16/12/2013

Comunidades Indígenas, Paisagem Cultural e Promoção de Saúde Cultural: O Caso de Santa Maria/RS

Resumo

A colonização europeia quase levou à extinção os povos indígenas em nosso continente. Atualmente seus remanescentes lutam pela preservação da própria cultura e do simples direito de existirem. O objetivo principal deste trabalho é apresentar uma singela reflexão sobre a questão das comunidades indígenas, particularmente o caso de Santa Maria, na perspectiva da preservação da Paisagem Cultura e promoção de Saúde Cultural, através de uma revisão exploratória da literatura existente sobre o tema.

 

Palavras-chave: Comunidades Indígenas, Patrimônio Cultura, Paisagem Cultural, Saúde Cultural

 

Introdução

Descendentes de populações advindas da Ásia, os povos indígenas habitam a América do Sul há cerca de 11 a 12,5 mil anos. Estas populações desenvolveram diferentes modos de uso e manejo dos recursos naturais e formas de organização social distintas entre si. No Brasil, a presença humana está documentada no período situado entre 11 e 12 mil anos atrás. Mas novas evidências têm sido encontradas na Bahia e no Piauí que evidenciam uma ocupação ainda mais longínqua, mesmoq ue ainda não seja esta uma questão consensual entre os arqueólogos, conforme a Fundação Nacional do Índio (2011).

A colonização europeia levou à extinção muitas sociedades indígenas que viviam no território dominado, seja pela ação das armas, seja em decorrência do contágio por doenças trazidas dos países distantes, ou, ainda, pela aplicação de políticas visando à "assimilação" dos índios à nova sociedade implantada, com forte influência europeia, segundo a Fundação Nacional do Índio (2012).

Embora não se saiba exatamente quantas sociedades indígenas existiam no Brasil à época da chegada dos europeus, há estimativas sobre o número de habitantes nativos naquele tempo, que variam de 1 a 10 milhões de indivíduos. O mapa da distribuição das populações indígenas no território brasileiro está claramente relacionado ao movimento de expansão político-econômica ocorrido historicamente, de acordo com a Fundação Nacional do Índio (2011).A aldeia indígena Mbyá Guarani de Santa Maria/RS foi a primeira aldeia indígena no município. Até então, os indígenas estavam acampados às margem da BR-392, entre os quilômetros 339 e 340, localidade de Arenal. A luta dos índios redundou na ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal, onde estes conquistaram uma área de 77 hectares de propriedade do Estado do Rio Grande do Sul, no Distrito Industrial da cidade. De acordo com dados da Funai, a comunidade é composta por aproximadamente 40 índios, sendo quase a metade crianças, que anteriormente se encontravam às margens da BR 392 há pelo menos 30 anos. Após a conquista deste espaço a Funai foi obrigada por decisão judicial, a fornecer materiais necessários à construção, este realizado em regime de mutirão pelos próprios indígenas, sendo construído nove casas de maneira, com banheiro coletivo e tanques para o asseio pessoal e de vestuários, instalação de caixa(s) d'água suficientes ao abastecimento, bem como medidas necessárias à instalação de rede elétrica e hidrossanitária, segundo o Ministério Público Federal (2012).

O pretende artigo pretende apresentar uma singela reflexão sobre a questão das comunidades, em particular as de Santa Maria, com enfoque na preservação da Paisagem Cultura e promoção de Saúde Cultural através de uma revisão exploratória da literatura.

 

A questão indígena na vira do Século XIX para o Século XX

A história da Política Indigenista brasileira nos permite evidenciar a necessidade de respeito à cultura dos povos indígenas. A mudança de abordagem ocorrida na vira do Século XIX para o Século XX é um registo importante a se considerado.

Segundo Ribeiro (1982), nada foi feito no Brasil para regulamentar as relações com os índios no primeiros 20 anos da República. No início do Século XX, quando da criação do Serviço de Proteção aos Índios, largas faixas do território nacional acessíveis com um ou dois dias de viagem estavam interditadas para atividade econômica em virtude de conflitos com tribos indígenas. O assunto se tornou primeira página da agenda política nacional. O governo federal cogitava o envio do exército para resolver o conflito. Naquele momento, o conflito entre indígenas e a ocupação não-indígena se dava em torno da construção das ferrovias, das plantações de café e das terras entregues aos colonos estrangeiros. Dentre os casos estava a Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, interrompida em São Paulo pelos índios Kaingáng, em Minas e no Espírito Santo, onde os índios Botocudos se insurgiram contra o desmatamento do seu território. No estado do Paraná e de Santa Catarina, os índios Xokleng eram chacinados por bugreiros profissionais, para seder espaço aos imigrantes italianos e alemães, com apoio dos cofres estatais e com a pressão dos países de origem dos colonizadores. Nas palavras de Ribeiro (1982) “o extermínio não era apenas praticado, mas defendido e reclamado como remédio indispensável à segurança dos que 'construíam uma civilização no interior do Brasil'”.De acordo com Ribeiro (1982), a oposição ao extermínio não se resumiu à resistência indígena, surgiu também no meio urbano. Em José de Alencar e Gonçalves Dias o índio aparece como um personagem idílico ou o ancestral generoso, enquanto predomina no interior uma imagem de fera indomada que controlava a terra virgem, um inimigo que o colonizados precisava imaginar feroz e inumano, justificando a sua própria ferocidade.

Conforme Ribeiro (1982), inicialmente a contestação apareceu na imprensa como descrições de chacinas e apelos por providência do governo. Mas foi se avolumando e ganhando a ganhando adeptos empenhados que se desenvolveram criando associações de defesa dos índios. A questão chegou à intelectualidade. Em 1909, o Congresso de Geografia, por exemplo, foi tomado pela discussão. Opondo-se ao extermínio, o movimento urbano solidário à resistência indígena impôs a transformação da questão indígena no assunto do dia.

O realidade urbana do movimento não implica que todo o meio urbano estivesse homogeneamente sensibilizado com a barbárie cometida contra os povos indígenas. Como destaca o Ribeiro (1982), Hermann von Ihering, renomado cientista e Diretor do Museu Paulista, tomou posição favorável ao extermínio, justificando-o como único meio para colonização do sertão. Tal posição causou revolta no meio urbano e contribuiu fortemente na tomada de posição frente ao problema, assim como fortaleceu a posição persuasiva defendida por Rondon.

É preciso levar em consideração, de acordo com Ribeiro (1982,), que o problema não é simples. Para o pensamento urbano da época o índio é idealizado como o bom selvagem inspirado em Rousseau. Este índio idealizado é visto sendo massacrado no artigo de Ihering e não o índio do conflito real. Ao mesmo tempo, Ihering toma posição acompanhando a situação dos colonos alemães de Santa Catarina, que exigiam uma solução para o problema da colonização: o índio. Ou seja, não era apenas uma questão de método e sim um problema resultante da colonização. O que não anula nem justifica a tomada de posição de Ihering em favor dos colonos, evolucionista haeckeliano para quem os “fracos” devem ceder lugar por um imperativo da leis naturais.

O debate impulsionada passa a engendrar proposta para superar a questão. Conforme Ribeiro (1982), surgem duas propostas distintas, uma religiosa que defendia a catequese católica como única solução e outra leiga que apresentava a assistência protetora como dever do Estado.

A proposta religiosa havia perdido qualquer capacidade de se viabilizar concretamente havia mais de um século, de cordo com Ribeiro (1982). O fracasso da proposta religiosa acabou por fortalece a proposta leiga de assistência protetora.

Ribeiro (1982) relata registra influência dos positivistas – influenciados pelo evolucionismo humanista de Augusto Comte – na nova Política Indigenista, tendo Rondon como principal expoente. Para o positivistas as nações indígenas evoluiriam espontaneamente caso fossem libertas das pressões esternas e amparadas pelo Governo. A Comissão Rondon aplicou conscientemente naprática as ideias de Comte no terreno militar, utilizando o exército na construção de obras civis e superando utilização da coerção pela armas como único método de relação com o indígenas. As demonstrações práticas de Rondon derrubaram por terra as teses antigas segundo as quais os índios eram incapazes para a civilização e portanto o uso da força era o único expediente utilizável.

O posição positivista se destaca e o Governo convida Rondon para dirigir a instituição federal de assistência aos índios, mas Rondon condiciona seu aceite à aprovação governamental dos princípios já compendiados compendiados em 1822 por José Bonifácio de Andrade e Silva, mas nunca realizados. Rondon e equipe levam em consideração o acúmulo reflexivo sobre o assunto, inclusive o estudo do Gen. Couto Magalhães, bastante crítico aos resultados produzidos pelos métodos tradicionais, que na maioria das vezes tornavam o índio catequizado um sujeito alheio a tudo, sem costumes originais, sem historiadores – pois suas histórias eram contadas por aquele que, a pretexto de religião, querem viver às suas custas – vivendo numa espécie de escravidão, segundo Ribeiro (1982).

O Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores Nacionais foi criado em 1910. Projetava um organização buscava trabalhar com as várias situações concretas das comunidades indígenas na perspectiva de torná-los agricultores. Em 1914, reconhecendo a especificidade da problema indígena, tal regulamentação foi alterada. O Serviço passou a tratar exclusivamente do questão indígena. Pela primeira vez foi reconhecido de forma legal o respeito às tribos indígenas como povos com direito à liberdade de pensamento, direito ao seu modo de vida, pois até então o índio era tido como matéria bruta para a cristianização, segundo Ribeiro (1982).

A nova legislação também garantia a proteção do índio no seu próprio território, proibia o desmembramento da organização da “família” indígena, técnicas consagradas pela metodologia colonizadora conforme o dogmatismo religioso e o etnocentrismo, de acordo com Ribeiro (1982).

Inicialmente a ação assistencial garantia a posse das terras que os índios ocupavam de caráter coletivo e inalienável como condição básica para se desenvolvimento, técnicas de produção e defesa contra epidemias. Em seguida, reconhecendo a dificuldade objetiva dos índios para interagir em condições de igualdade, a lei estabelece um estatuto especial, assegurando a cada índio individualmente todos os direitos do cidadão comum, levando em conta sua situação social quando considerados os seus deveres, observa Ribeiro (1982).

A importância da nova legislação é tamanha que em 1956, na 39a Conferência Internacional do Trabalho, reunida em Genebra, foi aprovada como recomendação um documento inspirado grandemente na legislação brasileira, para orientar a política indigenista dos países que possuem populações indígenas, de acordo com Ribeiro (1982).

Inicialmente, o Parlamento – pressionado pelo clamor geral por medidas de amparo ao movimento em luta pelos indígenas – votava prontamente as verbas solicitadas, o Serviço de Proteção aos Índios (SPI) contava com uma equipe qualificada de Rondon e com o apoio do Exército, segundo Ribeiro (1982). Mesmo com os resultados obtidos, ou seja, com o fim da prática de extermínio e a diminuição da tensão entre a colonização e os povos indígenas, três anos após a criação, o SPI teve 60% da suas verbas cortadas. Com a Revolução de 30, quase foi à extinção. Com recursos cada vez menores o SPI terminou como mera seção subordinada a uma repartição burocrática do Ministério do Trabalho. Em 1934 o SPI volta às boas graças do Governo, mas nunca mais se recuperou da crise por que passou, como destaca Ribeiro (1982).

O próprio sucesso da metodologia persuasiva dos positivistas aliviou a pressão urbana sobre o Governo no sentido de criar e manter o SPI. A questão da autoridade também afetou o desempenho do SPI, que sem o apoio mais decidido do governo central que lhes permitisse enfrentar o poder local, chefes de polícia se negavam a prender assassinos de índios ou quando presos eram absolvidos pelo judiciária; prefeituras recusavam tomar medidas administrativas contra apropriação de terras indígenas. Ao mentar o programa inicial e polarizar com o poder local, ancorada fortemente na exploração da força de trabalho indígena e na expropriação de suas terras. Ao mesmo tempo, a assistência aos Índio levava alfabetização, conhecimento sobre legislação e outros efeitos que alteravam positivamente a situação do sertaneja, contra os interesses da da escravidão no seringal e na fazenda. O SPI criou uma situação política incômoda para o poder central, conforme Ribeiro (1982).

Segundo Ribeiro (1982), a dificuldade enfrentada pelo SPI entre as instâncias do Estado desnudou o conflito entre o Governo central e os Governos estaduais, estes últimos ligados aos interesses dos exploradores dos índios. A cada reacomodação no Governo central, o poder local vendia caro sua adesão ao novo grupo dirigente, geralmente em troca de alterações na política indigenista que deixassem suas mão livres para o assalto ao que restava aso índios. A legislação indigenista positivista foi fruto da resistência indígena e das cidades costeiras e nunca foi aceita na fronteira de expansão.

Em 1940, com a visita de Getúlio Vargas à Ilha do Bananal. O SPI é reorganizado e retorna ao Ministério da Agricultura. A estandardização das normas para a administração pública federal e em pouco tempo a burocratização sem capacidade de entender e se identificar com a questão indígena, dificultando as atividades do Serviço. Tal situação são foi alterada de 1950 a 1954, com a contratação de etnólogos. Novamente em 1955, com a entrega da pasta ao PTB, o Serviço se tornou objeto de barganha eleitoral. A partir de 1957, dada a forte reação do quadro de servidores, o SPI foi retirado da área operativa clientelista. Entretanto, o custo foi a classificação do Serviço como de “interesse militar” e sua direção assumida pelos oficiais da ativa, agora não mais inspirados pelo positivista da época de Rondon e o SPI foi conduzido à condição degradante de agente dos interesses de exploradores e opressores de índios, conforme Ribeiro (1982).

 

Conforme Ribeiro (1982), o programa positivista embora revolucionário aos rejeitar qualquer suposição de incapacidade cognitiva o índio, era romântico aos pretender transformar os índios em agricultores, ignorando a duas questões fundamentais: a resistência indígena e incapacidade da colonização – especialmente nas fronteira de expansão – de tornar atrativa a assimilação.

Um questão ideológica de relevância deve ser levada em consideração, segundo Ribeiro (1982), a ideologia brasileira pretende que o índio (assim como o negro) seja uma futuro “branco”. Transculturação e os aborígenes em Cuba Tratando do fenômeno cultural cubano, Ortiz (2002) problematiza a questão da mudança cultural e também a utilização de certas categorias que tende a simplificar o problema. Aculturação, segundo o autor, significa o processo de transição de uma cultura a outra e suas repercussões sociais. Porém a utilização do neologismo transculturação por avaliar é mais adequado, expressa melhor os variadíssimos fenômenos que se originaram em Cuba.

Transculturação expressa melhor as diferentes fases do processo transitivo de uma cultura à outra, porque esta categoria não consiste somente em adquirir uma cultura distinta, que é o que a rigor indica a categoria anglo-americana acculturation, senão que o processo implica também necessariamente a perda ou desarraigamento de uma cultura precedente, o que poderia dizer-se uma parcial desculturação e também significa a conseguinte criação de novos fenômenos culturais que podem denominar-se neoculturação. Tendo algo de ambas as culturas anteriores, mas com algo a mais, de acordo com Ortiz (2002).

Se as “Índias” da América foram o Novo Mundo para os povos europeus, a Europa foi o Mundo Novíssimo para povos americanos. Foram dois mundos que reciprocamente se descobriram e entrechocaram. O contato das duas culturas foi terrível. Uma delas pereceu, quase totalmente. Transculturação fracassou para os indígenas e foi radical e cruel para os demais. A sedimentação humana indígena da sociedade foi destruída em Cuba e foi necessário trazer toda sua nova população, tanto a classe dos novos dominadores quanto a dos novos dominados, conforme Ortiz (2002).

No Brasil, aquela abordagem dogmática religiosa, nos termos de Darcy Ribeiro, acima apresentada, resultou em extermínio de forma semelhante ao caso cubano.

 

A Constituição de 1988

Mesmo que não apresentemos neste artigo um balanço abrangente da Política Indigenista brasileira, à possível afirmar que a Constituição Cidadã de 1988 foi um grande avanço neste sentido.

Conforme a Constituição da República Federativa do Brasil, Capítulo I, Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, Art. 5o, “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade” (BRASIL, 1988).

A Constituição estabelece ainda em que termos. Destacamos o que é pertinente para este trabalho, “XXII - é garantido o direito de propriedade; XXIII - a propriedade atenderá a sua função social” (BRASIL, 1988).

A propriedade tem seu uso condicionado ao bem-estar social e, portanto, a ter uma função social e ambiental. Ainda no texto constitucional, no Capítulo II, Dos Direitos Sociais, Art. 6o, “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição” (BRASIL, 1988).

De acordo com a Carta Magna é garantido o direito à propriedade e também o bem-estar social. No caso específico das comunidades indígenas em questão, além da área para assentamento, é necessário e garantido pela lei o acesso aos direitos acima listados no texto constitucional.

 

Cuidados Étnicos segundo a OIT

De acordo com os critérios da Convenção n. 169 da OIT, as responsabilidades governamentais com ações coordenadas e sistemáticas para proteger seus direitos e garantir respeito à sua integridade dos povos indígenas deve ser feito com a participação dos povos interessados, nos termos do Art. 4o, que estabelece que tais medidas não deverão contrariar a vontade livremente expressa desses povos. Ainda de acordo com a Convenção 169, Art. 6O, a consulta aos povos interessados, deve ser feita por meio de procedimentos adequados e, em particular, de suas instituições representativas, sempre que sejam previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente e com meios pelos quais esses povos possam participar livremente, ou pelo menos na mesma medida assegurada aos demais cidadãos, em todos os níveis decisórios de instituições eletivas ou órgãos administrativos responsáveis por políticas e programas que lhes afetem, conforme a OIT (2011).

A posse do território tribal, instrumentos trabalho, modos de fazer e involução metropolitana O espaço urbano se amplia, mesmo que na forma de involução. Segundo Santos & Silveira (2011) dada a composição orgânica do capital e do espaço seguem acolhendo populações que se deslocam, ou seja, a deterioração geral das condições de vida e habitabilidade e não uma redução do urbano. Existe um sério risco de extermínio do povos indígenas quando são submetidos à involução metropolitana. Caso fosse possível e aceitável, inclusive para os povos indígenas, o seu deslocamento para os grandes centros urbanos, este procedimento seria altamente problemático. Tal questão reforça a necessidade de atendimento das demandas apresentadas pelas comunidade indígenas. O instrumentos de trabalho tem relação com determinada cultura, conforme Santos (2007), não é o objeto em si que tem a capacidade de provocar mudanças, eles são resultados da desenvolvimento sociedade, contudo, formas transferidas de uma formação social para outra podem transformar a última.

A posse da terra é uma questão fundamental à sobrevivência indígena. A ausência do território tribal, de acordo com os casos concretos observados, leva-os ao extermínio, em virtude da distancia que os separa o seu modo de vida das “tarefas da civilização”, da conservação de ideias e motivações da cultura original e outras determinações que inviabilizam a sua simples assimilação, conforme Ribeiro (1982)

 

Patrimônio Cultural

De acordo com Costa (2012) o patrimônio tem como base a memória coletiva, seja de uma nação, região ou comunidade. O patrimônio cultural é composto de todas as expressões materiais e espirituais que o constituem e inclui também o meio ambiente.

O Patrimônio Cultural é a experiência viva, segundo Costa (2012), há sempre um diálogo possível entre a tradição e a inovação.

O ser humano dotado de memória e capaz de rememorar, de religar, de fazer uso da tradição e de construir um processo permanente de criação, adaptação, assimilação e ressignificação de valores em uma dada sociedade, é um ser capaz de produzir cultura, portanto, é em si mesmo o patrimônio, segundo Costa (2012)

Determinados bens adquirem tal relevância para a preservação da cultural que sua proteção se impõe ao ordenamento jurídico e esse interesse vai ser fundamental para a proteção do conjunto formado por esses bens, o patrimônio cultural, garantia de sobrevivência social dos povos, porque é testemunho de suas vidas, conforme Carvalho e Dantas (2012). A Constituição Federal de 1988 conceituou patrimônio cultural abrangendo não só os bens de natureza material como também os imateriais, conforme lê-se no seu Art. 21634, assegurando-lhes proteção específica. Não só os bens materiais, antes já protegidos pela política do tombamento, mas o valor inscrito nos mesmos, assim como a dinâmica dos processos culturais edas práticas sociais, nos modos de criar, fazer e viver, verdadeiros berços da cultura de um povo também foram contemplados por esse abrigo constitucional Carvalho e Dantas (2012).

 

Paisagem cultural

De acordo com o IDArq Factor3, a UNESCO define Paisagens Culturais como os bens culturais que representam as obras conjugadas do homem e da natureza que Ilustram a evolução da sociedade e dos estabelecimentos humanos ao longo dos tempos, sob a influência dos condicionamentos materiais e/ou das vantagens oferecidas pelo seu ambiente natural e das sucessivas forças sociais, econômicas e culturais, internas e externas. Dividem-se em três categorias principais:

1) a mais fácil de identificar é a paisagem claramente definida, intencionalmente concebida e criada pelo homem (jardins e parques criadas por razões estéticas que estão muitas vezes, mas não sempre, associadas a construções ou conjuntos religiosos);

2) a paisagem essencialmente evolutiva, resulte da exigência de origem social, econômica, administrativa e/ou religiosa, que atingiu a sua forma atual por associação e em resposta ao seu ambiente natural (estas paisagens refletem esse processo evolutivo na sua forma e na sua composição) Subdividem-se em duas categorias:

a) paisagem relíquia (ou fóssil) é uma paisagem que sofreu um processo evolutivo que foi interrompido, brutalmente ou por algum tempo, num dado momento do passado. Porém, as suas características essenciais mantêm-se materialmente visíveis;

b) paisagem viva é uma paisagem que conserva um papel social ativo na sociedade contemporânea, intimamente associado ao modo de vida tradicional e na qual o processo evolutivo continua. Ao mesmo tempo, mostra provas manifestas da sua evolução ao longo do tempo;

3) a paisagem cultural associativa. A inscrição destas paisagens na Lista do Patrimônio Mundial justifica-se pela força da associação a fenômenos religiosos, artísticos ou culturais do elemento natural, mais do que por sinais culturais materiais, que podem ser insignificantes ou mesmo inexistentes.

O caso em questão se enquadra melhor em paisagem essencialmente evolutiva, resulte da exigência de origem social e econômica, em resposta ao ambiente natural, mais precisamente, a paisagem viva, que é uma paisagem que conserva um papel social ativo na sociedade contemporânea, intimamente associado ao modo de vida tradicional e na qual o processo evolutivo continua.

Segundo Costa (2012) as pesquisas revelam que visita a museus torna a vida mais saudável, pois o contato com as obras de arte ou com os testemunhos da história humana coloca o visitante em uma situação de reconhecimento da sua situação de partícipe do processo de construção histórica. Tal contato permite a elevação do espírito e fortalece a autoestima.

 

 

Uma cidade (ou município) saudável é aquela onde a saúde dos cidadãos é promovida, na ótica da qualidade de vida. Qualidade de vida é o bem estar geral experimentado pelos sujeitos de uma dada população pelo fato de se sentirem seguros e nutridos em todas as áreas, autônomos e com habilidades específicas mantidas por meio de processos de aprendizagem, incluindo o uso da memória. Ser saudável é poder se relacionar com objetos e pessoas de forma não violenta, respeitando a diversidade cultural e promovendo maior compreensão de mundo, conforme Costa (2012)

 

Considerações Finais

A experiência histórica evidencia que é necessário respeitar as demandas apresentadas pela comunidade indígena, respeitando e promovendo a cultura própria dos povos originários. Este cuidado além de ético, está de acordo com a Constituição Cidadã de 1988, tem o aval de organismo internacionais com OIT e UNESCO, possibilita a manutenção das comunidades indígenas em seus territórios e promovendo Saúde Cultural.

 

Referência Bibliográficas

 

COSTA, Heloisa Helena Fernandes Gonçalves da. Museologia e patrimônio nas cidades contemporâneas: uma tese sobre gestão de cidades sob a ótica da preservação da cultura e da memória. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, v. 7, n. 1, p. 87-101, jan.-abr. 2012. <http://www.scielo.br/pdf/bgoeldi/v7n1/a07v7n1.pdf> .Acesso em 20/04/2013.

PORTUGAL, IDArq Factor. <http://idarqfactor.org/paisagem_cultural_definicao.html>. Acesso: 20/04/2013.

Fundação Nacional do Índio. A Origem dos povos americanos. Disponível em: <http://www.funai.gov.br/indios/fr_conteudo.htm>. Acesso em: 30/01/2011.

Ministério Público Federal. <http://noticias.pgr.mpf.gov.br/noticias/noticias-do-site/copy_of_indios-e-minorias/primeira-aldeia-i ndigena-de-santa-maria-rs-sera-inaugurada-na-proxima-segunda-feira-4-6>. Acesso em: 01/10/2012.

BRASIL. Constituição, 1988. <http://www.senado.gov.br/legislacao/const/con1988/CON1988_29.03.2012/CON1988.shtm>. Acesso em: 30/09/2012.

OIT. Convenção n. 169, sobre povos indígenas e tribais e Resolução referente à ação da OIT. <http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/gender/pub/convencao %20169%20portugues_web_292.pdf>. Acesso em 22/10/2012.

RIBEIRO, Darcy. Os Índios e a Civilização – A Integração da Populações Indígenas no Brasil Moderno. 4a edição. Petrópolis. Editora Vozes Ltda. 1982.

SANTOS, Milton; SILVEIRA, María Laura. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. 15a edição. Editora Record, São Paulo, 2011.

SANTOS, Milton. Economia Espacial - Crítica e Alternativas. Tradução Maria Irene de Q. F. Szmrecsányi. Editora Universidade de São Paulo, 2a edição, São Paulo, 2007.

1Graduado em Economia e mestrando em Patrimônio Cultural pela Universidade Federal de Santa Maria – UFSM.

2Graduado em Direito pela Universidade Federal de Santa Maria (1988), onde é Professor

Adjunto, vinculado ao Departamento de Direito. Mestre em Direito pela Universidade do Vale

do Rio dos Sinos - UNISINOS (2001) e Doutor em Desenvolvimento Regional pela Universidade de

Santa Cruz do Sul (RS), tendo feito Estágio no Exterior com bolsa da CAPES, na UMINHO

(Portugal), na área de Cooperação Transfronteiriça.

3 O IDArq Factor constitui um grupo de investigação integrado na unidade de I&D da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias designado por LABART.Saúde Cultural Saúde cultural é um conceito resultante de estudos sobre o valor ético do patrimônio cultural aos cidadãos. Pesquisas realizadas com públicos diversos tem permitido apreender que a articulação entre memória afetiva, memória coletiva e elaboração de sinapses gera inovação e desenvolvimento de talentos. O patrimônio cultural é a ferramenta usada para potencializar a inclusão cultural e social, possibilitando o surgimento passagem do esta do existência para o estado de consciência e promovendo Saúde Cultural, conforme Costa (2012). 

 

Dario Luiz da Silva1

José Luiz de Moura Filho2

Assine

Assine gratuitamente nossa revista e receba por email as novidades semanais.

×
Assine

Está com alguma dúvida? Quer fazer alguma sugestão para nós? Então, fale conosco pelo formulário abaixo.

×