Educação Infantil: Limites e Possibilidades Para a Atuação Docente
EDUCAÇÃO INFANTIL: LIMITES E POSSIBILIDADES PARA A ATUAÇÃO DOCENTE
Carolyne Santos Lemos
RESUMO
O objetivo da produção do presente trabalho é apresentar alternativas de atividades desencadeadas pelo corpo docente. Empreendemos um esforço de envolver um conjunto de conteúdos indispensáveis ao processo de ensino- aprendizagem no âmbito da educação infantil, considerando a importância desses conteúdos para o processo de formação que se insere na infância. Os docentes da educação infantil estão inseridos em um rol desafiador no tocante à atuação educacional com crianças em fase de desenvolvimento de um vasto campo de habilidades. A depender do comprometimento da categoria profissional, aliada a métodos propositivos, criativos e dinâmicos, ter-se-á um terreno fértil para o alcance de resultados positivos durante o processo de ensino-aprendizagem no âmbito da educação infantil. O artigo concentra dimensões do conhecimento que estão diretamente associados ao exercício da prática profissional do docente da educação infantil. Como aporte metodológico, a presente exposição conta com a pesquisa bibliográfica, utilizando acervos já existentes sobre o objeto de estudo em tela.
PALAVRAS – CHAVE: Educação infantil. Língua oral e escrita. Teorias da aprendizagem.
ABSTRACT
The objective of the present work is to present alternatives of activities triggered by the teaching staff. We undertake an effort to involve a set of contents indispensable to the teaching-learning process in the context of early childhood education, considering the importance of these contents for the formation process that is inserted in childhood. The teachers of the pre-school education are inserted in a challenging role in the educational action with children in the development phase of a vast field of abilities. Depending on the commitment of the professional category, coupled with propositive, creative and dynamic methods, there will be fertile ground for achieving positive results during the teaching-learning process in the context of early childhood education. The article concentrates dimensions of knowledge that are directly associated with the practice of the professional practice of teachers of early childhood education. As a methodological contribution, the present exhibition relies on bibliographical research, using already existing collections of the study object on canvas.
KEYWORDS: Early Childhood Education. Oral and written language. Theories of learning.
Introdução
A proposta textual ora demarcada visa concentrar todos os seus esforços para integrar todas importantes dimensões do conhecimento associadas à educação infantil, enfocando como ponto crucial a importância do tratamento adequado às particularidades dos alunos das faixas etárias ora propostas (4 e 5 anos).
Entendemos que todos os procedimentos que devem ser aplicados à prática do ensino na educação infantil estão eivados de complexidades, dada a conjuntura composta por crianças que apresentam distintos contextos de vida.Reconhecemos a importância de considerar os avanços empreendidos em torno de componentes teóricos e práticos no campo da educação infantil, além disso, muitas pesquisas desenvolvidas nesse campo contribuíram ricamente para intervenções cada vez mais modernas e qualificadas.
Reforçamos a necessidade do compromisso dos profissionais atuantes da área com um processo de aprendizagem inclusivo, dinâmico, criativo e capaz de desenvolver diferentes habilidades no público alvo, uma vez que as práticas educativas e pedagógicas iniciais são de suma importância para os alunos em virtude de se tratar de diretrizes iniciais de ensino e aprendizagem.
O objetivo da produção do presente trabalho é apresentar alternativas de atividades desencadeadas pelo corpo docente. Empreendemos um esforço de envolver um conjunto de conteúdos indispensáveis ao processo de ensino- aprendizagem no âmbito da educação infantil, considerando a importância desses conteúdos para o processo de formação que se insere na infância.
Contemplaremos os fundamentos pedagógicos da educação infantil, a psicogênese da língua escrita, os aspectos relacionados ao desenvolvimento da percepção espacial e gráfica dos alunos, aspectos introdutórios da psicologia, as fases pertinentes ao desenvolvimento da criança, e elementos ligados à pratica do registro no cotidiano da educação infantile;
Consideramos de suma importância a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96, lei por meio da qual a educação infantil torna-se a primeira fase da educação básica. Nosso trabalho busca estar em consonância com as novas tendências teórico-metodológicas da educação infantil, sobretudo, com os seus rebatimentos em torno do processo de ensino e aprendizagem.
De acordo com Oliveira (2002), além do estabelecimento da educação infantil como a primeira etapa da educação básica, a legislação comporta outras prerrogativas, tais como, a educação como direito da criança e dever do Estado; um regime de colaboração mútua deve estabelecer a relação entre União, estados, municípios e Distrito Federal; para se trabalhar com crianças de 0 a 6 anos é exigido o cumprimento do ensino superior, admitindo-se no mínimo, o ensino médio; a formação dos docentes da educação infantil deve estar associada à teoria e à prática.
Conforme elucida Kramer (1996), faz-se necessário que seja realizado um amplo e constante estado de arte das pesquisas sobre infância no Brasil, traçando um panorama das principais tendências teóricas e metodológicas de investigação, discutindo resultados e apontando tanto os avanços e conquistas quanto as lacunas ainda existentes.
A faixa etária de 4 e 5 anos que está em discussão, integra a chamada pré-escola. Consideramos pertinente precisar a diferença entre creche e fase da pré-escola,
Creche e pré-escola, em geral, distinguidas ora pela idade das crianças incluídas nos programas a creche se definiria por incluir crianças de 0 a 3 anos e pré-escola de 4 a 6-, ora pelo seu tipo de funcionamento e pela sua extensão em termos sociais – a creche se caracterizaria por uma atuação diária em [horário integral], e a pré- escola, por um funcionamento semelhante à escola, em meio período. Há ainda uma terceira classificação que diz respeito à vinculação administrativa: a creche se subordinaria, assim, a órgãos de caráter médico ou assistencial, e a pré-escola ao sistema educacional (KRAMER, 1989, p.49).
Neste estudo, queremos enfatizar o caráter histórico e cultural da infância, não sendo, portanto, um conceito pronto, acabado e aplicável a todas as realidades. De acordo com Marafon (2007), não podemos utilizar um conceito único de infância, uma vez que existem muitas infâncias, infância marcada pelo elevado poder aquisitivo dos pais; infância caracterizada pela pobreza e pelo abandono; infância superprotegida; infância amada, etc.
Tendo como substrato as considerações introdutórias, prosseguimos com a nossa discussão, com a finalidade de trazer contextualizações que ultrapassem meras descrições de conceitos. Situaremo-nos em análises críticas e propositivas.
FUNDAMENTOS PEDAGÓGICOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL
As propostas pedagógicas relacionadas à educação infantil devem ultrapassar o meio educativo, em virtude de estarmos nos referindo a uma faixa etária que exige cuidado e fortalecimento das crianças enquanto sujeitos. Sendo assim, conforme aponta a legislação,
Primeira etapa da educação básica tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade (Lei 9394/96, artigo 29).
Os procedimentos da educação infantil necessariamente devem estar alicerçados à linguagem, ao raciocínio, a interação com o meio em que as crianças vivem, aos cuidados de saúde e higiene. Consideramos de fundamental importância também, o ensino atinente ao respeito às diversidades, o envolvimento com aportes culturais, o incentivo à convivência harmoniosa em sociedade.
O trabalho pedagógico das instituições devem seguir o norteamento previsto nas estruturas curriculares. Segundo Kramer,
Compreendo, assim, currículo ou alternativa curricular de forma ampla, dinâmica e flexível, que é frequentemente a maneira como se tem concebido uma proposta pedagógica. Identifico ambos os termos, portanto, relacionando-os à vida na escola, na creche, na pré-escola. Um currículo ou proposta pedagógica assim definidos reúnem tanto bases teóricas quanto diretrizes práticas neles fundamentadas, bem como aspectos de natureza técnica que viabilizam a sua concretização (2003, p.168).
Trazemos à tona, o reconhecimento de que as proposições pedagógicas não prescindem de manual de instruções, de teorias pré-definidas e imutáveis. Pelo contrário, o que está em jogo é o caráter construtivo das propostas pedagógicas, e não sua imposição de maneira horizontal. É de fundamental importância reconhecer que as alterações de propostas pedagógicas não devem partir da negação dos postulados voltados
às propostas pedagógicas anteriores. A modernização não prescinde do descarte de tudo o que não é considerado novo, deve haver uma coexistência entre o arcaico e o moderno. Não dentro de uma perspectiva pejorativa, ou seja, a coexistência do arcaico com o novo não é sinal de retrocesso, mas sim, do reconhecimento de que os conteúdos positivos que qualificam as propostas pedagógicas anteriores devem ser aproveitados e integrados ao conteúdo programático das novas propostas.
Repensar as práticas profissionais, requer que a comunidade escolar2 esteja incessantemente envolvida com as atualizações pertinentes ao mundo do ensino e da educação. São essas atualizações que permitem que as práticas pedagógicas sejam repensadas.
De acordo com Kuhlmann Junior (2003, p. 51-65), no processo de construção da proposta pedagógica, devem ser contemplados os seguintes aspectos: a compreensão do binômio cuidar-educar; o reconhecimento de que o processo de ensino-aprendizagem envolve brincadeiras de matriz construtiva; a defesa da não discriminação de aspectos culturais, étnico-raciais, religiosos das crianças e de sua família; o envolvimento da família com o processo educativo das crianças; a promoção gradativa da autonomia e cooperação envolvendo crianças e adultos; a promoção do convívio da criança com a diversidade individual e social; o desenvolvimento de diversas linguagens, seja da curiosidade, da imaginação, da criatividade e da expressividade; a organização e reorganização do espaço físico; a promoção da consciência e educação ambiental; uma atenção especial aos processos de adaptação e desligamento das crianças às unidades de ensino; a promoção de cuidados com a saúde, alimentação e com a higiene; constantes avaliações e observações por parte dos educadores, como etapa do ciclo planajemento- execução-avaliação.
A próxima etapa que segue tratará da psicogênese da língua escrita, em consonância com os postulados das teorias de alfabetização.
Problematizando a psicogênese da língua escrita e as teorias de alfabetização
Existem diferentes concepções de alfabetização, desde aquela conformada com o simples ato de assinar o próprio nome até aquela que envolve a escrita e a leitura mais consolidadas. O desenvolvimento de uma teoria acerca da alfabetização pressupõe uma concepção acerca desta. A teoria precede os métodos práticos.
O paradigma mecanicista da alfabetização integra o Paradigma do Estruturalismo Linguístico (século XIX e início do século XX). Este paradigma assume que a prática da alfabetização está exclusivamente centrada no desenvolvimento das habilidades específicas de codificar e decodificar, concentrando a prática alfabetizadora exclusivamente no desenvolvimento do domínio sobre o código escrito, encarado como capaz de associar diretamente a fala a uma representação gráfica (SENNA, 1995).
A tese central mecanicista sofreu pouquíssimas modificações ao longo dos anos, conforme Senna (1995), pouco se modificou em relação à ideia de que a língua escrita é mera transposição da língua oral, por isso, pouco se modificou a prática alfabetizadora. Surgiram, no entanto, métodos diferenciados de alfabetização, ora dedutivos, ora indutivos, ainda que essencialmente mecanicistas em essência, por privilegiarem exclusivamente o aprendizado do código escrito (SENNA, 1995).
Entendemos que a leitura não deve ser apenas um simples elemento de correspondência entre o oral e o escrito. Conforme aduzem Ferreiro e Teberosky (1985), quando a escrita é interpretada como uma técnica de reprodução do traçado gráfico ou como um problema de regras de transcrição oral, desconhece-se que, além do aspecto perceptivo-motor, escrever é uma tarefa conceitual, portanto, não deve ser passiva. Envolve uma concepção de mundo. Quando uma criança começa a escrever, produz traços visíveis sobre o papel, mas, além disso, põe em jogo suas próprias hipóteses acerca do próprio significado da representação gráfica. Para essas autoras, a escrita pressupõe um conjunto de etapas de estruturação do conhecimento. É, no entanto, produto de uma construção ativa.
Desenvolvimento da língua oral e gráfica
A leitura e a escrita não são processos de natureza simples, são procedimentos extremamente complexos. A leitura e a escrita são processos que requerem o uso de habilidades cognitivas como a capacidade de reflexão sobre a linguagem nos aspectos fonológico, sintático, semântico e pragmático (FERREIRA, 2002). A primeira forma de desenvolvimento da linguagem dá-se oralmente.
O retardamento na aquisição da linguagem oral pode trazer rebatimentos para o processo de consolidação da linguagem gráfica. Não podemos descartar o fato de que a linguagem oral apresenta relações com a linguagem escrita.
No início da escolarização, segundo Sim-Sim (2002), as crianças não se encontram todas no mesmo ponto de partida quanto ao domínio da vertente oral do discurso usado na escola. Os efeitos pedagógicos dessa realidade expressam-se em dificuldades no processo de aprendizagem escolar comque muitos alunos se confrontam, particularmente no processo de domínio da leitura.
Da escola deve ser transcendido o exercício de um papel indispensável para expandir o conhecimento que a criança tem acerca da língua, aplicando esse conhecimento a diferentes situações, de forma criativa e envolvente. O educador precisa fazer com que esse conhecimento passe do arcabouço implícito para o uso adequado a novas e diversificadas situações (DELGADO- MARTINS; DUARTE, 1993).
Salientamos a grande importância do desenvolvimento da língua gráfica, como fator impulsionador de outros potenciais indispensáveis ao êxito na vida em sociedade, principalmente, no que diz respeito às conquistas futuras,
O domínio da linguagem escrita aumenta o nosso potencial comunicativo e, simultaneamente, é o grande facilitador das aprendizagens escolares, assim como da expansão dos interesses individuais e do crescimento cognitivo do sujeito-leitor. Socialmente e a longo prazo, a mestria da leitura é um vetor extremamente importante no desenvolvimento econômico quer do indivíduo, quer do grupo social onde se integra (SIM-SIM, 2002, p.203).
O êxito na escrita tem como substrato a realização da leitura, esta por sua vez, compõe um processo que vai além da decodificação de palavras enunciadas em um texto, livro, jornal, revista. A leitura pressupõe um processo de interpretação e reconstrução do conteúdo lido. Deve partir da interação entre o leitor e a leitura. Sendo assim,
Ler não é um fim em si mesmo, mas um meio de nos apropriarmos da informação, ou seja, aprender sobre o real, qualquer que ele seja. O papel da escola de fazer de nós leitores é inegável. Com efeito, se perguntarmos a qualquer criança por que vai à escola, ela responderá “para aprender a ler”; só que aprender a ler é apenas uma das etapas do percurso que há que percorrer para ser membro do pleno direito do clube dos leitores (SIM-SIM, 2002, p.207).
Psicologia: introdução às teorias de aprendizagem
Existem diferentes correntes teóricas que explicam o processo de aprendizagem, no entanto estamos de acordo com as teorias desenvolvidas por Jean Piaget e Lev Vygotsky, por atualmente apresentarem grande destaque no campo da educação.
A Epistemologia Genética desenvolvida por Piaget foi desenvolvida por meio da experiência com crianças desde o nascimento até a adolescência, tendo como premissa o fato de que o conhecimento é construído a partir da interação do sujeito com seu meio, a partir de estruturas existentes (PIAGET, 1974). Já os estudos de Vygotsky se baseiam na dialética das interações do sujeito com o outro e com o meio para que possa ocorrer o desenvolvimento sócio cognitivo (VYGOTSKY, 1999).
Apesar de Vygotsky e seus seguidores considerarem que a estrutura dos estágios desenvolvida por Piaget seja correta, há que se considerar uma diferença básica entre estes dois autores. Para Piaget a estruturação do organismo ocorre antes do desenvolvimento, já para Vygotsky, o desenvolvimento das estruturas mentais superiores é gerado a partir do processo de aprendizagem do sujeito (PALANGANA, 2001).
De acordo com Papalia, Olds, Feldman (2006) são duas as principais teorias da aprendizagem: o Behaviorismo e a Teoria da aprendizagem social, mas pode-se considerar o Construtivismo também como uma das mais importantes atualmente. Para a teoria do behaviorismo, os comportamentos do ser humano são aprendidos, e com isso, o aspecto da aprendizagem passa a ter grande importância. O ambiente passa a ter um papel fundamental, pois o homem passa a ser produto do meio. No aspecto do ensino, ao se seguir as características do Behaviorismo, é preciso preparar e organizar as contingências de reforço que irão facilitar a aquisição dos esquemas e dos diferentes tipos de condutas desejadas. Esse planejamento e organização das contingências ficaria a cargo do professor. As pesquisas comportamentais concentram-se na aprendizagem associativa, em que se forma uma ligação mental entre dois fatos. Dois tipos de aprendizagem associativa são o condicionamento clássico e o condicionamento operante (PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2006).
Em contrapartida, para Bandura, Polidoro e Azzi (2008), a Teoria da Aprendizagem Social, tem como característica o fato de considerar que as crianças aprendem comportamentos sociais a partir da observação e imitação de modelos. Além disso, considera que o aprendiz é um sujeito ativo, com isso, a pessoa atua sobre o ambiente e participa da criação do ambiente
Por fim, abordamos o Construtivismo, é uma teoria que surge a partir dos estudos da Epistemologia Genética de Jean Piaget e da Teoria Sócio- - histórica de Lev Vygotsky. Estas influências levaram à crença de que o homem não nasce inteligente, mas que também não é um sujeito passivo no mundo. Mesmo sendo estimulado pelo meio externo, o homem é capaz de agir sobre estes estímulos para construir e organizar o seu próprio conhecimento. Quanto mais ele age sobre o meio, mais elaborada será sua organização cognitiva (COLL; SCHILLING, 2004).
Fases do desenvolvimento da criança
É necessário compreender as manifestações das metamorfoses que perpassam a vida desses alunos, o que só é possível, no entanto, por intermédio de uma relação de proximidade com o público infantil que se trabalha. As características docentes marcadas por conotações pragmáticas, mecanizadas, hostis, não colaboram com a construção de um cenário de aula comprometido com experiências positivas e, é uma realidade com sérias chances de provocar repulsas, frustrações, desinteresse no conjunto dos alunos.
Reconhecer as particularidades dos alunos, não implica apenas na constatação de que se trata de uma fase da vida rica em processos de transformação multidimensional, mas no reconhecimento de que neste campo multidimensional, há dificuldades para além do campo educacional, por exemplo, as crianças que trilham um contexto de vida conturbado, marcado por variadas problemáticas no ambiente doméstico podem encontrar na vida que emana do ambiente estudantil, do contato com o corpo docente, uma oportunidade de enfrentar as suas fragilidades.
O principal contexto no qual a grande maioria das crianças cresce e se desenvolve é o ambiente familiar, ao passo em que vão ampliando a teia de relações sociais, desenvolvem os traços inerentes à personalidade. A escola também passa a fazer parte da construção dessa teia de relações sociais e, consequentemente, da construção dessa personalidade; assim, família e escola constituem dois agentes sociais mais influentes na configuração da personalidade infantil (PALACIOS; HIDALGO, 2004).
As manifestações emocionais das crianças são ocorrências nas quais se inserem diversas metamorfoses, de acordo com Brust (2009), as crianças tendem a melhorar a compreensão emocional durante a infância, de maneira a avançar no controle e na regulação das próprias emoções, transformando as emoções em um processo de autocontrole, mediante o qual elas aprendem a avaliar, a regular e a modificar seus próprios estados emocionais.
O não reconhecimento das dificuldades, limitações e demais impasses presentes na condição do aluno, faz com que o professor o interprete de maneira redondamente equivocada, logo, conforme ressalta Woolfolk (2000, p.46), comportamentos internos (emoções, sentimentos, valores, pensamentos) e de movimento acabam sendo observados e confundidos como indisciplina. Esta interpretação errônea possibilita um tratamento inadequado para com os alunos, compelindo-os ao sentimento de frustação, angústia, medo e desinteresse pelo processo de aprendizagem, o que pode provocar fortes impactos nas próprias relações sócio-afetivas da criança.
A aprendizagem e o desenvolvimento das potencialidades motoras, sociais, afetivas, etc., só são desencadeados com melhor fluidez quando a criança percebe a presença de uma abertura para o diálogo, quando encontra nas iniciativas do docente a oportunidade de ser ouvida e compreendida. É com esta perspectiva de desenvolvimento de processo de aprendizagem que se deve contar para proporcionar segurança e autoconfiança para os alunos.
A motivação para aprender prescinde de uma interação positiva entre aluno e professor, principalmente nas fases da vida em que estão presentes muitas mudanças na condição humana, é uma modalidade de interação que suscita o desejo pela participação nas aulas e tem como consequência, a satisfação.
A postura autoritária, o caráter opressivo, a falta de empatia de um professor são potenciais alvos de desequilíbrio na condição emocional dos alunos, que acabam por minar todas as expectativas criadas em relação à realização das aulas. Há que se levar em consideração o fato de que quanto mais a criança avança em termos de faixa etária, maiores são as suas experiências relacionadas às inseguranças, dúvidas, portanto, é emergente a necessidade de propor trabalhos que possam abarcar, principalmente, atividades voltadas para a ampliação da autoestima e do bem-estar emocional.
É mais que reconhecida a pertinência da escolha das séries iniciais ora tratadas na confecção do presente texto, uma vez que a operacionalização da docência para com este público infantil não constitui uma tarefa fácil, pelo contrário, demanda um cuidado sistemático para lidar com tanta complexidade, oriunda das mais variadas peculiaridades apresentadas pelas crianças.
A primeira infância, fase do desenvolvimento que abrange entre 0 e 6 anos de idade, tem sido cada vez mais abordada e debatida por conhecedores de distintas áreas como psicólogos, sociólogos, e entre outros que adentraram num amplo consenso quanto ao desenvolvimento da primeira infância. Defendem essa fase, como primordial, na qual a criança arquitetará uma base que a favorecerá por toda a existência, (UNESCO, 2007).
A prática do registro no cotidiano da educação infantil
Iremos nos ocupar de responder os seguintes questionamentos: o que vem a ser o registro no cotidiano da prática profissional dos docentes da educação infantil? Qual é a utilidade do registro? Por que o registro se configura numa dimensão tão importante para o docente?
Os registros configuram-se como fontes de melhoria das ações do educador, consistem em anotações que envolvem as dúvidas, inquietações,constatações e sistematizações das práticas do educador. Não compreende apenas anotações de uma experiência vivenciada, mas segundo Ostetto (2008), de tentar compreender o passado, estabelecendo relações com a continuidade do trabalho, o que veio antes, o que virá depois; ensaiar análises sobre o vivido para aprender com a experiência.
O aprendizado com acontecimentos registrados se faz indispensável para o processo de amadurecimento do educador, uma vez que,
O registro ajuda a guardar na memória fatos, acontecimentos ou reflexões, mas também possibilita a consulta quando nos esquecemos. Este “ter presente” o já acontecido é de especial importância na transformação do agir, pois oferece o conhecimento de situações arquivadas na memória, capacitando o sujeito a uma resposta mais profunda, mais integradora e mais amadurecida, porque menos ingênua e mais experiente, de quem já aprendeu com a experiência (WARSCHAUER, 1993, p.62).
Com a prática do registro, as ações profissionais do educador ganham mais visibilidade; o processo de sistematização da prática ganham contornos reflexivos, fazendo com que as práticas sejam repensadas e projetadas para ações mais propositivas e criativas. Podemos elucidar que o ato de escrever possibilita o desvio de deformações quando ao objeto percebido, ou seja, uma observação por si só pode estar carregada de deformações e preconceitos.
Com a prática do registro, ganha espaço sistematizações qualitativas, comprometidas com a aproximação da realidade. É com o registro dos fatos, dos atos, dos acontecimentos do dia a dia que aprendemos a ver o grupo em geral e cada criança em particular, compreendendo, assim, que lá estão meninos e meninas em busca de tempo para viverem a infância. A busca de um tempo nem sempre sincronizado e ou harmonizado com o tempo de planejamento, do previsto pelo professor (OSTETTO, 2008, p.23).
A autora nos lembra de que as crianças são as protagonistas da ação de registrar, pois registram-se suas produções, suas falas, seus pensamentos em torno de suas vivências, de temas trabalhados e situações encaminhadas. O registro revela a articulação entre professor e crianças; é a porta de entrada para a construção de um acervo documental que será utilizado como subsídio para a interlocução dos educadores com as crianças e com os familiares dessas crianças. Neste sentido, o registro enquadra-se como atividade coletiva.
A prática de registro envolve um processo crítico de reflexão, distanciado de hábitos pragmáticos e monótonos; com a evidência do registro o profissional depara-se com a oportunidade de desvendar os seus limites e possibilidades, os pontos em que precisa melhorar e os seus avanços no plano das ações de ensino e aprendizagem.
Considerações finais
O nosso esforço concentrou-se em envolver todos os componentes estudados ao longo do semestre, com a proposta de enaltecer a complexidade da prática profissional do docente diante de uma gama de condicionamentos
que envolvem a educação infantil. As crianças estão em um contínuo processo de desenvolvimento de várias habilidades. A partir desta realidade, o docente encontra-se diante de desafios e possibilidades.
Acreditamos que trabalhar com crianças da faixa etária em questão prescinde de uma atuação qualificada, comprometida, criativa e propositiva, o que envolve o domínio dos fundamentos da educação infantil; a apreensão dos aportes teóricos da alfabetização e da aprendizagem; a interação entre educador e aluno. O processo de ensino-aprendizagem pressupõe interação da criança com o meio ambiente e social, o ensino das práticas de alimentação, higiene e cuidados com a saúde.
Constatamos que a leitura não se constitui apenas em uma técnica de decodificação de um determinado conteúdo, mas implica um processo interativo entre o leitor e a leitura. Trata-se de uma forma de reconstruir e interpretar algo. Não é uma tarefa mecanicista, pragmática. A escrita, por sua vez, somente é possibilitada com o desenvolvimento da prática de leitura, esta fase apresenta forte influência do domínio da linguagem oral.
Enfocamos a prática do registro enquanto ferramenta indispensável para a sistematização da prática, que deve ultrapassar o mero tarefismo de anotação, devendo alcançar o plano analítico reflexivo. Este procedimento pode compor um aparato documental, compartilhado com os pais dos alunos, a partir desta interação, o educador concentra em mãos um horizonte de alternativas para o aprimoramento da sua atuação profissional.
Enfocamos a necessidade dos educadores estarem preparados para as diferentes formas de apreensão dos conteúdos ensinados, uma vez que não há uma regra geral de ensino que possa ser aplicada a todas as crianças. Algumas crianças desenvolvem determinadas habilidades com mais consistência e rapidez que outras, o que não significa que as crianças portadoras de dificuldades sejam consideradas incapazes.
Defendemos um processo educativo envolvente, integrador, não discriminatório. As interferências negativas no plano educacional são grandes alvos impulsionadores de frustrações e descontentamento com a esfera educacional. É importante salientar que a escola também participa do processo de formação da identidade da criança. Os primeiros contornos da identidade da criança são construídos no âmbito familiar, posteriormente esta formação alastra-se para o meio social e para a escola.
Lançamos o entendimento de que são múltiplas as atribuições do educador para com as crianças, porém, defendemos a participação ativa dos pais ou responsáveis nos assuntos atinentes à vida escolar dessas crianças. Não somos adeptos da ideia de que toda a carga educativa e moral deve prescindir dos muros escolares sem a menor responsabilização dos pais ou responsáveis.
A não participação dos pais ou responsáveis no contexto da vida escolar de suas crianças implica numa série de consequências na formação educacional e pessoal do aluno. Deve haver, portanto, um acompanhamento conjunto no processo educacional das crianças, envolvendo educadores, equipe pedagógica, pais ou responsáveis.
Com relação às abordagens do ensino que evidenciamos, estamos de acordo com a abordagem construtivista, abordagem por meio da qual o conhecimento não é transferido autoritariamente, mas construído de maneira dinâmica e crítica. O ensino baseado unicamente na autoridade do professor não possui espaço na abordagem construtivista. Para Piaget, “é evidente que o educador continua indispensável, a título de animador, para criar situações e armar dispositivos iniciais capazes de suscitar problemas úteis à criança”. (PIAGET,1974; 15).
As crianças, inseridas passivamente no processo educacional, não tendo os seus anseios atendidos depara-se com um arsenal de dúvidas e incertezas quanto ao seu papel de protagonista de sua própria trajetória de vida. O tratamento autoritário incide na esfera do ensino como elemento que proporciona estagnação e limitação dos potenciais das crianças. É claro que reconhecemos a influência primordial e fundamental do educador, portador de competências teóricas e práticas concebidas durante o
processo de formação acadêmica e do processo de formação continuada, na aprendizagem das crianças, o que queremos frisar é a necessidade urgente de romper com as velhas práticas autoritárias de lidar com o ensino.
O objetivo principal da educação é criar homens que sejam capazes de fazer coisas novas, e não simplesmente repetir o que outras gerações fizeram - homens que sejam criadores, inventivos e descobridores. O segundo objetivo da educação é formar mentes que tenham capacidade de críticas e de verificação, e que não aceitem tudo o que lhes é oferecido (PIAGET, 1970)
No entanto, nos deparamos com uma realidade latente: o que incide na educação é o processo de ensino-aprendizagem de caráter mecanicista. Esta predominância não significa que a defesa em torna da educação construtiva deva ser descartada. Os profissionais docentes da educação infantil concentram no seu arsenal de atribuições uma importante ferramenta para tornar o ensino a chave para a promoção da autonomia dos seus alunos.
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