21/10/2016

METODOLOGIA DE INCUBAÇÃO E SISTEMAS LOCAIS DE INOVAÇÃO CRIATIVOS (SLICS) RELATO DA EXPERIÊNCIA DA INCUBADORA CRIAATIVA S³

METODOLOGIA DE INCUBAÇÃO E SISTEMAS LOCAIS DE INOVAÇÃO CRIATIVOS (SLICS)

RELATO DA EXPERIÊNCIA DA INCUBADORA CRIAATIVA S³

 

JOSÉ CLÁUDIO ROCHA

DENISE ABIGAIL BRITTO FREITAS ROCHA

LUIZ CARLOS ROCHA

RESUMO

O presente artigo traz um relato de experiência da Incubadora Tecnológica de Economia Solidária - CriaAtiva S³ (Social+Solidária+Sustentável) do Centro de Referência em Desenvolvimento e Humanidades (CRDH), da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), criada a partir da chamada pública MCTI/SECIS/TEM/SENAES/CNPq 089/2013. O estudo destaca o trabalho da Incubadora com novas formas de economia solidaria, a exemplo da economia criativa e sua metodologia de incubação. Trata também da proposta criação de Arranjos Produtivos Locais (APLs) Criativos e Sistemas Locais de Inovação Criativos (SLICs). O estudo destaca a importância da inovação social para o avanço das lutas dos setores populares e de que a criatividade está não só no produto final, mas na criação e aperfeiçoamento de novos processos e formas de organização da produção mais participativos, solidários e, sobretudo, emancipadores. A Incubadora CriaAtiva atua numa perspectiva multi, inter, transdisciplinar congregando profissionais de diversas áreas do conhecimento como: economistas, advogados, pedagogos, filósofos, sociólogos, professores de educação física, psicólogos, jornalistas, comunicadores, administradores, analistas de sistema, artistas, entre outros atores. Institucionalmente a Incubadora está vinculada ao CRDH e a Pró-Reitoria de Extensão da UNEB, produzindo pesquisa, extensão e ensino de qualidade, com foco na inovação aberta e social, produzindo e estimulando políticas públicas, ações afirmativas, inclusão social e boas práticas. Como resultado a Incubadora CriaAtiva apresenta produção científica e tecnológica, documentários, desenvolvimento de marcas, organização de cursos de formação e seminários, organização dos setores populares para participar qualificadamente de políticas públicas.

Palavras chaves: economia solidária, economia criativa, setores populares, empreendedorismo, políticas públicas, proninc

METODOLOGIA DE INCUBAÇÃO E SISTEMAS LOCAIS DE INOVAÇÃO CRIATIVOS (SLICS):

RELATO DA EXPERIÊNCIA DA INCUBADORA CRIAATIVA S³

  1. Introdução

TECENDO A MANHÃ

“Um galo sozinho não tece uma manhã: 
ele precisará sempre de outros galos. 
De um que apanhe esse grito que ele 
e o lance a outro; de um outro galo 
que apanhe o grito de um galo antes 
e o lance a outro; e de outros galos 
que com muitos outros galos se cruzem 
os fios de sol de seus gritos de galo, 
para que a manhã, desde uma teia tênue, 
se vá tecendo, entre todos os galos.

E se encorpando em tela, entre todos, 
se erguendo tenda, onde entrem todos, 
se entretendendo para todos, no toldo 
(a manhã) que plana livre de armação. 
A manhã, toldo de um tecido tão aéreo 
que, tecido, se eleva por si: luz balão.

João Cabral de Melo Neto 

O relato de experiências é uma forma contemporânea de produção e difusão do conhecimento onde os sujeitos podem expressar suas vivências, valorizando as diferentes formas de saber, integrando conhecimento acadêmico-científico com a produção de conhecimento em toda a sociedade, em uma perspectiva de ecologia de saberes. É também uma forma de converter conhecimento tácito (fruto da experiência e da vivência das pessoas) em conhecimento expresso ou científico, materializado na forma de relatórios de pesquisa, artigos científicos, livros ou outra forma de divulgação do conhecimento. É ainda, uma forma de promover a síntese entre a teoria e a prática rompendo com a dicotomia criada pela ciência positivista entre essas duas dimensões. É a oportunidade de socializar experiências, tornando o leitor coprodutor do conhecimento pois, como os galos do poema de João Cabral de Melo Neto, todo sujeito ao apropriar-se de uma ideia, integra suas crenças, valores e visões de mundo resignificando o seu sentido e lançando adiante.  

Pensando assim, é que produzimos esse texto onde são apresentadas as experiências da Incubadora Tecnológica de Economia Solidária – CriaAtiva S³ [Social+Solidária+Sustentável] com novas formas de economia solidária, especialmente, a economia criativa.

 Discutimos no estudo também nossa proposta para a formação de uma metodologia popular para organização de Arranjos Produtivos Locais (APLs) Criativos e Sistemas Locais de Inovação Criativos (SLIC) no território metropolitano de Salvador.

Esse trabalho vem sendo realizado a dois anos com apoio do CNPq e do Programa Nacional de Incubadoras e Cooperativas Populares (PRONINC), envolve estudantes da graduação e pós-graduação, bolsistas e voluntários, e trabalhadores (as) criativos (as) do Território Metropolitano de Salvador.

Nas próximas páginas faremos um breve relato de nossa experiência, os pressupostos epistemológicos e metodológicos e os desafios para o futuro, em uma realidade que insiste em sonegar direitos para a população socialmente mais vulnerável. Esperamos que nossa experiência possa de alguma forma inspirar outras incubadoras populares a desenvolver suas próprias ideias e propostas de intervenção no campo da economia criativa.

  1. Para começo de conversa – o contexto: o tempo, o lugar e os sujeitos

Em relatos dessa natureza cumpre inicialmente analisar três dimensões da maior importância que repercutem no cenário ou contexto social onde a ação acontece.

A primeira delas diz respeito ao tempo ou momento histórico particular onde a ação está sendo realizada.  

O espaço físico ou local corresponde a segunda dimensão.

A terceira, tem relação com os sujeitos históricos (individuais e coletivos) promotores de mudanças e transformações sociais.

  1. Século XXI um tempo de mudanças e transformações

Economia criativa, cidades criativas, territórios criativos, pessoas criativas, porque escutamos falar tanto em criatividade nos dias de hoje.

Isso acontece porque o mundo mudou, a criatividade, a informação e o conhecimento passaram a ter cada vez mais importância na formação de negócios, produtos, processos e serviços, tornando-se para muitos o principal ativo econômico das economias (pós) modernas.

Nunca antes a humanidade esteve tão dispostas a consumir produtos imateriais, intangíveis o que vem chamando atenção tanto da indústria capitalista, como de outros setores da economia.

Para Domenico de Masi (2001), sociólogo do trabalho italiano, na segunda metade do século XX passamos a vivenciar um mudança de paradigma para a produção e trabalho, a economia industrial está dando lugar progressivamente a uma nova ordem mundial fundada na criatividade, na informação e no conhecimento. Segundo Masi, Alain Touraine (1999) chamou essa nova economia de sociedade pós-moderna, Castells (2003) chama de sociedade do conhecimento, ele (Masi) chama de sociedade criativa (2001).

Por sua vez, o economista marroquino Hassan Zaoual (2003) com sua teoria dos sítios simbólicos de pertencimento, faz duras críticas ao sistema capitalista de produção e rompendo com a lógica estritamente econômica adiciona a questão a importância do cultura, religiões, civilizações para economia, especialmente, das chamadas economias periféricas, construindo a ideia de uma economia localizada ou sitiada.

Rocha (2008) a partir desses autores investe na proposta da solidariedade e da formação de redes como motor de uma nova economia. Rocha defende a ideia de que a solidariedade e a cooperação podem ser um motor tão ou mais importante para o desenvolvimento da humanidade do que a competição e o conflito.

A ideia de uma economia criativa nasce na Inglaterra e depois se espalha pelo mundo chegando ao Brasil, em primeira mão pelo Ministério da Cultura na gestão de Gilberto Gil. A economia criativa passou a ser vista no Brasil e em todo o mundo como uma alternativa de crescimento em um momento em que a economia tradicional dá sinais de estagnação. As Nações Unidas, através da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) passou a estimular a criação de projetos e programas de economia criativa em países africanos e a difundir essa ideia como uma alternativa viável de desenvolvimento econômico sustentável e com inclusão social.

No Estado da Bahia a discussão chega via Secretaria da Cultura (SECULT) que cria o Programa Bahia Criativa, como aconteceu em outros estados da federação. A Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação, decide criar uma incubadora criativa no Parque Tecnológico. A economia criativa passou a ser uma aposta no crescimento de uma economia imaterial que para alguns é ilimitada. Para a OCED a economia criativa é: “um setor Dinâmico da Economia e do Comércio Mundial que acelera o desenvolvimento sustentável e reduz a pobreza” (OCDE,2010).

A economia criativa abrange todos os setores da vida baseados na criatividade e engenhosidade com foco nas produções culturais e criativas. Abrange todas as áreas que tradicionalmente chamamos de arte e/ou cultura como espetáculos, músicas etc. Há também um conjunto de atividades que não são necessariamente entendidas como artes, mas que têm muito de criatividade como a publicidade e o designer que estão ligados diretamente a indústria cinematográfica e aos games. A figura 01 apresenta os setores da economia criativa, segundo classificação da OCDE.

Figura 01 – Visão setorial da economia criativa

A economia criativa, vista como mercadoria, como produto a ser consumido, traz uma série de questões que desafiam as leis da economia, pois a informação, o conhecimento e a criatividade são produtos que desaparecem, por exemplo, ao serem consumidos, como um saco de feijão ou um quilo de farinha. São produtos que quanto mais compartilhados, mas eles crescem, não podemos igualmente ser guardados em um cofre, pois tendem a propagação, a difusão.

Por fim, cumpre dizer que se a economia tradicional busca se apropriar da ideia de economia criativa, os setores populares também querem fazer isso, a economia criativa e também a colaborativa apareceram com a oportunidade de valorizar a diversidade natural, humana e cultural dos seres humanos, valorizando a diferença e os conhecimentos tradicionais, com baixo impacto ambiental.  A economia criativa – como qualquer outro ramos da economia – se aplica tanto aqueles que têm potência para buscar mercados, como aqueles que necessitam do fomento do Estado, ou de sistemas solidários e colaborativos para produzir.

É neste cenário de emergência de uma sociedade da informação e do conhecimento, da criatividade e inovação, que se enquadra a proposta de nossa Incubadora CriaAtiva, que assumiu a tarefa de pensar a economia criativa a partir de bases de uma economia solidária e colaborativa.

  1. O lugar: O Território Metropolitano de Salvador

Mapa 01 – Mapa da Bahia e território metropolitano de Salvador em destaque

O projeto de nossa Incubadora tem sede no território metropolitano de Salvador, Estado da Bahia, região do pais conhecida pela força de sua cultura, principalmente, herdada do povo negro que chegou a este país escravizado.

Terra de muitas belezas, mas também de intolerância religiosa, de preconceito de toda a natureza, de uma economia altamente concentrada baseada em poucas industrias que figuram no Polo Industrial de Camaçari, também situado no território metropolitano.

Por conta da multicampia da UNEB a incubadora tem como área de atuação todo o Estado da Bahia, em especial, o território metropolitano de Salvador, constituído dos municípios que podem ser vistos no Mapa 02.

Mapa 02 Imagem do mapa dos bairros que constituem o Centro Histórico e antigo da cidade.

As ações da Incubadora se dividiram entre os municípios de Camaçari, Lauro de Freitas e Salvador nesses dois anos apesar de muitos contatos e discussões com outros municípios.

Atualmente, a sede da Incubador funciona na Rua Gregório de Matos, Pelourinho, Centro Histórico de Salvador, localização estratégica para o projeto de constituição de APLs Criativos e SLICs no Centro Histórico e Antigo de Salvador, cuja metodologia veremos mais adiante.

O Centro Histórico e Antigo da cidade – como acontece em outras partes do mundo – respira cultura, história, artes, ao mesmo tempo em que sofre com o descaso das autoridades públicas, é palco de manifestações artísticas e culturais de todos os tipos e gêneros, com inúmeros grupos tradicionais e populares e demandarem o apoio de uma assessoria como a prestada pela Incubadora CriaAtiva. O mapa 03 apresenta a atual delimitação feita pelo Governo do Estado da Bahia com as obras de requalificação do Centro Antigo e Histórico da cidade.

Mapa 03 – Delimitação do Centro Histórico e Antigo de Salvador pelo Governo do Estado

Fonte - CONDER

  1. Os sujeitos

Os sujeitos podem ser individuais e coletivos são, respectivamente, as pessoas e movimentos sociais protagonistas das mudanças e transformações sociais. A universidade e a Incubadora tem o papel de (in)formar e assessorar esses individuos e grupos sociais para que estes possam exercitar seu protagonismo, participar e construir assim sua emancipação social. O próprio nome da Incubadora “CriaAtiva” traz em si a ideia de formação de sujeitos “ativos” e “participativos” que não buscam uma cidadania ativa que não só tem direito a ter direitos, mas cria novos direitos.

Nossos sujeitos ao longo desses dois anos de atividade foram estudantes de educação básica em artes e design; jovens dos bairros populares que querem mostrar sua arte, música e/ou a criação de uma aplicativo de celular para falar sobre a vida no bairro; mulheres que produzem artesanato a partir de retalhos de fábrica ou fardas reaproveitadas; feirantes; empreendedores que querem fortalecer a economia local, etc.

Como não se pode fazer sozinho um trabalho dessa natureza tivemos muitos parceiro nessa empreitada. Destacamos os seguintes: Centro Estadual de Artes e Design (CEEP); o Programa Mesa Brasil do SESC; os feirantes de São Joaquim e a Rede Recostura; o Projeto Agenda Camaçari; o Fórum de Empreendedores de Camaçari; o grupo cultura suingue e prosa; entre outros parceiros de nossas ações que nos ajudaram a viabilizar uma série de ações de formação e assessoria ano nosso público alvo ou interativo. Sem essas parcerias, seria impossível realizar todo o trabalho que foi desenvolvido.

A seleção desses sujeitos ou empreendimentos foi feita a partir da demanda deles pelo trabalho da Incubadora, nossa opção foi por atender uma demanda reprimida que não encontrava abrigo em outras Incubadoras ou em Núcleos de Inovação Tecnológica da Universidade.

Apresentado o contexto, vamos agora partir para o exame de nosso projeto de Incubadora.

  1. A INCUBADORA CRIAATIVA S³

A Incubadora CriaAtiva S³ (Social+Solidária+Sustentável) nasceu a partir de um projeto de pesquisa apresentado ao CNPq para a chamada pública MCTI/SECIS/TEM/SENAES/CNPq 089/2013.

Está registrada no Sistema Integrado de Planejamento (SIP) da UNEB e na Plataforma Carlos Chagas do CNPq como projeto de pesquisa, extensão e ensino, interdisciplinar e interdepartamental, vinculado ao Departamento de Ciências Humanas e Tecnologias (DCHT), Campus XIX, Camaçari.

Apesar de estar vinculado à Rede de Gestão Departamental Metropolitana da UNEB, o projeto reúne professores, estudantes e servidores dos diversos Campis da universidade.

Atualmente, a Incubadora integra a estrutura do Centro de Referência em Desenvolvimento e Humanidades (CRDH), órgão suplementar da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) em via de criação pelo Conselho Universitário (CONSU) UNEB. A infraestrutura de pesquisa, extensão e ensino do CRDH pode ser apreciada conforme figura 02.

Figura 02 – Plataforma de Pesquisa, extensão e ensino do Centro de Referência em Desenvolvimento e Humanidades (CRDH) UNEB

Fonte: CRDH/UNEB/Incubadora Tecnológica de Economia Solidária – CriaAtiva S³

Como pode ser visto na matriz apresentada na figura 02 a Incubadora é alinhada como Laboratório de Pesquisa Aplicada em Ciências Humanas, Sociais e Sociais Aplicadas, articulando-se com os outros laboratórios do CRDH, no caso, o Observatório da Educação em Direitos Humanos (OBEDHUC); o Observatório da Justiça, Economia, Ciência, Tecnologia e Inovação (OBJECTIVO); o Laboratório de Imagem, Memória e Documentação (LIMDO); o Laboratório de Áudio Sonorização e Iluminação (LASIO) e, por fim, o Laboratório da Rede Mbote (www.portalmobte.org) que é nosso portal na internet com informações para todos os atores.

A Incubadora está vinculada ainda a três Programas de Pós-Graduação (PPGs) o Mestrado Profissional em Gestão e Tecnologia aplicada à Educação (GESTEC), o Mestrado Profissional em Propriedade Intelectual, Transferência de Tecnologia e Inovação (PROFNIT) e o Doutorado Multi-Institucional e Multidisciplinar em Difusão do Conhecimento (DMMDC).

Em relação a sua equipe a Incubadora teve com o projeto do CNPq cinco bolsistas, sendo três bolsistas de nível superior e dois bolsistas de nível médio, em que pese, para estas bolsas também foram selecionados profissionais de nível superior.

Além dos bolsistas financiados com recursos do CNPq contribuíram com a Incubadora estudantes de iniciação cientifica, estudantes de graduação, bolsistas de extensão, estudantes de mestrado e doutorado, bolsistas de outros projetos de pesquisa, estudantes da pós-graduação e voluntários.

A tabela 01 mostra o perfil dos colaboradores da Incubadora CriaAtiva S³.

Tabela 01 – Perfil dos colaboradores do projeto da Incubadora Tecnológica de Economia Solidária

Ordem

Bolsista/voluntário

Quantidade

A

Professor pesquisador bolsista CNPq

01

B

Bolsista apoio técnico nível superior

02

C

Bolsista apoio técnico nível médio

02

D

Estudantes de pós-graduação

27

E

Estudantes de graduação

100

F

Estudantes de bolsista de iniciação cientifica

03

G

Bolsista de extensão

01

H

Técnico administrativo

01

I

Professor pesquisadores sem bolsa

02

J

Voluntários

05

Fonte: Incubadora Tecnológica de Economia Solidária – CriaAtiva S³

Em relação as profissões e habilitações técnicas dos integrantes da Incubadora no período analisado, são encontrados economistas, advogados, administradores, pedagogos, comunicadores, documentaristas, psicólogos, filósofos, sociólogos, participando do trabalho. Para a participação na Incubadora e no CRDH é necessário a assinatura de um Termo de compromisso de trabalho voluntário e a apresentação de um plano de trabalho onde constam dados como carga horária, dias da semana e atividades de trabalho.

A Incubadora CriaAtiva S³ tem como proposta funcionar com o tempo parcial dos pesquisadores e técnicos administrativos da universidade, bolsistas de pesquisa, iniciação científica e extensão e trabalho voluntário. Para formalização de todos os contratos de trabalho com a Incubadora é utilizado um Termo de Compromisso de Trabalho Voluntário com base nas Leis 13.297 de 2016 e 9.608 de 1998 que dispõe sobre o serviço voluntário como atividade não remunerada prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza ou a instituição privada de fins não lucrativos que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência à pessoa.

Por fim, a organização administrativa e acadêmica da Incubadora conta com um Comitê de Governança composto por professores, estudantes e bolsistas e integrantes do empreendimento. Existe também na proposta a figura do coordenador geral da Incubadora que faz a função de gerente de projeto. As deliberações depois de tomada são tornadas públicas através de Atos Administrativos e Memorandos Circulares.

  1. METODOLOGIA DE INCUBAÇÃO
  2. Indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão

A Incubadora estando vinculada a uma estrutura de pesquisa, extensão e ensino como CRDH acaba por ter uma grande preocupação como os aspectos epistemológicos, metodológicos e políticos da ação. Dizemos sempre aos membros da Incubadora que é preciso ser competente tanto nos aspectos políticos como acadêmicos da proposta. Nesse sentido, a Incubadora parte do princípio de que a formação pela pesquisa é um princípio educativo no ensino superior, assim como a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.

A metodologia da Incubadora caracteriza-se pela assessoria e educação jurídica popular, bem como a assistência para o empreendimento em bases populares, fortalecendo os princípios da economia solidária. A efetivação dos direitos humanos e da cidadania também estão fortemente presentes nessa proposta. A extensão universitária apresenta-se como um lócus privilegiado da relação entre a universidade e a sociedade, é através dela que se consegue a chegar ao desenvolvimento de soluções em parceria com a sociedade.

A extensão é mais do que uma função da universidade, mas uma forma de se fazer pesquisa e ensino. Hoje a Incubadora contribui com disciplinas na pós-graduação (mestrado e doutorado) e com disciplinas na graduação em direito, contabilidade e pedagogia. São articulados estudantes não só da UNEB como de outras Instituições de Ensino Superior (IES). A indissociabilidade entre pesquisa, extensão e ensino nos permite atender ao compromisso social da universidade ou a Responsabilidade Social Universitária (RSU)

Figura 03 – Indissociabilidade entre pesquisa, ensino e extensão como princípio metodológico para a Incubação de empreendimentos sociais e solidários.

 

Fonte: Incubadora Tecnológica de Economia Solidária – CriaAtiva S³

  1. Pesquisa-ação e Abordagem Baseada em Direitos Humanos (Human-Right-Based Approaches - RBA)

Dentre as metodologias de pesquisa e extensão a pesquisa-ação é a que mais se adequa as atividades da Incubadora. Seguimos as lições de René Barbier (2012) e Michel Thiollent (2007) em relação ao trabalho com as comunidades. O ciclo da pesquisa-ação pode ser visto na figura 04.

Figura 04 – Ciclo da Pesquisa-Ação

Figura 4 – Diagrama de Venn – Fases da Pesquisa-Ação

Com base nesse ciclo a Incubadora primeiro produz diagnóstico participativo com o grupo que se pretende o atendimento, depois é feita pesquisa e reflexão sobre o problema, bem como a construção da proposta de intervenção. O passo seguinte é negociar essa proposta de intervenção com o grupo e uma vez firmada as base iniciar a ação. Por fim, se faz necessário sistematizar todo o processo divulgando através de artigos e relatórios de pesquisa.

Por sua vez a Abordagem Baseada em Direitos Humanos (Human Right-Based Approaches - RBA) é uma metodologia recomendada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e utilizada por agências multilaterais e ONGs, para projetos e programas que trabalham com o direito ao desenvolvimento, especialmente, em setores como educação, saúde, governança, água, nutrição, saneamento básico, HIV/AIDS, emprego, relações de trabalho, relações sociais, desenvolvimento econômico sustentável entre outros.

  1. As múltiplas hélices para a inovação

A abordagem da Hélice Tríplice, desenvolvida por Henry Etzkowitz e Loet Leydesdorff, é baseada na perspectiva da Universidade como indutora das relações com as Empresas (setor produtivo de bens e serviços) e o Governo (setor regulador e fomentador da atividade econômica), visando à produção de novos conhecimentos, a inovação tecnológica e ao desenvolvimento econômico. A inovação é compreendida como resultante de um processo complexo e dinâmico de experiências nas relações entre ciência, tecnologia, pesquisa e desenvolvimento nas universidades, nas empresas e nos governos, em uma espiral de “transições sem fim”. Nesse prisma a Incubadora representando a universidade tem o papel de articular os diversos atores, emprestando sua credibilidade para a aproximação entre os atores, na formação de políticas públicas e construção de parcerias que favoreçam os empreendimentos.

Figura 05 – As múltiplas hélices da inovação

Fonte: Incubadora Tecnológica de Economia Solidária – CriaAtiva S³

  1. Ecossistema Solidário: Educação Empreendedora (Popularização da Ciência, Tecnologia e Inovação, Economia Solidária, Economia Criativa  e Empreendedorismo Econômico e Social). Incubação de Empreendimentos. Aceleração.

 

Em nossa filosofia a incubação de empreendimentos sociais e solidários depende da criação de uma ambiente, de um ecossistema favorável a esse propósito. A esse ecossistema corresponde três etapas distintas:

  1. Educação empreendedora,
  2. Incubação;
  3. Aceleração.

A figura 06 apresenta a organização desse processo.

Figura 06 – Etapas do Ecossistema para incubação de projetos sociais e solidários

Fonte: Incubadora Tecnológica de Economia Solidária – CriaAtiva S³

A primeira etapa corresponde a necessidade de (in)formação dos diversos atores, da popularização das ciências, tecnologia e inovação, do fomento ao empreendedorismo econômico e social, da difusão da economia solidária e da economia criativa, a proteção de conhecimentos populares e tradicionais. É nesta fase que realizamos seminários, workshops, cursos, oficinas, treinamentos, entre outros com o fim de promover a capacitação tanto técnica como política dos diversos atores.

A segunda etapa diz respeito a incubação, uma vez definido o escopo do empreendimento a incubadora apoia os atores a desenvolver seu projeto. Por fim, a fase de aceleração corresponde ao apoio desse empreendimento para ingresso em seu mercado, seja a produção para consumidores e empresas, seja para o setor público e social.

  1. Processo de Incubação

A figura 05 representa nosso processo de incubação e é uma ideia que ainda está em elaboração. É formado por cinco espaços ou níveis que correspondem ao estágio de maturidade do empreendimento.

O primeiro espaço é chamado de CriaAção, nele acontece a livre circulação de pessoas e ideias, corresponde as atividades de (in)formação onde o público alvo pode conhecer novas ideias e formatar sua proposta de empreendimento. Qualquer pessoa ou grupo pode participar desse espaço, mesmo que ainda não tenha uma ideia formada. Este momento existe justamente para fomentar ao desenvolvimento de novas ideias.

No espaço InovaAção são desenvolvidas as ideias, aqui o empreendimento pode a partir das informações trazidas ou conhecidas no espaço CriaAção desenhar seu projeto e definir o escopo do trabalho com orientação da equipe da Incubadora. O terceiro espaço é chamado de InteraAção, ambiente destinado a interação entre os empreendimentos e os diversos atores locais, bem como potenciais apoiadores dos empreendimentos. O quarto espaço é chamado de FormaAção, momento de realização de treinamentos e oficinas para fortalecimento da capacidade de autogestão dos empreendimentos. Por fim, o quinto e último espaço é chamado de IncubaAção, local onde – com a orientação da equipe – os empreendimentos podem desenvolver seu empreendimento até o ponto de ser graduado e encaminhado ao mercado.

Figura 5 - Processo de Incubação

A informalidade comum ao setor aliada ao fato de a Incubadora ter apenas dois anos de existência e a necessidade de capacitação previa levou a que até o momento os empreendimento atendidos ainda não tenham sido graduados, as fases de criação e formação foram realizadas de forma satisfatória, mas os processos de interação, inovação e incubação ainda precisam ser aperfeiçoados nos próximos anos.

  1. CONCLUSÃO

Ante o exposto vimos que o processo de incubação de empreendimentos sociais e solidários é bastante complexo, reúne tanto aspectos epistemológicos, metodológicos, acadêmicos e científicos como aspectos econômicos, políticos e culturais. Em termos práticos é um grande desafio para todos (as), tanto para os participantes do empreendimento como para a equipe do projeto universitário. No entanto, esse tipo de projeto se reveste de grande importância para o desenvolvimento de projetos de pesquisa, extensão e ensino mais sintonizados com os interesse da população e permite aos estudantes e pesquisadores o desenvolvimento de soluções e tecnologias sociais articuladas com a sociedade.

A metodologia de incubação ainda está em processo de elaboração, os dois anos de projeto não são suficientes para validar uma tecnologia social dessa natureza é preciso mais tempo. Esse tempo também é dos empreendedores que não se sentem totalmente seguros para dar um passo definitivo via a formalização de seu negócio, o país tem atravessado uma grave crise que tem adiado as decisões dos empreendimentos. Mas, se não é possível navegar, podemos construir as velas, pensando assim é que a Incubadora tem estimulado a formação dos integrantes dos empreendimentos através de cursos, seminários e oficinas.

O trabalho com novas formas de economia solidária, em especial, a economia criativa veio para ficar, é grande o número de projetos populares nesse campo que necessitam de apoio institucional. Como em qualquer outro ramo da economia, se existe mercado para os grandes investimento, existem também todo um segmento da economia que necessita do apoio institucional da universidade e do Estado. O desafio para os próximos anos é aprovar novos projetos e ampliar a ação para todo o estado da Bahia.

BIBLIOGRAFIA

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MASI, Domenico. A Economia do Ócio. Rio de Janeiro, Editora Sextante, 2001.

ROCHA, José Cláudio. A Reinvenção Solidária e Participativa da Universidade: Um Estudo sobre as Redes de Extensão no Brasil. Salvador, EDUNEB, 2008.

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TOURAINE, A. A Sociedade Pós-Industrial. Moraes Editores:Lisboa, Portugal, 1999.

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