05/09/2016

LER

Dênio Mágno da Cunha*

            Antes de algum desavisado pensar no título como “Lesão por Esforço Repetitivo”, aviso tratar-se do verbo “ler”, cujo significado mais comum é: “percorrer com a visão o que está escrito, interpretando os sinais gráficos e/ou linguísticos”. Sempre acompanhado de sua irmã gêmea, a leitura: “ato ou efeito de ler. Processo de construção de sentido por meio da interação dinâmica entre o conhecimento do leitor, a informação sugerida pelo texto e o contexto em que se dá a leitura”.

            Porque pensei nesse tema para hoje? Porque, se tem algo que nós professores precisamos incentivar em nossos alunos, é o exercício da construção de sentido por meio da interação entre o conhecimento dos alunos e as informações que recebem. Falo isso porque ouço meus alunos darem muitas explicações, fazerem comentários, falarem frases sem sentido real,  pois são meras repetições daquilo que ouviram. Nossos alunos estão vulneráveis, não fazem a leitura, apenas repetem a leitura feita por outros.

            Este, provavelmente seja um dos motivos se acharmos que nossos alunos não têm senso crítico, sobre si mesmos e da realidade que os rodeia. E talvez por isso, sejam resistentes a qualquer pergunta ou dúvida. O que consomem passa a ser verdade, ponto final de qualquer diálogo. São rasos, superficiais. Felizmente, exceções existem.

            Algumas situações, no entanto, me assustam. Tempos atrás, distribui um texto de duas páginas (frente e verso) para leitura em sala de aula. Um aluno me perguntou: professor é pra ler os dois lados? Quase não respondi.

            De outra feita, enviei por e-mail um texto de 10 páginas. Reclamação geral e total falta de leitura na aula seguinte, porque o texto era grande demais.

            E ainda uma terceira situação. Após a leitura de um texto em sala de aula (isso acontece com frequência) peço que se comentem sobre o texto, que alguém faça uma síntese do que foi lido e a resposta é sempre a mesma: silêncio. Constrangedor.

            As estatísticas mostram que em média o brasileiro dedica 5.2 horas semanais para a leitura de livros. No ranking NOP, ocupamos o 27º. lugar, entre 30 países. Nas mídias não interpretativas, estamos bem colocados: 8º lugar em tempo dedicado a TV; 2º. lugar em “ouvir rádio”. Estamos em 9º. lugar quanto ao acesso á internet (10.5 horas semanais não incluindo acesso no trabalho).

         Bem, o que isso significa? Primeiramente que lemos pouco. Independente das pesquisas, isso é perceptível cotidianamente. Segundo, temos predileção por atividades que não exigem esforço de compreensão, de interpretação e – tragicamente – de reflexão. Por isso, repetimos.

            As consequências vão desde a ausência de reflexão e, portanto, ausência de senso crítico, até a elevação da presença de mal de Alzheimer na população. Sim, isso mesmo. Pesquisas (e também a prática) comprovam: os que possuem o hábito de ler reduzem em 30% as chances de evolução da doença.

            Mas como podemos alterar este quadro? Primeiro, de forma óbvia, dar mais textos para leitura; segundo, gerar questões que exercitem a interpretação (o que você leu? Traduza com suas palavras o que você leu?  O que o autor disse? Etc. etc). Terceiro, trabalhar usando questões que “forcem” a geração de relacionamento entre assuntos diferentes – buscar a criação de sinapses. E finalmente, incentivar a criação de clubes de leitura ou a leitura compartilhada em sala de aula.

            Terminando, quero dizer que sou advogado da diversidade de estímulos na aprendizagem – imagem, som, escrita, leitura. No entanto, ainda não vi nada mais profundo do que uma atividade de leitura reflexiva bem-feita. Saio da sala de aula com a alma lavada, enxaguada e enxovalhada, como diria o personagem de Dias Gomes. E curioso, alguns alunos acham essa uma atividade diferente, inovadora, fora do padrão power-point. Penso que se sentem respeitados ou desafiados em sua inteligência. Quem abe? Ou talvez, apenas percebam o ganho que tem a leitura, no sentido da interpretação e no dar sentido.

            Antes que me esqueça, no sentido estrito, nossos alunos leem e escrevem muito mais que as gerações anteriores, graças às mídias sociais: facebook, whatsapp, twitter e outros. No entanto, essa leitura e escrita é reduzida a no máximo 50 palavras, na maioria das vezes em formato reduzido. Este hábito moderno, infelizmente, não contribui em nada para a expansão do pensamento e nem para a criação de um conceito crítico. Tanto é assim que nos é aconselhado pelos especialistas em mídia eletrônica a utilização de no máximo 140 caracteres em nossas comunicações ou textos. Mas esse é um outro assunto.

* Dênio Mágno é professor em MBA Carta Consulta e Una/Unatec. Doutorando Universidade de Sorocaba. Acredita no poder transformador da leitura.

Assine

Assine gratuitamente nossa revista e receba por email as novidades semanais.

×
Assine

Está com alguma dúvida? Quer fazer alguma sugestão para nós? Então, fale conosco pelo formulário abaixo.

×