07/10/2015

A evolução histórica das Universidades

                                                                        RAIMUNDO SANTIAGO DOS SANTOS - Pós Doutor em Educação (UNTREF-Argentina)

É sabido que desde a pré-história humana são encontrados indícios da presença da educação nos jovens, seja nas sociedades primitivas selvagens e de povos bárbaros, seja nas sociedades mais evoluídas, entre as quais as civilizações agrícolas. Entretanto, ainda não havia o reconhecimento consciente desta prática educativa, no qual indica a diferença nos papéis de classe docente e discente.

O marco histórico nos oportuniza a compreender que a educação exerceu um papel (r)evolutivo. A sua influência sobre a sociedade modelou representações sociais, visões de mundo, papéis sexuais e sociais, mas principalmente, com o incremento dos locais de aprendizagem (Cambi, 1990).

Esta civilização possibilitou o surgimento das Sociedades Hidráulicas, fortemente marcadas pela divisão do trabalho e pela nítida distinção entre as classes sociais. Neste momento, a educação muda profundamente: clama por uma “institucionalização da aprendizagem num local destinado a transmitir a tradição na sua articulação de saberes diversos: a escola” (CAMBI, 1999, p. 61).

Nesse sentido, eis que emerge na sociedade a instituição denominada escola. Na luta pelo espaço social, a educação acenou para um nível mais alto, ou seja, das instituições superiores: as universidades.

É aceito pelos historiadores de que a universidade surgiu na Idade Média, espalhando-se rapidamente por toda a Europa e posteriormente pelo mundo. Desde tempos remotos, a instituição cultivou e transmitiu o saber humano acumulado, desempenhando um importante papel social (WANDERLEY, 2003).

Para Durkheim Bolonha e Paris foram as primeiras universidades na Europa. Bolonha, a mais antiga, datada de 1088, caracterizada como a universidade dos estudantes por sua organização como nações.

No início do século XIII, o papa e os príncipes encaravam essas instituições como importantes pontos de apoio político e cultural. Em função disso, editaram leis e bulas com o objetivo de instituí-las, protegê-las e nelas intervir, tanto no ensino como nas relações entre estudantes e mestres e entre estes e a comunidade.

As principais universidades do século XIII, Paris e Bolonha, foram criadas por essas autoridades. Dois grandes exemplos da influência desses poderes na organização da universidade medieval são a Authentica Habita, de Frederico Barba Roxa, de 1158, e a bula de Gregório IX intitulada Parens scientiarum universitas, de 1231. Ambas foram promulgadas para proteger a vida e os interesses dos estudantes e mestres e para organizar a vida acadêmica. No início do século XIII, o papa e os príncipes encaravam essas instituições como importantes pontos de apoio político e cultural. Em função disso, editaram leis e bulas com o objetivo de instituí-las, protegê-las e nelas intervir, tanto no ensino como nas relações entre estudantes e mestres e entre estes e a comunidade.

A Universidade de Paris, a mais importante, criada no século XII, serviu de modelo para as outras instituições, oficializada em 1200, implantada dentro dos estabelecimentos religiosos, igrejas ou mosteiros, sendo submetida aos regulamentos e disciplinas da Igreja. Estimulada pela localização geográfica e pela presença da administração real, a Universidade de Paris cresce vertinosamente, atraindo alunos do interior da França e estrangeiros.

A corporação, denominação que era outorgada à Universidade, se forma em 1150, no século XII, e adquire o título de Estudos Gerais, onde a Teologia é a mais importante de todas. Já no século XIII está consolidada, formando a Corporação dos Mestres Parisienses (1262) ou Universitas Magistrorum et Scholarium, formada de alunos e professores, mas os mestres predominavam. Este local de estudos recebe alunos de todas as nações tendo então o reconhecimento oficial da mais alta autoridade civil, o Papa, normalmente por meio de uma bula.

O surgimento das primeiras universidades, na virada dos séculos XII e XIII, é um momento capital da história cultural do Ocidente medieval (...). Pode-se compreender que ela comportou, em relação à época precedente, elementos de continuidade e elementos de ruptura. Os primeiros devem ser buscados na localização urbana, no conteúdo dos ensinamentos, no papel social atribuído aos homens de saber. Os elementos de ruptura foram inicialmente de ordem institucional. Mesmo que se imponham aproximações entre o sistema universitário e outras formas contemporâneas de vida associativa e comunitária (confrarias, profissões, comunas), este sistema era, no entanto, no domínio das instituições educativas, totalmente novo e original, (...) o agrupamento dos mestres e/ou dos estudantes em comunidades autônomas reconhecidas e protegidas pelas mais altas autoridades leigas e religiosas daquele tempo, permitiu tanto progressos consideráveis no domínio dos métodos de trabalho intelectual e da difusão dos conhecimentos quanto uma inserção muito mais eficiente das pessoas de saber na sociedade da época (VERGER, 2001, p. 191).         

Giles (1987) destaca que os estudantes agrupavam-se em bairros onde residiam. O método de ensino era o da lição, ou seja, leitura e comentários pelo mestre e discussão entre os estudantes do que o mestre propunha. Este era o profissional que tinha sido admitido à corporação dos ensinantes, maior de 21 anos, com no mínimo 6 anos de estudo e defesa de um debate público, passando pelos 3 graus: bacharelado, licenciatura e mestrado.

A incepção ou etapa final dava-lhe a condição de ensinar em qualquer lugar do mundo, com aprovação pontifícia. Os que, pela dificuldade do processo não conseguissem chegar à etapa final, tornavam-se ensinantes nas escolas primárias ou elementares (GILES, 1987).

Conforme Rossato (2005), as Universidades de Paris possuíam um governo democrático, estavam localizadas em centros de população e possuíam privilégios especiais legais e pecuniários, entre eles: a colação de grau era a licença para ensinar, antes somente concedida pela igreja; possuíam já nesta época o direito de greve, de recessão ou de mudar a universidade - caso os privilégios fossem infringidos -; isenção dos estudantes do serviço oficial e de impostos; e, o mais importante, o de jurisdição interna, ou seja, o de julgar seus membros em todos os casos civis e em muitos criminais.

Os livros eram raros e seu custo bastante alto, por isso o estudante dependia das aulas para receber conhecimento. Muitas vezes os textos eram lidos e ditados pelos mestres para que os estudantes pudessem ter acesso a eles. A aula era dirigida por um estudante como atividade prática, visando ao exame de licenciatura (MONROE, 1979).

Outra técnica era o debate público onde o mestre ou aluno defendia determinada posição e explorava as consequências jurídicas e teológicas do tema. Os horários de aulas eram bem concentrados, bem como os estudos.

Relativo aos graus do ensino, o jovem de 13-14 anos que desejasse se preparar para ensinar ou aprender as artes liberais era obrigado a se ligar a um mestre responsável que o ensinava, num período de 3 a 7 anos, a ler textos de gramática, retórica e lógica, definir palavras, determinar o significado das frases e a usar termos e classificações. Seguindo com seus estudos já podia, sob a direção de um mestre dar instrução aos meninos mais jovens (MONROE, 1979).

Após esta etapa, já dominando os textos obrigatórios e o jogo das disputas lógicas (ciências exatas), era-lhe permitido, em público, defender a sua tese que era arguida pelo mestre. Sendo aprovado, recebia o grau chamado de licença, título de mestre ou doutorado, que eram termos sinônimos durante os primórdios do ensino universitário. Estava apto a participar da corporação dos mestres (MONROE, 1979).

Sob esse prisma de análise, temos uma visão metodológica da educação universitária da época:

 A educação universitária, a princípio, era totalmente livresca, feita por uma seleção muito limitada de livros em cada campo, livros que eram aceitos como se suas palavras fossem a absoluta e última verdade. Era dirigida muito mais para o domínio do poder dos discursos formais, especialmente argumentação, do que para a aquisição de conhecimento ou para a busca da verdade no sentido mais amplo, ou mesmo para familiarizar o estudante com aquelas fontes literárias do saber que, embora ao seu alcance, estavam fora da aprovação eclesiástica ortodoxa (MONROE, 1979, p. 133).

A influência política das universidades foi notável como primeiro exemplo de organização puramente democrática. Os assuntos políticos, eclesiásticos e teológicos eram livremente debatidos, embora se percebesse a inclinação para as classes privilegiadas. A autoridade política da universidade na época fez com que ela tivesse voz no governo. E, ainda mais, sua maior influência deu-se em relação à vida intelectual, antes restrita, formal e pobre, viu-se reconhecida em igualdade com a Igreja, o Estado e a Nobreza (MONROE, 1979).

Na análise das origens das universidades na Idade Média, dois fatos históricos se destacam. O primeiro diz respeito ao conflito político entre os poderes laico e eclesiástico. O segundo liga-se à disseminação do pensamento aristotélico no Ocidente.

Os estudiosos são unânimes em afirmar que diversos acontecimentos interferiram e estimularam o nascimento dessas instituições, como o renascimento das cidades, o desenvolvimento das corporações de ofícios, o florescimento do comércio, o aparecimento do mercador. Existem análises que vinculam as universidades medievais às escolas árabes; outras afiançam que as universidades são filhas das escolas do século XII, dentre as quais a vitoriana e a de Pedro Abelardo.

Há ainda outras interpretações, segundo as quais as universidades somente poderiam ter nascido no século XIII, o século das corporações de ofício. Contudo, a disputa pelo poder entre a realeza e o papado, que reivindicavam o governo da sociedade, influenciou sobremaneira o surgimento das universidades.

Enquanto na França e na Inglaterra as universidades deviam suas origens à Igreja, na Itália a origem das universidades foi secular, motivada pelas necessidades práticas da burguesia urbana. Por esta razão, nelas predominavam, sobretudo, o Direito.

A universidade, não menos do que a Igreja Romana e a hierarquia feudal encabeçada pelo Imperador Romano, representa uma tentativa de concretizar um ideal de vida em um dos seus aspectos. Ideais convertem-se em grandes forças históricas pela sua corporificação em instituições. O poder de corporificar seus ideais era o gênio peculiar do pensamento medieval, assim como seu defeito mais evidente assenta-se na correspondente tendência para materializá-los (...). Nossa atenção estará voltada em sua maior parte confinada às primeiras e típicas universidades (...) quando nós comparamos Bolonha com Paris e Paris com Oxford e Praga, verificamos que as universidades de todos os países e de todas as épocas são, na realidade, adaptações, sob várias condições, de uma e mesma instituição (RASHDALL apud OLIVEIRA, 2007, p. 117).

Giles (1987) ressalta a relevância da interferência das universidades no significativo progresso e desenvolvimento intelectual da Europa, cujos reflexos são sentidos nos dias de hoje, dizendo que, é nas universidades que o acervo dos conhecimentos se organiza se conserva e se transmite.

A universidade é o verdadeiro centro da atividade intelectual onde o processo educativo progride mais do que em qualquer outra instituição. A função da universidade como casa de liberdade intelectual, numa época altamente desconfiada de qualquer suspeita de heresia, é de máxima importância. É o único lugar onde assuntos proibidos ou suspeitos podem ser discutidos com certa impunidade. (GILES 1987, p.63).

A universidade se tornou uma instituição universal; gerou uma multiplicidade de modelos; renovou-se na gestão, estimulada por condições sociais emergentes; flexibilizando a formação, ao lado de novas áreas de conhecimento; desenvolveu a educação à distância; cresceu na área politécnica, acompanhando o intercâmbio nos continentes e entre estes, em alguns países ocorreu o crescimento da autonomia da instituição; e, por fim, a pesquisa cresceu nas universidades, aumentando sua credibilidade.

Finalizando, observa-se que nos países em desenvolvimento a universidade apresentou notável expansão, deixou de pertencer a uma pequena parcela dos estudantes, constituindo-se, muitas vezes, numa esperança de transformação do quadro socioeconômico e passando a ser colocada no centro das preocupações políticas. 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 GILES, T R. História da educação. São Paulo: Pedagógica e Universitária Ltda., 1987.

MONROE, Paul. História da educação. São Paulo: Ed. Nacional, 1979.

ROSSATO, Ricardo. Universidade: nove séculos de História. Passo Fundo: UPF, 2005

WANDERLEY, L. E. W. O que é universidade? São Paulo: Brasiliense, 2003.

 

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