27/02/2018

!NO PASSARAN!

* Dênio Mágno da Cunha

 

Me intriga como temos o hábito de evitar dizer a palavra “não”.  Neste carnaval, além da carnavalização de nossa pobreza em matéria de pessoas públicas, a campanha com mais repercussão foi a capitaneado pelas mulheres que, didaticamente, disseram que “não é, não”. Fato a lembrar da existência de outro lado, aquele que houve o não. Nesse caso, o outro lado parece não saber o significado da palavra: Não, significa que !No passaram! Ou “aqui não!”. Na gestão, celebrizada de forma hilária, “não mexam no meu queijo”.

Pois bem, o propósito desta introdução e deste texto é mais uma vez agir didaticamente no sentido de dizer a todos nós que precisamos dizer não. Observe, eu disse “precisamos dizer não”, e não que “precisamos aprender a dizer não”, uma vez que na história brasileira, já dissemos não muitas vezes. Infelizmente, em quase todas, com derrota.

Esse dado é muito importante. Nos momentos (muitos) em que indaguei a mim mesmo sobre a passividade do povo brasileiro, foi nas escaramuças, opressões e derrotas passadas onde encontrei refugio. Só mesmo o medo de apanhar, de ser preso, de correr da polícia, de ser torturado, pode justificar tamanho silêncio.

Mas talvez alguém pergunte: precisamos dizer não a quem e a quê? Vou dar um exemplo simples.

Todos os anos, nesta época, há um aumento generalizado no valor das taxas (IPTU e IPVA são as mais populares); também nos valores que pagamos as Cias. de eletricidade, sem falar no luxo dos luxos, nos ovos de páscoa. E como virou moda, ao contrário, o teto de pagamento do imposto de renda continua o mesmo. Além disso, se você abre os olhos toda manhã, depois de uma noite de sono, você abre os olhos e já paga algum imposto, desses que a gente não enxerga. Falem-me, não era para dizer !No passaram!?

Não sou tributarista, sou uma pessoa comum. Mas sei que pagamos impostos (impostos pelo governo) num número e valor excessivo. E pior ainda, sem o devido retorno. Sim, nós pagamos impostos para pagar nossos funcionários para que eles administrem bem os impostos e nos proporcionem uma vida melhor. E uma vez que eles não estão fazendo isso bem, deveríamos dizer a eles: !Não Continuarão! e demiti-los de seus  cargos públicos. Me parece natural.

Para não dizerem que estou jogando palavras sem propor uma ação, faço uma sugestão: comecemos o nosso não por um lugar que está comprovadamente mal administrado – um hospital público, por exemplo. Adotemos o hospital, mas não dando dinheiro ou ajudando na limpeza, ou fazendo outra atividade pela qual já pagamos. Vamos adotá-lo como ponto de protesto. Todos os dias, vamos nos revezando, e exigindo solução para os problemas de lá. Chamemos a impressa e expliquemos nossa intenção e só saíamos de lá quando houver uma solução. E assim vamos fazendo, de hospital em hospital. Podemos até eleger fiscais da qualidade para aquele hospital, seria uma boa ideia.

Outra solução é escolhermos um funcionário, de incompetência pública reconhecida, e aluga-lo pelas redes sociais, por e-mail, pela imprensa, exigindo que ele trabalhe, cumprindo adequadamente sua função. Por exemplo, um ministro de estado que esteja sendo relapso com suas responsabilidades de proporcionar à população um serviço digno. Ou ainda, porque não juntar as duas ações? Ou você acha que a responsabilidade da falta de condições dos hospitais é responsabilidade do atendente, do médico, do diretor do hospital? Às vezes é, porque o diretor pode ter sido indicado por alguém e está pouco ligando para a qualidade do serviço que presta. Enfim, a primeira ação é identificar claramente o alvo e se possível, um alvo frágil, de fácil vitória. Por quê? Porque assim vamos convencendo aos nossos companheiros medrosos como nós, de que temos força para dizer não, e que vale a pena.

Na minha área, a educação, também vejo esse medo diante do Estado, representado pelo nosso Ministério da Educação. Já presenciei muitos avaliadores e muitas avaliações que parecem mais uma peça/cena de inquisição do que uma ação de proposta de melhoria.  Não querem melhorar, querem mostrar que são inquisidores e que têm o poder de destruir. Para estes, existe felizmente a possibilidade de judicialização, isto é, dizer !No Passaran! através da justiça. Mas muitas instituições preferem deixar que o destino resolva, e acabam amargando o peso do medo  de enfrentar a inquisição e o resultado injusto de um julgamento – principalmente aqueles baseados apenas em documentos. Anos e anos de trabalho, jogados no lixo, pelo medo de dizer !No passaram!

Nossos alunos, também são exemplos. Vejo que preferem “pedir pontuação” (me dá um pontinho, só falta um pontinho), do que solicitarem ao professor, como é de direito, a revisão dos trabalhos; ou de recorrerem aos coordenadores, ao colegiado, quando se sentem injustiçados. Sinceramente, “me dá um pontinho”, é a face cotidiana do famoso “jeitinho brasileiro” (no seu lado negro), tão comum nas esferas do relacionamento entre políticos e empresários. Lá em cima é “me dá uma comissãozinha ai”, aqui é “me dá um pontinho”. Ainda bem que, no caso do pontinho, não é difícil dizer não. No outro caso, a revanche vem a cavalo e rápida. Os políticos não brincam em serviço, o que aumenta ainda mais o medo. Retaliação ao não pagamento de comissão (brincadeira não é) devia receber um !NO PASSARAN! (maiúsculo).

Finalizando essa nossa reflexão, fica mais uma vez o chamado. Fiquemos alerta e atentos, pois oportunidades para dizermos não, não faltam. Faça exercícios diários, diga não, não e não, porque não, é não! Assim eles !No Passaron!

Duvide e confira tudo que te disserem, que você ler, que você ouvir: o olho do dono é que engorda o negócio... e nós estamos vivendo uma reversão em que os empregados é que estão de olho em nós, que pagamos pelo seu serviço. Eles estão engordando o negócio, que passou a ser deles, e nós... minguando. Presta atenção! 1984 é hoje!

Assine

Assine gratuitamente nossa revista e receba por email as novidades semanais.

×
Assine

Está com alguma dúvida? Quer fazer alguma sugestão para nós? Então, fale conosco pelo formulário abaixo.

×