09/02/2007

A importância da merenda escolar na formação de bons hábitos alimentares

Em fevereiro, a garotada volta às aulas e a merenda escolar volta a preocupar pais e educadores. Hoje, são poucas as crianças que levam lanche de casa. A maioria dos estudantes da rede pública de ensino tem merenda escolar garantida pelo Governo Federal, enquanto os alunos da rede privada compram seus lanches em cantinas escolares. "É importante participar dos processos decisórios que definem esta refeição através das Associações de Pais e Mestres. Por ser diária e introduzida tão cedo na vida das crianças, a merenda escolar é uma das formas delas terem noções de alimentação saudável, cultivo e preparo de alimentos, e podem favorecer, ou não, a formação de bons hábitos alimentares", afirma a endocrinologista Ellen Simone Paiva, diretora do Citen, Centro Integrado de Terapia Nutricional.

Atualmente, as crianças têm no leite materno o primeiro e talvez o último vínculo com o alimento caseiro. Muito cedo, elas passam a se alimentar nas creches e escolinhas, e por lá passam a maior parte do dia, longe da mesa de refeição de casa e dos hábitos alimentares de seus pais. Daí, seguem comendo fora, nas escolas, sem que seus pais possam influenciar em suas escolhas. "Como podemos negligenciar o poder de tais refeições? Como podemos relegar a terceiros a formação dos hábitos alimentares das nossas crianças? Como podemos ajudá-las a criar um vínculo com os alimentos saudáveis, antes que elas se rendam à sedução do sabor dos alimentos industrializados?", questiona a médica.

No Brasil, a merenda escolar surgiu como uma iniciativa da comunidade, inicialmente era mantida pelos contribuintes da "Caixa Escolar", hoje Associação de Pais e Mestres. A "sopa escolar" era preparada nas residências das famílias e levadas até as escolas antes da década de 30. Naquela época, a merenda não se preocupava com a nutrição infantil, e, sim, em minimizar a fome no período escolar. Na década de 40, foi criado o Programa de Merenda Escolar, pelo Governo Federal, já com a preocupação de atender às necessidades nutricionais das crianças. Atualmente, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) estabelece que o cardápio das escolas deverá ser elaborado por nutricionistas, com acompanhamento do Conselho de Alimentação Escolar. Todos os alunos de creches e pré-escolas e da 1ª à 8ª série do ensino fundamental, inclusive indígenas, têm o direito de receber uma refeição por dia nas escolas públicas de todo o país. "O cardápio deverá ser programado de modo a suprir, no mínimo 15% das necessidades nutricionais diárias dos alunos de creche, pré-escola e ensino fundamental", explica a médica, quem também é nutróloga.

Além dos resultados do PNAE, naturalmente heterogêneos, e de difícil fiscalização em nosso país continental, iniciativas regionais buscam melhorar a qualidade nutricional e o sabor da merenda escolar, tornando-a mais versátil através do uso de fontes regionais de alimentos, buscando maior aceitação por parte das crianças, sem aumento no custo, e, ainda, estimulando a produção local. Para estimular esta prática, o Governo Federal instituiu o Prêmio Gestor Eficiente da Merenda Escolar com o objetivo de destacar os prefeitos que realizam gestões criativas e responsáveis do PNAE para que sirvam de modelos a outras prefeituras, de forma que os recursos da alimentação escolar sejam efetivamente gastos em merenda de qualidade e em quantidade suficientes para os alunos do sistema público de ensino.

Em Manaus, seis novos produtos alimentícios passarão a fazer parte do cardápio dos alunos das escolas estaduais neste ano letivo. Por meio do Programa de Regionalização da Merenda Escolar, o Preme, os estudantes terão acesso a picadinho de carne bovina e de peixe, feijão, arroz tipo um, banana pacovã e rapadurinha. Com isso haverá um aumento de 40% no total de famílias produtoras que passarão a fornecer a merenda escolar para 220 escolas estaduais da capital e de 23 municípios, chegando a mais de 200 mil estudantes. Em Alto Paraíso (GO), o investimento tem sido na qualificação das merendeiras, dos professores e dos pais de alunos, que vêm participando de oficinas de educação nutricional e de técnicas de preparo de alimentos regionais.

A alimentação também entrou para os currículos, com a criação do Projeto de Hortas Escolares, em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO). O piloto deste projeto está funcionando em três cidades brasileiras – Bagé (RS), Saubara (BA) e Santo Antônio do Descoberto (GO) – e será estendido para outros municípios brasileiros, a partir do próximo ano. Em Joinvile (SC), há um programa que funciona em parceria com o Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional que possibilita a compra de hortifrutigranjeiros de 54 produtores locais para a produção de merenda escolar. Além disso, mais de 90% das escolas possuem hortas. Há também uma cozinha experimental, onde três nutricionistas testam todos os cardápios e dispensam atenção especial à capacitação das merendeiras locais.

Além dos exemplos citados, as escolas públicas do Brasil devem se submeter à legislação federal, que exige que o cardápio atenda às necessidades energéticas dos estudantes. "O problema, muitas vezes, está no cardápio, muito simples e repetitivo, pobre em micronutrientes (frutas e verduras 1x por semana) e no corpo de profissionais pouco qualificado para preparar a merenda", diz Ellen Paiva. Mesmo assim, para muitas famílias de baixa renda, a merenda escolar é a única refeição definida e balanceada que a criança pode contar durante o dia.

As cantinas escolares

Até a década de 70, a maioria das crianças da rede privada de ensino contava com mochila e lancheira. Na hora do recreio, todos comiam o lanche preparado em casa, geralmente, pão e leite com achocolatado. Com o passar do tempo, passou a ser o maior "mico" o lanche trazido de casa e as cantinas passaram a ter a preferência da criançada, na hora da alimentação. "Assim, os refrigerantes, os salgadinhos fritos e industrializados, os sanduíches, as bolachas recheadas, os chocolates, os sorvetes e até as pizzas passaram a não ter concorrentes no paladar das crianças", afirma nutricionista do Citen, Amanda Epifanio.

Em pouco tempo, já não se vendiam lancheiras. As cantinas passaram a imperar nas escolas, e, como resultado, os estudantes passaram a apresentar sinais alarmantes de obesidade e suas conseqüências, como diabetes, colesterol, hipertensão arterial e transtornos alimentares como nunca vistos. "Em casa, os pais não entendem o porquê eles não querem mais comer frutas e rejeitam a comida da família. Tudo passou a ser muito sem graça, frente ao hambúrguer, à batata frita, ao salgadinho. Sem refrigerante, nem pensar!", afirma Amanda Epifanio.

Diante de tamanho problema, iniciaram-se mudanças na organização das cantinas de algumas escolas da rede privada de ensino. O movimento parece estar ganhando força através da adesão de muitas instituições de ensino e das Associações de Pais e Mestres, que vêm controlando a venda dos alimentos nas cantinas escolares. Além disso, a rede pública não pode ficar atrás, pelo menos no Estado de São Paulo, onde a Secretaria Estadual de Educação instituiu uma Portaria, datada de 23 de março de 2005, com novas "Normas para o Funcionamento das Cantinas Escolares" que entre outras coisas procura controlar a venda de alimentos considerados deletérios para a saúde das crianças, permitindo a comercialização dos seguintes alimentos:

I - frutas, legumes e verduras;

II - sanduíches, pães, bolos, tortas e salgados e doces assados ou naturais: esfiha aberta ou fechada, coxinha e risoles assados, pão de batata, enroladinho, torta, quiche, fogazza assada, entre outros produtos similares;

III - produtos a base de fibras: barras de cereais, cereais matinais, arroz integral, pães, bolos, tortas, biscoitos;

IV - barras de chocolate menores de 30 g ou mista com frutas ou fibras;

V - suco de polpa de fruta ou natural;

VI - bebidas lácteas: sabor chocolate, morango, coco, capuccino, aveia, vitamina de frutas, entre outros produtos similares;

VII - bebidas ou alimentos à base de extratos ou fermentados (soja, leite, entre outros)".

A merenda escolar não é uma preocupação apenas no Brasil. Vozes isoladas, mas audíveis pela força de sua juventude e de sua celebridade estão ecoando pelo mundo, não só falando, mas agindo e apelando às autoridades governamentais por mudanças na formulação da merenda escolar, promovendo a formação e a capacitação de profissionais para essa mudança. Dentre essas vozes, destacamos a do jovem chefe de cozinha britânico, Jamie Oliver, que tem se dedicado a banir o "junk food", ou lixo alimentar, das cantinas escolares da Inglaterra. Ele acredita que os cardápios escolares influenciam os hábitos alimentares das crianças pelo resto da vida e que elas deveriam ter noções de cozinha como matéria curricular.

Em pesquisa realizada na Grã-Bretanha, ¾ dos pais de crianças com menos de 16 anos alegam que se empenham para que seus filhos tenham uma dieta saudável, mas somente a metade dos entrevistados disse se preocupar em dar explicações às crianças o que significa uma alimentação saudável. Em 2005, Olivier iniciou uma campanha através de seu programa de televisão alertando para a má qualidade das merendas escolares. A campanha surtiu efeito e o governo inglês decidiu investir 280 milhões de libras para melhorar a merenda escolar.

O que levar na lancheira?

Nos casos mais raros em que a mãe ainda pode preparar o lanche, nada melhor do que um sanduíche com um suco. A equipe de Nutrição do Citen recomenda aos pais e professores que:

1 – Evitem os salgadinhos industrializados. Apesar de práticos e baratos eles costumam ter muita gordura trans, muito sal, nada de nutrientes e, o que é pior, criam um hábito que dificilmente pais e professores irão conseguir tirar;

2 - O pão deve ser o carboidrato de todo o dia. Varie o sabor usando os vários tipos de pão de forma, as bisnaguinhas, o pão francês e tantos outros. Evite os croissants, os biscoitos recheados, os waffles, pois estes "ganham as crianças" pelo sabor, mas são ricos em gordura e tudo parece sem graça, após o seu consumo;

3 – Para completar os sanduíches, utilize o queijo em suas mais diversas formas, um embutido que agrade ao gosto da criança, uma vez que temos versões magras muito convenientes;

4 - Os sucos de frutas em caixinha são práticos para serem levados à escola, além de nutritivos;

5 – Os achocolatados em caixinha podem ser uma opção ao suco, uma vez que o consumo do leite deve ser sempre incentivado, por seu alto teor de em cálcio para quem está em crescimento;

6 – As frutas podem ser enviadas para a escola, quando as crianças as apreciam. Nem todas gostam de frutas na escola e isso deve ser respeitado para que essa imposição não crie uma rejeição.

"Desde cedo, as crianças estão atentas ao mundo em seu redor. Aprendem tudo com facilidade. Suas primeiras refeições são determinantes para formar seus futuros hábitos alimentares, além de garantirem condições de saúde para crescerem e se tornarem adultos que saberão fazer escolhas mais saudáveis", defende a endocrinologista Ellen Simone Paiva.

SERVIÇO
CITEN - Centro Integrado de Terapia Nutricional
Endereço: Rua Vergueiro, 2564.
Conjuntos 63 e 64
Vila Mariana
São Paulo-SP

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