a sua sensibilidade. Assim, torna-se possível compreender uma situação através de um romance e o ambiente de um lugar através de um quadro (SERPA, 2008, p. 20).

 

O estudo da paisagem carregada pelos sentimentos estéticos demonstrada através da visão do artista aparece como um campo de pesquisa, especialmente, interessante. Para Serpa (2008), a abordagem cultural baseada na análise dos processos culturais ou socioculturais não leva à constituição de uma nova subdisciplina, à geografia cultural. Ela conduz a uma reestruturação completa da geografia humana. Ao mesmo tempo, permite levar em conta o papel das representações, a dimensão subjetiva da percepção, o papel da emotividade, dos sentidos e da significação do corpo na vida humana e social. 

Tendo por base o estudo de concepções geográficas, numa acepção cultural, constituindo-se em recursos comunicacionais de leitura e descrição do território. Santos (2002) aponta que a Geografia depende, desde suas origens, de recursos imagéticos, como por exemplo: desenhos de mapas. Nessa direção, com o desenvolvimento de diferentes olhares, acerca da análise geográfica, temos novos recursos, como por exemplo: a fotografia, os desenhos e as pinturas que traduzem o espaço.

Nesse sentido, a instância literal do visível ou aparente é insuficiente para revelar o real, dos processos invisíveis, onde as construções teóricas podem surgir da delicadeza de suas distinções, da subjetividade (GEERTZ, 1989, p. 35), por isso, a definição de cultura é complexa e recebeu diversos significados em diversos contextos e em diferentes territórios. De acordo com Rocha e Almeida (2005), o conceito de cultura mais aceito pela Geografia é o da Antropologia Cultural, pois, esta reconhece que os seres humanos vivem num mundo que foi construído por eles mesmos e nele encontram significado. Os grupos humanos possuem símbolos, língua, costumes, religião, crenças que os distinguem um dos outros. A diferença é que faz a beleza do mosaico dos povos (ROCHA; ALMEIDA, p.3, 2005).

Assim, a partir do estudo das regiões culturais do Brasil é factível classificar as particularidades de cada território, o modo de ocupação do espaço, da economia e da transformação da paisagem, “espaços territoriais definidos por características que dão unidade de ideias, de sentimentos, de estilo de vida a um grupo populacional” (JUNIOR, p.7, 1960). Essa gama de particularidades possibilita identificar um povo e traz o sentido de pertencimento e territorialidade, pois, conforme nos assegura Relph (1980, p. 61), “a identidade do lugar é formada de três componentes inter-relacionados: características físicas ou aparências, atividades observáveis e significados ou símbolos”.

Nos dias atuais, existe uma atualização e sistematização sobre as novas tendências da discussão territorial. Partindo do raciocínio de Boligian (2003), o território pode atuar como facilitador para entendermos conceitos geográficos tais como espaço, região, paisagem e lugar, esses conceitos fundamentais estão em constante diálogo com o território. Considerando as novas leituras de território devido aos debates epistemológicos internos à Geografia, passou-se então ao valorizar a identidade, conforme aponta Claval (2007) os valores tradicionais e a dinamicidade da cultura criam novas situações e redefinem a ideia de identidade com os territórios.

A definição de território é bem mais ampla do que apenas a delimitação, domínio ou gestão de uma área. O território assume agora um papel sociocultural e econômica de territorialidade, onde é constituído ao mesmo tempo pela dimensão material, de produção e apropriação do espaço pelo estado, pela dimensão imaterial, da construção ideológica e do imaginário territorial referente aos discursos e as práticas de identidade regional. Em suma Moraes afirma que o território:

[..] pode ser equacionado como uma construção simbólica, vinculado a um imaginário territorial. Contudo, trata-se também de uma materialidade, produzida pela apropriação material de espaços e dominação efetiva destes. Assim, a formação territorial articula uma dialética entre a construção material e a construção simbólica do espaço, que unifica num mesmo movimento processos econômicos, políticos e culturais. O território material é para as formas de consciência e representação, cujos discursos retroagem no processo de produção material do espaço, com o imaginário territorial comandado a apropriação e exploração dos lugares. (MORAES, 2002, p. 74).

 

Serpa (2008) assevera que o território territorializa-se entre significância e subjetividade, e não no espaço. Por isso, chamamos o território um ato em movimento. Esta operação intelectual, que transforma o território-conceito em um ator-conceito, faz dele um corpo e um sujeito em ação. Assim, o território ganha individualidade e torna- se parceiro dos atores. (SERPA, p. 49, 2008).

Assim, a consubstanciação dessas teorias se dá por meio de fatos, os quais são inerentes à própria construção cultural e do sentido de territorialidade cultural. Nesse sentido, ainda de acordo com Menezes (1999), Rita Queiroz é a representação da mistura da mulher nativa, originária dos seringais rondonienses, com a mulher de hoje, que circula pelas nossas ruas, num misto de floresta com modernidade. Essa mulher convive com a vida moderna e com a arte, levando o mundo ribeirinho além das fronteiras regionais, sem perder a referência cultural. A sua arte é voltada para as imagens regionais, a poeticidade transforma-a em uma cabocla urbana. (MENEZES, p.8, 1999).

Menezes (1999) faz um apontamento que nos chama atenção, quando Rita Queiroz inicia um novo ciclo em sua vida, o urbano. Nesse ciclo, ocorre a mistura de modelos culturais, aflorando nela o perfil artístico. No caso a arte torna a manifestação regional mais evidente, com uma raiz cabocla que incomoda o tipo padrão, essa padronização por muitas vezes lhe impusera apagar os traços regionais por conta dessa “cultura” ser interiorana, caipira e ridícula. Laraia descreve sobre essa visão etnocêntrica que forçosamente conduz ao estranhamento e a negação da cultura do outro:

A nossa herança cultural, desenvolvida através de inúmeras gerações, sempre nos condicionou a reagir depreciativamente em relação ao comportamento daqueles que agem fora dos padrões aceitos pela maioria da comunidade. Por isto, discriminamos o comportamento desviante. (LARAIA, p.35 2001).

 

Para Menezes (1999), Rita Queiroz é a artista do mundo beradeiro, que recria através da arte as paisagens, os lugares, onde a inspiração é a própria natureza, verdadeira mulher rondoniense que transita entre o ribeirinho e o urbano. Segundo Marquez (2006) A análise geográfica é contaminada pelo estar no mundo. A ciência das coisas concretas, segundo o paradigma da geografia moderna, deixa-se invadir por processos externos, ou seja, categorias que ultrapassam as fronteiras disciplinare.

Para Albuquerque e Nascimento (2015, p. 62), o enfoque dessa reflexão é o território simbólico, constituído por um processo de apropriação de um espaço por meio das representações culturais. Nesse aspecto, o imaginário constitui-se no conjunto de representações, crenças, desejos, sentimentos, em termos dos quais o indivíduo ou um grupo de indivíduos vê a realidade e a si mesmo, também constitui essa identidade e esse território, constitui ainda um ramo basilar da culturalidade de um povo, pois, representa a essência imaterial que materializa a cultura. É o imaginário cultural que fundamenta a tradição e nessa perspectiva influi a manifestação física da cultura tanto no espaço (delimitação cultural territorial) quanto na fabricação de utensílios integrantes da cultura.

Hall (2011) explica que territorialidade, no sentido de identidade, é tratada como uma concepção sociológica do sujeito ou do grupo social que não é autônomo, autossuficiente, mas que na verdade há um interacionismo com importantes pessoas, ou outros grupos e onde há uma mediação de valores, sentidos, e símbolos – há cultura.

Isto posto, após os argumentos arrolados, anteriormente, sobre representações de identidade e territorialidade nas obras de arte, trataremos, no item, a posteriori, das questões inerentes às visualidades amazônicas e identidade cultural.

3 Visualidades amazônicas e identidade cultural

Para entrarmos com o trabalho de leitura visual em obras de arte, é importante obtermos uma determinada informação, que consiste na sua “ficha técnica”, de maneira formal, este é um requisito importante, não o mais importante como forma de apreciação, mas também de conhecimento sobre determinada época também acrescenta certa leitura e entendimento dentro das interpretações. As elaborações das análises de fichas técnicas para auxiliar a compreensão do estudo de obras de arte necessitam geralmente de compreendermos: o autor da obra (nome, local e data de nascimento, e data da morte); título da obra; data da obra (ano em que se realizou); dimensões da obra; proveniência da obra (ou lugar onde se encontra atualmente, em museu, coleção); técnica utilizada; ano da produção.

As evidencias apontadas também levam em consideração as abordagens de temáticas que a artista desenvolve dentro das análises de sua Galeria Virtual, com obras relacionadas à temas da Amazônia, Lendas amazônicas, Mulheres, Moderno, Pássaros, Baianas, Catedral, Flores, escultura etc. As temáticas amazônicas e étnicas da formação brasileira estão ligadas ao seu espaço de pioneirismo como migrante e artista, criando magia e encantamento com a natureza, lendas e a história na formação do estado de Rondônia, a religiosidade presente nas figuras vinculadas à arte sacra sem perder os valores místicos.

Barbosa (2010, p. 100), afirma que: “[…] é possível desenvolver a percepção e a imaginação para apreender a realidade do meio ambiente, desenvolver a capacidade crítica, permitindo analisar a realidade percebida e desenvolver a capacidade criadora de maneira a mudar a realidade que foi analisada”.

                 Imagem: 01

Esta obra realizada em 1994, demonstra uma mulher amazônica, com uma roupa azul. Mas também cria interpretação de tristeza e esperança de um dia ser feliz. A casa simples de madeira e pau-a-pique, telhado de palha, mostra a ação humana integrando a natureza ao seu convívio como moradia. Tanto os tons de cores da floresta, quanto do chão em que ela senta, possuem cores relacionadas entre as ocres e tons de cores vermelha e verde.

Existe uma gama de possibilidades interpretativas, onde poderíamos de forma subjetiva compreender a história da artista e sua relação com o mundo ribeirinho. Outra visão estaria relacionada à nossa interpretação, de forma que pudéssemos obter amplas e reflexivas sobre as mulheres na sociedade, seja na área urbana, ou até mesmo em áreas longínquas, aparentemente, apresentando a ilusão de uma vida tranquila e harmônica. Essa assertiva é atestada por Lavelberb (2003), quando nos assevera que:

Ensina-se a gostar de aprender arte com a própria arte, em uma orientação que visa à melhoria das condições de vida humana, em uma perspectiva de promoção de direitos na esfera das culturas (criação e preservação), sem barreiras de classe social, sexo, raça, religião e origem geográfica (LAVELBERG, 2003, p. 12).

 

Na medida em que propomos uma análise visual da obra de arte realizada pelo educando, garantimos abertura para uma imensidão de interpretações, evocamos aspectos de identidade cultural e pertencimento da relação espaço e paisagem. Nessa direção, considerando o enfoque metodológico da abordagem triangular, apontando para a proposta triangular, sugerindo que ela surge de:

[...] uma dupla triangulação. A primeira é de natureza epistemológica, ao designar os componentes do ensino/ aprendizagem por três ações mentalmente e sensorialmente básicas, quais sejam: criação (fazer artístico), leitura da obra de arte e contextualização. A segunda triangulação está na gênese da própria sistematização, originada em uma tríplice influência, na deglutição de três outras abordagens epistemológicas: as Escudas ai Aire Libre mexicanas, o Critical Studies inglês e o Movimento de Apreciação Estética aliado ao DBAE (Discipline Based Art Education) americano (BARBOSA, 1998, p. 34).

Nesse processo, a leitura da imagem se torna real, quando se estabelece relações com a realidade e o contexto presente ou oculto na imagem, na tentativa de compreendê-la e resolvê-la. É um momento criativo, imaginário de transformação e criação, criar autentica o ser, altera o seu cotidiano. O reconhecimento de ser e estar nos remete ao sentimento de pertencimento ao meio amazônico, de modo “a incorporar os elementos estéticos presentes, com a finalidade de ensinar a olhar esteticamente, aprender a utilizar procedimentos de representação, interpretação do meio e valorizar as intervenções ambientais” (HERNANDEZ, 2000, p.196).

Nesse sentido, existe uma possibilidade de abordar questões que refletem a realidade amazônica, da figura do caboclo, do seu contato direto com a floresta e os rios, dos mitos e lendas que permeiam a vida. Finalizando, a leitura visual da obra apresentada acima, nela, a artista relata o drama da mulher beradeira diante de sua vulnerabilidade e, muitas vezes, tratada como “mercadoria, assim como óleo, sal e farinha” (MENEZES, 1999, p. 24).

Assim, após a análise feita, anteriormente, da primeira pintura de arte de Rita de Queiroz, passemos, a seguir, a análise da segunda.

Imagem: 02

Fonte: QUEIROZ, Rita. S/Título. Óleo, Galeria Virtual, 1994.

A obra da imagem 02, demonstra tons de cores que lembram muito Marc Chagal, a obra por mais simples que pareça, possui uma carga semântica carregada de emoções, rica na arte do exercício interpretativo. Aparentemente, intercala-se com a  própria natureza numa relação de quatro olhares diferentes, cujo primeiro olhar manifesta-se claramente sobre o observador, situando-o frente à pintura; o que lhe garante vantagens incomensuráveis de viajar, por meio da obra de arte, aguçando-lhe a percepção para outros olhares, tais como: o pássaro pousado sobre um objeto de criação humana, onde se percebe a harmonia entre ser humano e natureza, por fim, a criança, às margens do rio, culminando com uma triangulação de olhares quase perfeitos.

Além disso, no que tange à ave, à menina, à natureza e às casas, mostra a integração harmônica do homem e da natureza, o homem integrado, inserido, como um animal que se funde com o ecossistema. A cor verde e azul predominante dá um frescor na obra com leve tom de cores quentes no pôr do sol, temperando o clima de isolamento.

Nesse sentido, a análise das obras de Rita Queiroz relembra as mulheres artistas que se destacam na Semana de 1922 e o Modernismo Brasileiro com a sua antropofagia. As características presentes, nas obras da artista, possuem relações comparativas de técnica expressionista, regionalista primitivista e onírica, assim como nas obras de Anita Mafaltti e Marc Chagall, ambos com traços supostamente ingênuos, os quais são típicos dos artistas Naifs.

Assim, as obras de Anita com temáticas simples, rurais, circos e com tratamentos também simples, porém, de uma expressividade ímpar, singular, assemelham-se com as da artista Rita Queiroz, possuindo uma tendência artística expressiva, carregada de sentimentos e fantasias próprios da região. Por isso, essas obras representam a vida cabloca e uma relação mútua de um moldar-se à natureza, “convivendo com a água, assim como convive com a térrea. Se o rio sobe, o caboclo sobe com ele, se o rio escoa, ele recomeça no ritmo imposto pela natureza (MENEZES, 1999, p. 16).

Isto posto, após mostrar a carga expressiva e emotiva, que permeiam as duas obras analisadas, anteriormente, de Rita de Queiroz, veremos, abaixo, uma análise proposta para a primeira obra de Anita Malfatti.

Imagem: 03

      

Fonte: MALFATTI, Anita. Colheita de Ovos. Fazendo Prosa - 40 X 50 cm. Óleo sobre Tela. Década de 1940.

Essa pintura feita a óleo, mostra uma comparação com a obra do artista francês de origem russa, que refugiou da segunda Guerra Mundial, com obras as quais foram degeneradas pelo nazismo, por terem características que fogem às regras neoclássicas valorizadas pela cultura política do regime alemão.

Nesse sentido, segue abaixo uma obra com as características acima demonstradas:

Imagem: 04

Fonte: CHAGALL, Marc. La Mariée. Óleo - 68X53 cm, 1950.

Uma obra que em uma das diversas leituras, lembra muito São Francisco de Assis, mas, neste caso, uma santa ou deusa com poronga na cabeça em vez de coroa, fogo e estrela, com terço de açaí ou sementes da Amazônia, ela caminha junto aos animais na margem do rio. A mãe natureza santa com o vermelho de fertilidade no céu e parte de sua iluminação. A imagem nos faz lembrar a leveza dos traços e características oníricas das obras de Marc Chagal, A Noiva de 1950 é um exemplo da obra do artista que também coloca o vermelho na vestimenta que representa vitalidade, fertilidade, fogo da paixão, fogo da existência, aquele mesmo fogo que Prometeu rouba dos deuses para dá-lo aos homens, enfim, esse vermelho, representa o fogo da existência humana, o calor, o sol, o qual aquece o planeta Terra, impedindo-o de um resfriamento sem precedência, onde, praticamente, nada, iria resistir, sobrevier, outra apologia ao vermelho, dentro dessa mesma perspectiva, seria o vermelho do sangue, da primeira menstruação ou primeira penetração, sugerindo o fogo do sexo, das paixões, da  sensualidade, da existência,  do Gênesis: crescei-vos e, multiplicai-vos.

Assim, o sagrado convive com o profano numa relação paradoxal e metafórica sem precedentes, produzindo na imagens 04, magia e encantamento. Para algumas pessoas conservadoras que analisam a arte ainda de forma mimética do Belo com o que parece natural, a artista mantém esta linha para romper com a visão que tanto imperou nas décadas de 1920 e 1930, não oportunizando outras expressões e obras de diversas formas de interpretação que valorizavam aspectos regionais. Por isso, construção de produções dentro das características das vanguardas potencializaram o aumento de artistas, também a esperança de considerar outras culturas e artes.

[...] as imagens são mediadoras de valores culturais e contém metáforas nascidas da necessidade social de construir significados. Reconhecer essas metáforas e seu valor em diferentes culturas, assim como estabelecer as possibilidades de produzir outras, é uma das finalidades da educação para a compreensão da cultura visual (HERNANDEZ, 2000, p.133).

 

Nesse sentido, considera-se que o recurso imagético descreve as transformações do espaço amazônico, da paisagem e dos lugares e a relação do homem com esses contextos. A concepção de espaço, território e paisagem, aponta a imagem como um recurso comunicacional de leitura e descrição do território.

Assim, a acepção cultural define-se pelas relações históricas de um povo, dando sentido ao mundo vivido e a um espaço territorializado culturalmente.

Isto posto, abaixo, teceremos as Considerações Finais acerca dessa pesquisa.

4  Considerações Finais

As artes sempre estiveram presentes na humanidade, cada um de nós traz em si diferenças únicas, interligadas ao senso estético e artístico, pois, sabemos que a Arte se organiza de forma abrangente por se relacionar de forma intercultural e multicultural, propondo, através dos educadores, atingir interpretações de leituras de mundos, identificando elementos que fortaleçam uma visão mais aprimorada e reflexiva, valorizando os detalhes de uma composição e relação analítica para potencializar uma consciência critico-social sobre os elementos de observação.

A aprendizagem dentro das leituras visuais efetiva a cooperação de valorizações e identidades como maneira de interpretação e ação criativa. Nesse sentido, é importante propiciar aos alunos a realização de atividades de apreciação e leitura que conduzam a uma nova realidade, ou ressignificação dentro de lutas na valorização de suas identidades espaciais e valorização de suas identidades culturais de vivências.

Assim, ao realizar o trabalho de análises das obras da artista pioneira do estado de Rondônia: Rita Queiroz e das identidades de seus povos, esta leitura pretende engrandecer os significados de utilização da leitura nas artes visuais dentro do espaço escolar. Sabemos ainda que existe um grande número de artistas nos livros didáticos e na internet, mas pesquisar e orientar os alunos no aprendizado, principalmente, no Ensino fundamental das artes regionalistas de pessoas que compõem nossa existência local como identidade, é enriquecer nossos critérios de defesa e soberania.

Segundo alguns referenciais da base curricular nacional, a integração do ensino de arte potencializa aspectos sensíveis, afetivos, intuitivos assim como promove a socialização no sentido de proporcionar leituras e julgamentos com melhor base de investigação, tanto no contexto histórico das abordagens femininas, como também no meio ambiente (cujo destaque nos meios de comunicação, informação nos dias de hoje, às vezes o exacerba), demonstrando na obra da artista uma atemporalidade e nas culturas simples que estão se perdendo ou sendo revisitadas, devido ao meio social dinâmico das tecnologias e à falta de privacidade.

Além disso, outa percepção que tivemos ao analisar as obras de Rita de Queiros foi quanto aos temas tratados em suas obras de arte, eles oscilam entre o sagrado e o profano em uma crise que existiu no barroco com o dualismo, observamos ainda que em nossa contemporaneidade vivenciamos embates dualistas, os quais percebidos, por meio dessas obras, nos fazem refletir.

Assim, trabalhar com Rita Queiroz é fecharmos um ciclo de continuidade e de esperança em uma geração que possa valorizar, como ela valoriza, suas visões de forma sensível; nas artes, na literatura, na escultura, visitando concertos, teatros, museus etc, ou seja, tudo que valorize nossa identidade humana, cujo alicerce se embase, especialmente, na cultura artística, local, regional e amazônica.

REFERÊNCIAS

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ALMEIDA, Maria G.; ROCHA, Lurdes B. Cultura, mundo vivido e território. In: SIMPÓSIO NACIONAL SOBRE GEOGRAFIA, Percepção e Cognição do Meio Ambiente. Universidade Estadual de Londrina – UEL, p 1-13, Londrina/PR, 2005.

BARBOSA, Ana Mae. Arte/Educação Contemporânea: Consonâncias Internacionais. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2010.

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CHAVES, Maria R.; Lira, Talita M. Comunidades ribeirinhas na Amazônia: organizações socioculturais e política. Revista Interações, Campo Grande, MS, v. 17, n. 1 p. 66-76, jan/mar, 2016.

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GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1989.

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[1] - Mestrando em Educação Profissional – UNIR – Universidade Federal de Rondônia e, Professor de Arte no IFRO – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia – Campus Ji-Paraná.

[2] - Mestre em Linguística – UNIR – Universidade Federal de Rondônia – Campus Guajará-Mirim e, Professor de Língua Portuguesa no IFRO – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia – Campus Ji-Paraná.

[3] - Mestre em Educação Escolar – UNIR – Universidade Federal de Rondônia – Campus Porto Velho e Professor de Geografia no IFRO – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia – Campus Ji-Paraná.

[4] - Mestrando em Educação Profissional – UNIR – Universidade Federal de Rondônia e, Professor de Arte no IFRO – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia – Campus Ji-Paraná.

[5] - Doutor em Educação e, Professor de Filosofia – UNIR - Universidade Federal de Rondônia – Campus Porto Velho.

6 Mestrando em Educação Profissional – UNIR - Universidade Federal de Rondônia – Campus Porto Velho.

Professor de Educação Física da Rede Pública do Estado de Rondônia

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