12/07/2018

Mini-Histórias: Uma Possibilidade de Comunicação e Aprendizagens Sociais Na Educação Infantil

MINI-HISTÓRIAS: UMA POSSIBILIDADE DE COMUNICAÇÃO E APRENDIZAGENS SOCIAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Cristiele Borges dos Santos
Elaine Conte

RESUMO:

Trata-se de uma pesquisa-formação realizada com crianças e professores em uma Escola Municipal de Educação Infantil de Novo Hamburgo/RS, investigando de que forma a construção de saberes na Educação Infantil é desenvolvida e potencializada em práticas narradas de forma textual e imagética por meio de mini-histórias. Ao discutir sobre o uso de mini-histórias à apropriação de novas linguagens e aprendizagens sociais, concluímos que, embora novas experimentações na Educação Infantil possam trazer entraves às ações formais e convencionais de ensino, com as mini-histórias tornam-se visíveis práticas pedagógicas que visibilizam as intercomunicações e os vínculos formativos para a produção de conhecimentos das crianças.

Palavras-chave: Mini-histórias. Educação Infantil. Comunicação. Aprendizagens.

Introdução

O presente artigo visa discutir de que forma o uso de mini-histórias no cotidiano da Educação Infantil pode potencializar e viabilizar aprendizagens de crianças. Na verdade, há indícios que o Brasil é um dos países cuja população fica mais tempo assistindo programas de televisão e que praticamente a metade das crianças não lê ou nunca leu, pior que isso, não têm o hábito da leitura. O hábito da leitura pode ser estimulado desde que a criança nasce, desde o momento que a mãe estabelece interações com o bebê pelo olhar, pela fala e pelo gesto. Daí surge o desejo de investigar se as mini-histórias servem como dispositivo à produção de conhecimentos e à apropriação de novas linguagens e aprendizagens na infância. Com crianças pequenas é um desafio materializar suas aprendizagens, visto que, normalmente, os registros físicos por meio de trabalhos artísticos enviados às famílias fazem pouco sentido na experiência concreta das crianças de 1 a 2 anos. Dessa forma, será que as mini-histórias podem modificar essa realidade educacional? A utilização e o registro de mini-histórias traz sentido à educação e à multiplicidade de narrativas de cenas cotidianas presentes nos primeiros anos de vida da criança?

Historicamente, a Educação Infantil tem suas práticas marcadas pelo caráter assistencialista e compensatório do cuidado adulto-familiar na relação educativa (FARIA; DEMARTINI; PRADO, 2005). Mas, muitas pesquisas atualmente buscam mostrar que é possível superar barreiras da educação e produzir aprendizagens participativas pelas artes do fazer infantil, articulando projetos em que a criança seja a protagonista deste processo (MELO, 2011; ZABALZA, 2009). Nesta perspectiva, é emergente a necessidade de lançar luz a projetos educacionais e formativos que introduzam histórias e promovam a autonomia e as diferenças, respeitando a atuação da criança e dando voz a ela. Há muitos profissionais interessados em discutir e promover um trabalho de qualidade nas escolas de Educação Infantil. Muitas práticas significativas são realizadas nas escolas, contudo, acabam não tendo visibilidade e assim o senso comum continua acreditando que as creches[1] são lugares apenas de cuidado. Daí a necessidade de estudos para desmistificar esse entendimento e dar visibilidade às práticas educativas cotidianas.

Mini-histórias são breves relatos acompanhados de sequência de imagens que abordam questões extremamente necessárias como autonomia, comunicação e o saber-fazer dos bebês e crianças pequenas. O compartilhamento dessas mini-histórias é um poderoso meio para (inter)comunicar experiências, a fim de narrar uma criança que atua, aprende através da curiosidade e da relação com o mundo (FOCHI, 2015). O interesse pela temática surge de inquietações oriundas do trabalho como professora titular de uma turma de faixa etária 1 (crianças com 1 ano completo até 31 de março) no município de Novo Hamburgo, em 2017. A escola de atuação participa do Observatório da Cultura Infantil (OBECI), que é um grupo autogestionado[2] de profissionais da Educação Infantil interessados em discutir e refletir sobre o cotidiano na Educação Infantil e a formação de professores, inclusive o uso de mini-histórias permeia o Projeto Político-Pedagógico dessa escola. Este grupo foi criado em 2013 pelo professor Paulo Fochi e dele participam coordenadores pedagógicos e gestores de 5 escolas de Educação Infantil sendo três públicas e duas privadas. Por esta razão, vem ocorrendo iniciativas de experimentação de práticas diferenciadas nas escolas a partir de reflexões e formações promovidas pelo OBECI. Umas das práticas sugeridas é o uso de mini-histórias como um dispositivo para a reinvenção de práticas pedagógicas transformadoras na Educação Infantil. Em meio às metamorfoses do trabalho pedagógico, a docência dessa turma é compartilhada e por isso temos utilizado as mini-histórias como uma forma de pensar e aprimorar aprendizagens com as crianças.

            Dada a relevância de promover novas experiências na Educação Infantil, verificamos que é possível realizar um trabalho pedagógico de qualidade que vá além do caráter assistencialista na Educação Infantil, tendo como foco o cotidiano escolar vivenciado com as mini-histórias nas descobertas e experimentações das crianças. Ensinar a pensar e a procurar soluções no conviver dos múltiplos meios de expressão das crianças pode ser um dispositivo para outros professores que vivem realidades similares e que desconhecem essa forma de comunicação com as crianças. Há indícios de que as mini-histórias, principalmente na Educação Infantil na faixa etária de 0 a 3 anos são possibilidades para o desenvolvimento de uma cultura da infância, que passa pelo corpo (FARIA; DEMARTINI; PRADO, 2005). Por meio da pesquisa-formação e da praxiológica, abordamos a complexidade da experiência realizada na Educação Infantil a fim de materializar práticas e ações pedagógicas com crianças (JOSSO, 2006, OLIVEIRA-FORMOSINHO, 2017). A pesquisa pode ajudar a disseminar essa forma de comunicação que permite uma leitura rápida e de fácil compreensão. Esta forma de comunicar é pouco usada pelos profissionais de Educação Infantil, pelo fato de ser pouco conhecida. A partir do reconhecimento desta proposta, os profissionais podem inspirar-se e ter uma nova perspectiva sobre as práticas realizadas nas creches, desenvolvendo um olhar mais sensível com a construção do cotidiano nas escolas de Educação Infantil.

            Há muitas possibilidades de despertar o protagonismo infantil, até porque o ensino e a aprendizagem são construções coletivas entre os sujeitos envolvidos nesse processo. As crianças têm capacidade de serem artífices nas artes de fazer no cotidiano e devem ter oportunidade de criar suas próprias histórias desde os primeiros anos escolares. Precisamos deixar claro que a criança não é um futuro cidadão, ela já é um cidadão, com vontade, direitos e, dessa forma, deve ser respeitada em sua condição humana. O estudo está organizado nos seguintes tópicos: inicialmente, elaboramos uma revisão de literatura sobre os significados e sentidos das mini-histórias na Educação Infantil; em seguida indicamos o desenho metodológico do estudo e na sequência contextualizamos a historicidade das metodologias da infância. No tópico sobre os percursos e desdobramentos colaborativos com as professoras na produção das mini-histórias apontamos os principais resultados identificados até o momento e, por fim, trazemos as reflexões finais.

REVISÃO DE LITERATURA – O QUE SÃO MINI-HISTÓRIAS?

As mini-histórias surgem recentemente de pesquisas realizadas por David Altimir (2010) e Paulo Fochi, em seu livro, Afinal, o que fazem os bebês no berçário, publicado em 2015. Nessa obra, o autor dedica um capítulo às histórias narradas e apresenta, então, o conceito de mini-histórias como breves relatos sobre a comunicação, a autonomia e o saber-fazer dos bebês nas relações e compartilhamentos das crianças.

O compartilhamento dessas histórias é uma forma de produzir conhecimento sobre os bebês, para narrar uma imagem de criança que é, faz, atua, e está curiosa para estar e se relacionar com o mundo. Em meio a elas, também nascem interrogações aos adultos que acompanham a criança – os professores, auxiliares e a mim mesmo, como pesquisador. Dessa forma, a partir da imagem de bebê, constrói-se uma imagem de professor para os bebês, provocada pela emergência da observação, do registro, e da reflexão sobre o que elas fazem.  (FOCHI, 2015, p. 95).

As crianças desde seus primeiros anos de vida são seres capazes de iniciativas, de expressar sentimentos, gostos, dramas, anseios e dores. Na verdade, desde que nascem são cidadãos que pensam, agem e se relacionam com o mundo. Assim, constituem suas identidades sociais, produzem conhecimentos e fazem investigações a todo momento, expressando-se através da linguagem oral. e de gestos suas descobertas e experimentações cotidianas. Fochi (2015) afirma que as mini-histórias são uma invenção que preza por uma cultura da infância e que foi inspirada no conceito desenvolvido de David Altimir. Por essa razão, pouco ainda se conhece dessa prática, por ser um conceito relativamente novo, pouco projetado nas práticas pedagógicas e abordado por poucos profissionais.

Inspirado pelo livro “Como eschucarla infância”, de David Altimir, entendi que a escrita das mini-histórias sobre o cotidiano nos ajuda a tornar fatos episódicos visíveis, e que, se mantidos na sombra, podem deixar muitos aspectos a respeito do valor educativo da educação infantil esquecidos ou perdidos, assim como as formas que as crianças usam para conhecer. A definição que Altimir (2010, p. 84) dá para a ideia de mini-histórias é “[...] de pequenos relatos, alguns com um denso passado, outros com muito futuro e, alguns, simples instantes”. No OBECI, temos tratado as mini-histórias como as rapsódias da vida cotidiana que, ao serem narradas textualmente e imageticamente, tornam-se especial pelo olhar do adulto que as acolhe, as interpreta, e dá valor para a construção da memória pedagógica. (FOCHI, 2017, p. 42).

As mini-histórias como Fochi e Altimir apontam são fatos episódicos do cotidiano, que expressam momentos mais significativos e que vem de construções que as crianças realizam na trajetória formativa, assim como podem ser os registros de instantes vividos por elas, de algo curioso que naquele momento o adulto conseguiu registrar fotograficamente e dar outro sentido, transformando-se em uma memória autoformativa das itervenções pedagógicas. Loboruk (2016) traz em seu Trabalho de Conclusão do Curso de Especialização em Docência Infantil um trecho que ilustra uma preocupação e interesse por pesquisar e dar visibilidade às práticas educativas com crianças pequenas. Tudo indica que:

Ser professora de bebês é escutar constantemente nas conversas entre familiares e amigos frases como “que lindo! Tu passas o dia cuidando deles?” ou “mas tu também trocas as fraldas e dás comida?”. São nestes momentos em que reflito na beleza que é o conhecimento e o quanto ele é capaz de transformar a realidade e construir opiniões. Não parto do princípio que todos ao meu redor necessitam saber que a Educação Infantil, em especial a educação com bebês, não é apenas cuidar; que trocar fraldas não é apenas um ato de higiene; que dar uma refeição não é apenas alimentar o pequeno ser que ainda não é independente para isso. Pois, acredito que carrego uma função primordial para a valorização desta imensa responsabilidade que é ser educadora na primeira infância ao buscar constante por conhecimentos construídos na área, revisitar conceitos e abastecer-se de informações. Fazer tais movimentos é fundamental, não somente para valorizar a profissão ou ter respostas para as clássicas perguntas, mas porque escolher trabalhar com a educação é conviver com pessoas, crianças, bebês e gerações, sabendo que estes nunca serão iguais. Eles modificam-se, recriam-se e afetam a nós, professores, que devemos tentar acompanhar tais transformações. (LOBORUK, 2016, p. 12).

            Nessa abordagem, ser professora de crianças pequenas é dar condições de possibilidade para que as crianças tenham seus direitos assegurados, tal como sustenta a legislação no Art. 53, Cap. IV, Estatuto da criança e do adolescente. “A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II - direito de ser respeitado por seus educadores” (BRASIL, 1990).

A educação além de ser um direito do sujeito precisa ser construída com responsabilidade crítica e reflexiva por parte dos professores, para todas as idades. As inquietações de Loboruk (2016) vem ao encontro do que vivenciamos na prática e de questões que surgem na atuação na Educação Infantil. A ideia de ser professora está ligada ao entendimento consensual de dar aula ou ministrar disciplinas nas escolas. É difícil para as pessoas em geral compreenderem que profissionais da Pedagogia podem atuar com a unidocência e pluridocência, ou mesmo na forma de docência compartilhada. Mais difícil ainda reconhecerem que na Educação Infantil se ensine algo a mais do que é vivido em casa com os pais e familiares, pois o caráter assistencialista, historicamente construído, está muito atrelado ao imaginário social das escolas de Educação Infantil.

O cuidado é parte essencial da vida humana e intrinsecamente, relacionado aos processos pedagógicos, visto que é inviável aprender algo quando não estamos bem. A própria comunidade escolar não imagina a quantidade de conhecimentos que um profissional da educação deve saber e adquirir para atuar com crianças. Nesse sentido, é muito importante estudos para agregar valor e dar visibilidade ao que acontece dentro das escolas, desvelando a rica matéria-prima que é participar e desenvolver práticas pedagógicas com as crianças.  A inquietação desse trabalho considera também o fato da não valorização do profissional que trabalha com crianças pequenas. Este não ensina a ler e escrever - pois nem é esse o objetivo da Educação Infantil- contudo, deixa marcas profundas e duradouras no desenvolvimento das crianças que passam por ele.

            Hoje é difícil falar sobre pesquisas em Educação Infantil, que respeite a criança portadora de direitos, sem citar Malaguzzi (1999), professor italiano que delineou a abordagem pedagógica centrada na criança e em todas as suas linguagens, como muito bem observa em seu poema As cem linguagens:

Ao contrário, as cem existem / A criança é feita de cem. / A criança tem / cem linguagens / cem mãos / cem pensamentos / cem modos de pensar / de jogar e de falar / cem sempre cem / modos de escutar / as maravilhas de amar / cem alegrias / para cantar e compreender / cem mundos / para descobrir. / Cem mundos / para inventar / cem mundos / para sonhar. / A criança tem cem linguagens / (e depois cem cemcem) / mas roubaram-lhe noventa e nove. / A escola e a cultura / lhe separam a cabeça do corpo. / Dizem-lhe: / de pensar sem mãos / de fazer sem cabeça / de escutar e de não falar / de compreender sem alegrias / de amar e maravilhar-se / só na Páscoa e no Natal. / Dizem-lhe: que descubra o mundo que já existe / e de cem roubaram-lhe noventa e nove. / Dizem-lhe: / que o jogo e o trabalho / a realidade e a fantasia / a ciência e a imaginação / o céu e a terra / a razão e o sonho / são coisas que não estão juntas. / E lhes dizem / que as cem não existem. / A criança diz: / ao contrário, as cem existem (MALAGUZZI, 1999, p. 1).  

Para a elaboração de mini-histórias é necessário que o professor tenha um olhar sensível ao cotidiano escolar de Educação Infantil. O uso da fotografia nesse sentido não é um ato neutro, como afirma Vial (2014, p. 37):

Percebe-se que a documentação através da fotografia não é neutra, pois está carregada de significados e escolhas por aquele que a utiliza para a produção da imagem, tendo em vista resultados que são frutos de um olhar intencionado, carregado de subjetividades, pois a fotografia é uma maneira de ver o real e não uma visão em si mesma.

            Ao contrário do que muitos acreditam quando algo novo aparece no segmento da educação, a inovação tem a ver com o ressignificar o antigo, por meio da transformação educativa que passa fundamentalmente pela visão e atuação do professor. As inovações e estudos na área surgem como uma possibilidade de discutir o papel social do professor como um mediador e provocador de novos conhecimentos e cenários educacionais. Na construção das mini-histórias a intenção, escolha e seleção dos contextos e situações observáveis pelos professores é essencial. Sua interpretação diante dos observáveis é que definirá a forma de tornar visível as aprendizagens, a partir das mini-histórias.

A ideia das mini-histórias está ligada à revisitação dos observáveis produzidos pelos professores no cotidiano da Educação Infantil. A partir de uma breve narrativa imagética e textual, o adulto interpreta esses observáveis de modo a tornar visível as rapsódias da vida cotidiana. Essas rapsódias são fragmentos poéticos, portanto sempre episódicos que, quando escolhidos para serem interpretados e compartilhados, ganham valor educativo. (FOCHI, 2017, p. 98).

Quando o professor faz seu planejamento com enfoque nas mini-histórias pode usar esses registros imagéticos para, a partir destes constatar e ter sinais do que desenvolver com o grupo de crianças. Para a produção das mini-histórias são feitas essas escolhas, por vezes, a sequência fotografada pode ter de 10 a 15 fotos. O professor terá que eleger dentro dessas as que mais fazem sentido e traduzem o objetivo da sua narração. Não é uma tarefa simples, pois as escolhas trazem as interpretações e relações do adulto com o contexto. O ato de registrar, fotografar também é repleto de significações e experimentações. É necessário um cuidado ao fazer os registros para que as fotos possam comunicar a ação da criança como foco principal.

Nessa abordagem, o registro e a seleção das fotos para a escrita das mini-histórias precisa levar alguns pontos em consideração, ou seja, as fotos devem ter boa luminosidade; o plano de fundo deve ser esteticamente limpo sem muitas informações; as fotos devem ser tiradas na altura da criança; deve-se registrar momentos espontâneos e não criar cenas solicitando ações; as fotos selecionadas devem ter informações diferentes, não repetir a mesma ação por exemplo. Não é necessário ser um profissional da fotografia, mas é importante observar esses cuidados para uma produção com qualidade estética.

As crianças gostam de ser vistas e reconhecidas, de terem sua voz e seus desejos ouvidos. Da mesma forma, os professores esperam que seu trabalho seja reconhecido.

Comenta Malaguzzi que el niño o laniñ aesperan ser vistos. Que sin teatro o sinplatea, las criaturas se vuelven invisibles e inexistentes. También muchas maestras esperan que sutrabajo sea visto y reconocido. La documentación se convierte em memoria viva y visible del proceso compartido com los alumnos y alumnas, y no se centra tanto em los produtos finales. (HOYUELO, 2007, p. 6).

Muito é feito dentro das escolas, mas a visibilidade destes trabalhos é restrita e muitas vezes negligenciada pelas famílias das crianças e pela própria comunidade escolar. O profissional da educação deve encorajar-se e mostrar as práticas desenvolvidas nas escolas, sejam elas de sucesso ou não, exercitando o hábito da pesquisa como prática pedagógica em todas as instâncias formativas, sejam elas escolas públicas ou privadas. O reconhecimento e a valorização do profissional da Educação Infantil só ocorrerá quando o professor for valorizado em termos de salário digno e formação na área, estudando e apropriando-se cada vez mais da cultura da infância. Nessa etapa da educação, respeitar e reconhecer a criança como cidadão de direitos implica estar em constante formação pedagógica, sendo também sinônimo de respeito à criança e ao próprio ofício, que visa capacitar integralmente o sujeito dando condições de possibilidade ao desenvolvimento sadio e com descobertas, experimentações, ensinando a pensar e a procurar soluções no aprender a conviver, cooperar, respeitar, esperar, transformar e recriar saberes brincando. Cabe destacar que não podemos continuar repetindo práticas mecânicas sem sentido e descontextualizadas.

O cotidiano das escolas de Educação Infantil é de suma importância para planejar momentos que propiciem experiências significativas. (AZAMBUJA; CONTE; HABOWSKI, 2017). Quando temos um olhar sensível ao cotidiano, conseguimos colocar a criança como protagonista e as mini-histórias. Nesse sentido, os processos de desenvolvimento da criança surgem de ações cotidianas na interação com os outros e tem relação estrita com o currículo, conforme afirmam Carvalho e Fochi (2017, p. 29):

Desse modo, defendemos que o cotidiano, em sua relação com o currículo, é um importante catalizador de experiências. Acreditamos que é a partir da potência do cotidiano (da vida emergente das relações ordinárias estabelecidas no contexto institucional) que podemos pensar no desenvolvimento de potentes ações pedagógicas que propiciem às crianças assumirem o papel de protagonistas na construção dos conhecimentos e de parceiros de jornada com os adultos professores.

            As práticas desenvolvidas com crianças, mesmo as mais pequenas, devem ter um cuidado estético e uma responsabilidade educacional. As crianças pequenas merecem e precisam ser respeitadas, no sentido do professor pensar em formas de despertar novas aprendizagens e propiciar com rigor científico experiências que promovam o desenvolvimento autônomo. É necessário pensar e planejar a jornada das crianças, refletindo qual a melhor maneira de dar visibilidade às práticas desenvolvidas, a fim de que o trabalho realizado também seja visto e esteja em evidência na comunidade escolar e para as famílias. As mini-histórias vem a este encontro, mostrando que o cotidiano tem muita importância para a criança e é um grande potencializador de aprendizagens evolutivas, especialmente quando o adulto consegue desenvolver um olhar empático, sensível e de respeito pelos saberes e fazeres da infância.

HISTORICIDADE DAS METODOLOGIAS DA INFÂNCIA NO BRASIL

A palavra “creche” causa incomodo a muitos educadores pelo fato de esse termo estar relacionado estritamente ao cuidado. Quando se fala em creches, logo se relaciona a um lugar de cuidado infantil, onde as famílias deixam as crianças para poderem trabalhar. Esperam da creche um lugar onde a criança seja cuidada e que tenha todas as necessidades atendidas. É evidente que o cuidado é essencial nas escolas da primeira infância, mas o trabalho na Educação Infantil vai muito além do caráter assistencialista. Apesar disso, o termo creche é usado na lei para nomear o segmento escolar formativo das crianças de 0 a 3 anos.

            A infância no Brasil tem sido mais discutida nos últimos tempos e muitas produções acerca deste tema tem emergido em virtude das mudanças legais como a educação fundamental de nove anos e consequentemente a inserção da criança cada vez mais cedo na escola com a ampliação da oferta de vagas na Educação Infantil. Contudo, pouco se fala sobre as culturas infantis. Os saberes constituídos sobre a infância priorizam mais as questões legais, normativas e históricas das crianças do que a infância a partir do viés da própria construção cultural. (FARIA; DEMARTINI; PRADO, 2005). Segundo as autoras, a história da infância tem relação direta com a história do atendimento às crianças expostas a vulnerabilidade social. A infância como questão pública está subordinada a interesses econômicos. Essa relação até hoje ainda acontece, pois erroneamente se julga que só a criança pobre deve ter acesso à educação pública. Ao mesmo tempo em que acreditamos que a educação deve sim colaborar para a melhoria da qualidade de vida das camadas menos favorecidas, também pensamos que educação é direito de todos independentemente de classe ou origem social. Também educar as crianças é uma obrigação de todos e passa por diversas instâncias sociais, começando pela família. Precisamos ir além de um pensar distributivo sobre merecimento de vaga. Essa visão equivocada de que a escola pública é apenas para a criança pobre e as outras crianças precisam pagar para frequentar essa etapa da educação. Em alguns municípios, como de Novo Hamburgo/RS, não se leva em consideração a renda da família para critério de vaga, pois se parte do princípio de que educação é um direito de todas as crianças.

Se analisarmos do ponto de vista histórico, veremos que as creches foram criadas para cuidar das crianças pequenas para que as mães pudessem sair para trabalhar. A Revolução Industrial, no século 18, na Europa, deu espaço ao emprego para mulheres, o que provocou uma mudança na forma de cuidar e educar as crianças. No Brasil, a situação foi parecida, contudo, aqui a creche e o orfanato eram quase a mesma coisa, pois muitas crianças atendidas eram órfãs, abandonadas e filhas de mãe solteira (FARIA; DEMARTINI; PRADO, 2005). O assunto da oferta de creches é abordado desde a década de 80 nas leis. A constituição de 1988 traz que é dever do estado o atendimento em creches e pré-escolas de crianças de 0 a 6 anos (art. 208). Já a Lei de Diretrizes e bases da Educação Nacional (LDB, art. 89) dá a prazo de três anos a partir de sua publicação para que as creches se integrassem ao sistema de ensino.  (DIDONET, 2001).

  

            O caráter assistencialista ligado às creches tem sido desmistificado em muitos países. No Brasil, muitas instituições e profissionais lutam arduamente para que o trabalho na Educação Infantil seja um trabalho de formação humana e de invenção do cotidiano qualificado. O profissional que atua na primeira infância não pode ter a mesma formação que a “tia” que cuida de crianças. Pedagogos nas escolas devem ser chamados de “professores(as)” ao invés do termo tio(a), sora, que revelam uma depreciação profissional. Contudo, muitos, continuam fazendo papel de “tia”, educando por instinto e inspiração, sem procurarem uma formação sólida, que respeite as crianças em suas singularidades e autenticidade. A respeito desse debate, em seu livro “Professora sim; Tia, não: Cartas a quem ousar ensinar”, Freire (2015, p. 9) diz: “ensinar é profissão que envolve certa tarefa, certa militância, certa especificidade no seu cumprimento, enquanto ser tia é viver uma relação parentesco. Ser professora implica assumir uma profissão, enquanto não se é tia por profissão”.

            Para que o segmento creche seja valorizada é necessário também que os profissionais pedagogos tenham consciência que para educar crianças é necessário constante formação e atualização. Há práticas tradicionais vivenciadas na antiga pré-escola que não fazem sentido nas creches. Tudo mudou, principalmente as crianças, e as mudanças ocorrem cada vez mais rápidas, a cada ano novas turmas chegam nas creches e surpreendem pela dicotomia entre os anos anteriores e entre as próprias crianças de uma mesma turma.

CAMINHOS METODOLÓGICOS

O estudo tem como enfoque metodológico a pesquisa-formação, pois foi realizado a partir da observação e participação em uma uma prática escolar de Educação Infantil de Novo Hamburgo. Optou-se por essa estratégia de desvelar e ressignificar os debates na arena do cotidiano escolar, visto que a pesquisadora trabalha nesse grupo cultural e pode, com base na própria experiência pedagógica, coletar os dados e significados com o grupo de crianças (17) e professoras (3), desde que manifestem o interesse em participar de forma voluntária e livre de coerções. Estas professoras estão especificadas na experiência da pesquisa como Professora 1; Professora 2; Professora 3, para manter o anonimato das participantes da faixa etária 1 (crianças com 1 ano completo até 31 de março), de uma escola pública de Educação Infantil de Novo Hamburgo/RS, no ano de 2017. A coleta dos dados ocorreu principalmente por meio de observação, entrevistas e notas de campo. O projeto estendeu-se ao ano de 2018, incluindo uma nova turma de faixa etária 1 na pesquisa, com as mesmas características da turma anterior (17 crianças), porém, novas e 3 professoras, sendo uma delas a pesquisadora.

 Cabe destacar que a pesquisadora também era professora da escola e utilizou a experiência pedagógica da própria prática realizada, juntamente com as outras professoras que abraçaram a proposta de desvelar em equipe e com as crianças as potencialidades das mini-histórias. A ideia de pesquisa-formação é abordada por Josso (2006) e converge com essa pesquisa, em termos de dar condições ao desenvolvimento de um trabalho autoral, de uma experiência pedagógica conjunta, onde todos participam da pesquisa, ressignificam a forma de atuar, o que traduz também um trabalho de elaboração com olhares cruzados sobre uma mesma questão. Há figuras de ligação ao longo da pesquisa, ou seja, educadoras que unidas por um objetivo comum constituíram a pesquisa em foco. Para Josso (2006), “ligar”, “religar” e “desligar” é muito importante na compreensão do nosso processo de construção de conhecimento e formação enquanto ser humano.

É o momento em que se trata de compreender como essa história articula-se como um processo — o processo de formação — que pode ser depreendido mediante as lições das lembranças que articulam o presente ao passado e ao futuro. Será o estabelecimento dessa perspectiva temporal que permitirá nomear os ‘argumentos’ da história. Nessa fase do trabalho biográfico centrado na compreensão e na interpretação dos relatos com olhares cruzados, novos tipos de laços aparecerão. (JOSSO, 2006, p. 378).

            Junto com a ideia de pesquisa-formação, somou-se também a dimensão praxiológica defendida por Oliveira-Formosinho (2017, p. 4):

Esta práxis de descoberta busca transformar o espaço e o tempo que a criança vive, as interações e relações que vivencia, o cotidiano da aprendizagem que experiencia, as atividades e projetos que desenvolve, a avaliação em que participa. O aprender da criança não é um fenómeno meramente interior, é uma realidade que depende quer da sua natureza quer da experiência ambiental, no contexto de uma cultura. O aprender da criança é situado, contextual, cultural, experiencial, interativo e comunicativo, reflexivo. Desafia, assim, a identidade de uma praxis que precisa de ser responsiva ao ator principal da aprendizagem – a criança enquanto identidade que se desenvolve em direção à herança socio-histórico-cultural, através da mediação pedagógica respeitosa desenvolvida no território vivencial que é o cotidiano da práxis enquanto locus da pedagogia.

            A dimensão praxiológica está muito presente na prática dessa pesquisa e na prática cotidiana das professoras onde a pesquisa foi realizada. Constantemente as educadoras buscam criar espaços de aprendizagem e experiências concretas na escola. É preciso muita responsabilidade com a aprendizagem da criança e ter ciência que o cotidiano está diretamente ligado às suas aprendizagens. A proposta aqui relatada expressa uma dimensão praxiológica de um desenho formativo, pois as mini-histórias narram esse cotidiano repleto de experiências.

A narrativa é um caminho para criar significado quando as atividades e projetos permitem que as crianças usem os sentidos plurais inteligentes e inteligências sensíveis plurais. Quando o professor é um "colecionador" de artefatos infantis culturais, pode facilmente iniciar a conversa, a comunicação, os diálogos em torno desses artefatos e a experiência que os criou, fazer disponível para a criança a documentação que a ajude a revisitar a aprendizagem, a identificar os processos de aprender a aprender a celebrar as realizações. As crianças conceitualizam-se como pessoas que aprendem quando têm acesso às jornadas de aprendizagem através da documentação. A complexidade deste processo permite a criação de memória e significado e impulsiona a criatividade (FORMOSINHO; OLIVEIRA-FORMOSINHO, 2008; OLIVEIRA-FORMOSINHO, 2015, p. 28).

As mini-histórias podem ser consideradas esses artefatos infantis que narram a jornada das crianças e dão acesso e sentido ao mundo da infância. Esses registros podem ser utilizados para o diálogo com outras experiências de mundo, para gerar (auto/re)conhecimento e acesso ao mundo das experiências infantis, estabelecendo uma forma de circular de comunicação e aprendizagens.

PERCURSOS E DESDOBRAMENTOS COLABORATIVOS COM AS PROFESSORAS NA PRODUÇÃO DAS MINI-HISTÓRIAS – RESULTADOS

            A experiência começou a ser desenvolvida no início do ano de 2017, a partir da sugestão da equipe pedagógica da escola. Inicialmente, as mini-histórias eram produzidas em um layout diferente do que a utilizada posteriormente com esse estudo (durante o estudo foi alterando-se). O texto-relato era organizado em uma folha e a imagem em outra, tendo assim duas folhas comunicando a mesma mini-história. A partir da observação da coordenadora e de algumas professoras envolvidas com a proposta, iniciamos a produzir as mini-histórias em uma única folha com o texto e imagens em harmonia, propiciando assim uma melhor visibilidade e entendimento, principalmente das sequências das ações. Outras metamorfoses e aprofundamentos dessa proposta também foram evidenciadas com a forma de exposição das mini-histórias que, inicialmente, eram colocadas em um mural verde ao lado da porta da sala da turma e era exposta uma mini-história por semana. Essas acabavam não sendo vistas e pouco chamavam a atenção. Assim, a forma de expor também foi alterada, sendo colocadas em um varal que permitia que quatro mini-histórias pudessem permanecer expostas. Assim foi se fazendo um revezamento colocando novas e guardando antigas a cada semana. Outra alteração realizada foi colocar o título de cor diferente para chamar mais a atenção e colocar a data de escrita na mini-história, pois quando muitas estavam produzidas houve dificuldade em expor estas de forma temporal.

            Uma mesma mini-história pode envolver várias crianças, assim cada criança recebe no final do ano uma pasta com as mini-histórias que protagonizou, mas que podem ser as mesmas do colega, gerando a importância da criação em união, do trabalho colaborativo, para fortalecer as aprendizagens pessoais e sociais. Assim são feitas cópias impressas da quantidade de crianças presentes naquela mini-história. As crianças interagem muito nessa faixa etária, sendo incentivado o respeito e o carinho, consequentemente, a turma demonstra afetividade e respeito entre si, sempre se ajudando nas questões cotidianas. Quando está sendo feito alguma sequência de imagens que pode resultar em uma mini-história são incentivadas ações grupais. Porém, sempre aliando a possibilidade de construção da autonomia na interdependência, a fim de que as mini-histórias realmente sejam naturais e resultados das ações, curiosidades e produções das próprias crianças. Cabe salientar a necessidade e o papel fundamental do professor para registrar e ter um olhar sensível da realidade, das sutilezas e das emoções que brotam e rodeiam o cotidiano da escola, desenvolvendo uma relação empática e sensível com o entorno.

            As educadoras tiveram que ir readequando e ressignificando a proposta das mini-histórias de acordo com a realidade da escola e das crianças, principalmente para alcançar os objetivos propostos. A intencionalidade das professoras era potencializar e democratizar as mini-histórias na escola para todas as crianças. Em certo momento, as participantes verificaram a ausência desses registros de algumas crianças, principalmente das crianças que frequentam a escola meio turno. Como passam menos tempo na escola as possibilidades de registro de suas ações diminuem. Assim, as professoras começaram a ter mais atenção e sensibilidade para que conseguissem registros de todos e pudessem valorizar a construção de conhecimentos e emoções textuais-imagéticas de todas as crianças. Nessa idade tudo é descoberta, então, mesmo ações que para nós adultos são simples, para eles são grandes conquistas e experimentações.

            

MAS AFINAL, COMO PRODUZIR UMA MINI-HISTÓRIA?

            Não há uma única forma de produzir mini-histórias. A intenção aqui não é colocar um manual pronto, mas apresentar uma experiência realizada por um grupo de professoras e crianças em um dado contexto. A partir da teoria e exemplos desenvolvidos por Fochi, as professoras participantes, pesquisadas e pesquisadoras ao mesmo tempo, fizeram ressignificações de acordo com sua realidade e encontraram uma forma de produzir estes relatos acompanhados de pequenas cenas que no seu conjunto compõem toda ação. A seguir, ilustramos de forma resumida e simples, os significados projetados e evidenciados pelas três educadoras que compõem o estudo cooperativo. Os trabalhos construídos foram apresentados à comunidade escolar em forma de mini-histórias. Durante a jornada das crianças na escola são feitos registros de imagens sequenciais sobre ações individuais e grupais, conforme ilustram as sequências de histórias que seguem abaixo, elaboradas pelas professoras.

  

Figura 1 – Exemplo de sequência de registros feitos pelas professoras.
(Professora 2, 2017)

Posteriormente, essas imagens são analisadas e são produzidas pequenas narrativas de forma textual e imagética. O objetivo é compartilhar o entendimento, o desejo e as interações que ocorrem com esse grupo de crianças pequenas.

Figura 2 –Mini-História produzida a partir dos registros.

(Professora 1, 2017)

Figura 3 – Mini-História produzida a partir dos registros.

(Professora 1, 2017)

Figura 4 – Mini-História produzida a partir dos registros.

(Professora 1, 2017)

Figura 5 – Mini-História produzida a partir dos registros.

(Professora 1, 2018)

 

Como viés de consolidação desse projeto, esses relatos acompanhados de registros de imagens normalmente eram impressos em folha A4 e expostos em um varal em frente à sala da turma. Permaneciam expostos em média por um mês, para que as famílias pudessem visualizar. A cada semana era colocada uma nova mini-história e retirada uma outra.

Figura 6 – Mural onde as Mini-Histórias são expostas.

(Professora 3, 2017)

 

Houve um retorno muito positivo em relação ao projeto, que foi desenvolvido ao longo do ano de 2017 e que já está sendo retomado e desenvolvido com uma turma ao longo de 2018. Segue dois relatos que ilustram a satisfação das famílias:

Olá profes queridas, eu ainda não sei escrever, por isso a Mamãe vai fazer por mim. Neste ano de 2017 eu iniciei minha jornada no mundo da escola, um mundo no qual aprendo a brincar, a dividir os brinquedos com os colegas por mais difícil que seja. Aprendi que temos horários para comer, para fazer aquele soninho gostoso. Minha mamãe fala pro Papai que eu mudei bastante, que eu estou mais falante, e que a escolinha foi muito bom. Mamãe também conversa comigo que nossos desenhos são muito lindos, que nossas Mini-Histórias são muito legais e eu amo todas vocês”.  (Relato entregue às professoras, no fim do ano letivo de 2017, como forma de homenagem e agradecimento)

 “Quando sai da sala do meu Pitoco (em seu terceiro dia de adaptação) vejo ele sorridente em fotos espontâneas e tão lindas, então os olhos se encheram de lágrimas em saber que ele está em um ambiente acolhedor, repleto de amor e com professoras que acreditam nas mesmas coisas que eu. Ele será muito feliz em sua primeira escola, pois viverá de verdade a infância na sua essência. Obrigada escola por toda acolhida e amor por nossos pitocos. Profe  que texto mais lindo e cheio de amor”.  (Relato postado no facebook em fevereiro mãe de educando)

Sem sombra de dúvidas, a experiência vivenciada com as mini-histórias contribuiu para compreender que um trabalho de qualidade com crianças pequenas é possível. Compreendemos também que quando as famílias conseguem visualizar as aprendizagens dos filhos, sua participação na escola se modifica, afinal, o envolvimento da família na escola é de grande importância e influencia no desenvolvimento das crianças, tanto nas questões de ensino e de aprendizagem quanto nas construções das relações emocionais, intelectuais e socioafetivas. Contudo, o entendimento compartilhado das famílias de que seus filhos estão tendo acesso a uma educação pública e um trabalho de qualidade e de maneira colaborativa, agrega um sentido formativo e de comunicação das jornadas de aprendizagens das crianças com respeito às próprias construções históricas e de direito à educação reconhecida.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As mini-histórias ainda que sejam pouco conhecidas e exploradas pelos profissionais da Educação Infantil podem ser uma forma interessante de intercomunicar as experiências de aprendizagens evolutivas num processo próprio de pedagogias autorais, participativas, aprendentes e comunicativas (ALTIMIR, 2010; FOCHI, 2017). Compreendemos que as crianças são seres capazes, cheios de possibilidades e potencialidades. Uma escola da infância deve valorizar toda forma de expressão e ser capaz de articular aprendizagens colocando a criança como protagonista. Os professores e as crianças precisam ser agentes de mudança social no processo de ensino pela via da autonomia e da curiosidade, no sentido de desenvolver práticas reflexivas e em diálogo com os problemas contemporâneos, para aperfeiçoar a capacidade de fazer experiências estimuladoras de decisão e de responsabilidade pelo mundo. Daí que as mini-histórias representam uma forma de aprendizagem, de construção do conhecimento sustentado em práticas e planejamentos na Educação Infantil, por meio de atos de criação, partilha e abertura às novas construções nesse movimento virtuoso que articula a perspectiva das crianças.

Nesse sentido, destacamos a importância da formação do professor, pois o profissional que trabalha com a primeira infância precisa provocar e ser estimulador de múltiplos conhecimentos e estar em constante atualização. O artigo investigou a prática de professoras na produção das mini-histórias de uma escola de Educação Infantil pública de Novo Hamburgo/RS e concluiu que é possível desenvolver um trabalho de qualidade na Educação Infantil, mas requer profissionais envolvidos e capacitados que possam ir além do amor pelo que fazem, buscando novas formações e saberes necessários à prática educativa que desenvolvem. Concluímos com a ideia de que os profissionais da Educação Infantil precisam mostrar suas práticas pedagógicas como forma de inspirar e sensibilizar as crianças e os familiares para uma educação de qualidade, consolidando assim um processo pedagógico de (re)construção de significados, pois com essas práticas certamente o panorama educacional pode ser alterado. A visibilidade e o reconhecimento dessas práticas trará consequências positivas ao desenvolvimento infantil articulado ao trabalho desenvolvido, o que acontece com uma boa dose de comprometimento pela educação e aposta em seu potencial transformador de mundo, pois a educação muda as pessoas e as pessoas transformam o mundo, como nos inspira Freire (2015). Vale lembrar que as crianças de hoje serão os adultos de amanhã, que podem ser capazes de melhorar o mundo, com a educação humanizadora, livre para pensar, agir e ser curiosa, que tiveram desde os primeiros anos nas escolas da infância.

REFERÊNCIAS

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ALTIMIR, David. Como escuchar a la infancia. Barcelona: Octaedro, 2010.

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