13/12/2016

O DESAFIO DA GESTÃO DE CURSOS DE GRADUAÇÃO

                                                                       Autor: Heleno da Costa Miranda

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem por objetivo apresentar sucintamente a visão do autor em relação ao atual estágio do ensino superior e dos desafios à modernização do modelo de gestão a ser adotado pelos coordenadores de curso de graduação com vistas à melhoria da qualidade e da sustentabilidade dos cursos.

A ESCOLA TRADICIONAL

Para avançarmos rumo à modernização nas relações de ensino e aprendizagem, faz-se necessário uma reflexão acerca da escola tradicional no sentido de identificar as fragilidades que vem interferindo na eficácia de suas ações.

O modelo adotado de transmissão do conhecimento mostrou-se um modelo centralizador e autoritário, no qual todo o “poder” e conhecimento emanava do professor, o qual não podia ser questionado ou confrontado. Essa prática mostrou seus resultados durante décadas, visto que a base da educação familiar obedecia ao mesmo modelo e dessa forma, os alunos não conheciam outra realidade e adaptavam-se plenamente. Outro fator que contribuía para o sucesso dessa prática residia na disparidade cultural entre os professores e uma enorme fração da sociedade ainda não alfabetizada.

Na medida em que essa população eminentemente rural migrou para os centros urbanos buscando novas oportunidades de trabalho e de infraestrutura urbana, instalou-se um irreversível processo de aculturação da sociedade e uma gradativa evolução do nível de escolaridade, e a consequente redução do distanciamento cultural anteriormente vigente.

 A expansão dos meios de comunicação a partir da década de 60 e o seu exponencial crescimento desde então, potencializou o surgimento das mais diversas tecnologias que hoje encontram-se plenamente disponíveis, barateando, dinamizando e popularizando todo o processo de comunicação. Em função dessa revolução tecnológica, as novas gerações estão cada vez mais, sendo bombardeadas desde a tenra idade com níveis de informações inimagináveis para as gerações anteriores. Em decorrência disso, os alunos se tornaram cada vez mais seletivos quanto às informações e conteúdos que querem ou não receber, assim como tornaram-se muito mais exigentes com a qualidade desses conteúdos e principalmente dos meios e mecanismos de disponibilização destes, tornando-se ainda, questionadores por excelência.

Em contrapartida a formação de professores assim como a incorporação de técnicas e tecnologias que potencializem a relação ensino/aprendizagem vem evoluindo de forma muito tímida não acompanhando os anseios dos alunos e consequentemente, desestimulando-os. Em função desse distanciamento, a evolução tecnológica que vivemos cotidianamente, não conseguiu ainda, revolucionar a educação, restringindo-se apenas a alguns setores

 VISÃO HUMANISTA

Considerando a diversidade socioeconômica e cultural que compõem o cenário universitário, torna-se imperativo que sejam oportunizados todos os meios possíveis de inclusão desses alunos a essa “comunidade acadêmica” à qual galgaram chegar.

O ingressante, assim como todos os demais discentes, deve sentir-se plenamente acolhido, facilitando assim a plena ambientação a seu novo círculo de convivência de tal forma que possibilite no menor espaço de tempo possível, que este círculo de convivência venha tornar-se um círculo de amizades.

Devem ser buscados incessantemente a implementação dos diversos mecanismos de acessibilidade. Nesse aspecto, a acessibilidade arquitetônica e de adequação de ambientes, são, na visão do autor, as de mais fácil adequação, uma vez que dependem fundamentalmente de disposição gerencial e de recursos financeiros.

A disponibilização de um Serviço de Apoio Psicopedagógico é de fundamental importância para superação das dificuldades de adaptação no ensino superior, oferecendo condições de favorecimento ao seu bem-estar biopsicossocial, em função do processo de ensino aprendizagem. O apoio profissional deve se dar de forma continuada, estimulando a responsabilidade, a autonomia e a capacidade de iniciativa do estudante.

A inserção deve se dar em todos os níveis institucionais, garantindo condições de integração das pessoas com mobilidade reduzida, assim como as que possuem necessidades físicas, neurológicas ou sensoriais ou quaisquer outras que possam interferir na plena integração e/ou déficit de aprendizagem.

O grande desafio se dá na conquista da acessibilidade atitudinal, sem a qual nenhuma outra se torna plena. Vencer barreiras atitudinais requer ações continuadas de conscientização e de aprimoramento de práticas inclusivas. Não há dúvidas que nesse aspecto ainda há um longo caminho a percorrer, mas na medida em que se estabeleçam processos inclusivos consistentes e duradouros, as barreiras e preconceitos irão se quebrando gradativamente, estabelecendo uma nova sociedade.

Em busca da formação de um cidadão ético, consciente de sua responsabilidade social e despido de preconceitos é que devem ser desenvolvidas as bases de sua formação. Para tanto, não é possível deixar de se considerar os ensinamentos de Paulo Freire, onde fica claro que “não há docência sem discência”, onde é de fundamental importância que o docente assuma também a produção do saber e esteja convencido de que ensinar não é apenas transferir conhecimentos, mas acima de tudo criar as condições para a sua construção. Assim, estabelece-se a verdadeira aprendizagem, onde docentes e discentes vão se transformando em reais sujeitos da construção do saber. Desta forma, através do pleno aprendizado, gradativamente reduz-se a separação entre o mundo acadêmico e o mundo exterior ao mesmo tempo em que uma vez estabelecidas as conexões entre a vida cotidiana e os conteúdos apreendidos, estabelece-se também as bases para uma formação continuada, imprescindível para a evolução do cidadão nos âmbitos pessoal e profissional fomentando o aperfeiçoamento da sociedade na qual está inserido.

QUEBRA DE PARADÍGMAS

O século XXI veio consolidar mudanças em âmbito mundial e principalmente, perpetuar o conceito de que a única certeza que se tem é a de que nada é estático e que a mudança é uma constante.

A era da tecnologia plena, disponibiliza um mundo de informações das mais variadas culturas influenciando-as e agregando novos valores. A difusão do conhecimento através dos diversos meios de intercâmbio, assim como a possibilidade de acesso a bibliotecas virtuais de forma global, tanto no âmbito cultural como em todas as demais áreas de conhecimento, estão modificando em forma e conteúdo, as necessidades relativas ao ensino/aprendizagem em todos os níveis de formação. A tecnologia modificou não só as relações de consumo, mas está alterando continuadamente as relações de trabalho, exigindo cada vez mais profissionais cotidianamente atualizados e com múltiplas competências.Tal situação exige que a formação do indivíduo se dê de forma diferenciada, não se limitando apenas à sua profissionalização.

O desafio das IES é formular a equação de ensino que atenda às DCNs, gere um bom resultado no ENADE, possua um diferencial que torne o curso atrativo do ponto de vista qualitativo, entenda e atenda às expectativas dos alunos, e promova uma formação plena do cidadão, de tal forma que esta contemple “Os quatro pilares da educação”, preconizados pela UNESCO:

  • Aprender a conhecer, combinando uma cultura geral, suficientemente vasta, com a possibilidade de trabalhar em profundidade um pequeno número de matérias. O que também significa: aprender a aprender, para beneficiar-se das oportunidades oferecidas pela educação ao longo de toda a vida.
  • Aprender a fazer, a fim de adquirir, não somente uma qualificação profissional mas, de uma maneira mais ampla, competências que tornem a pessoa apta a enfrentar numerosas situações e a trabalhar em equipe. Mas também aprender a fazer, no âmbito das diversas experiências sociais ou de trabalho que se oferecem aos jovens e adolescentes, quer espontaneamente, fruto do contexto local ou nacional, quer formalmente, graças ao desenvolvimento do ensino alternado com o trabalho.
  • Aprender a viver juntos desenvolvendo a compreensão do outro e a percepção das interdependências — realizar projetos comuns e preparar-se para gerir conflitos — no respeito pelos valores do pluralismo, da compreensão mútua e da paz.
  • Aprender a ser, para melhor desenvolver a sua personalidade e estar à altura de agir com cada vez maior capacidade de autonomia, de discernimento e de responsabilidade pessoal. (DELORS, 1998, pág. 101-102)

Buscar esses objetivos requer elevado nível de autoconhecimento institucional, devendo ser identificado com clareza em que estágio de desenvolvimento a IES se encontra em relação ao objetivo.

Do conhecimento institucional com foco nos objetivos, resulta a identificação de potencialidades e fragilidades, conhecimento dos stakeholders internos e externos. No caso dos internos, identificar como eles se interagem, se como grupos isolados ou como equipe, se compreenderam e estão dispostos a promoverem mudanças em prol dos objetivos. No caso dos externos, é de fundamental importância entender o quanto eles conhecem a IES e qual a sua percepção em relação à formação de seus discentes e qual o seu grau de satisfação em relação à inserção institucional em benefício da sociedade.

Promover ações facilitadoras para o desenvolvimento do autoconhecimento, identificar os concorrentes, internos e externos, estabelecer objetivos, metas e métodos, identificar o seu cliente e conseguir praticar custos compatíveis com a sustentabilidade institucional e com as possibilidades financeiras do mercado alvo, requer profissionalização da gestão e a consequente quebra de paradigmas a fim de viabilizar o salto de performance necessária.

 A PROFISSIONALIZAÇÃO DA GESTÃO

No âmbito do Curso, a profissionalização da gestão apresenta-se como requisito para o atendimento à qualidade e à sustentabilidade. Para tanto, faz-se necessário a obtenção de respostas a algumas questões:

Como pensar o futuro do curso?; Onde estamos? ; Onde queremos chegar? ; Em que prazo? ; Quem é o nosso cliente? ; O que ele valoriza? ; O que ele rejeita? ; O que sente falta? ; O que ofertamos é o que ele almeja receber?

A formulação desse questionamento bem como a obtenção das respostas e o tratamento das questões, requer da equipe gestora um elevado grau de motivação e sinergia, com competências específicas e múltiplas habilidades, boa comunicação e determinação. Será necessário o engajamento de setores como CPA, Secretaria Geral de Ensino – SEGEN, Marketing e da Alta Direção que necessitam compreender e compartilhar dos objetivos.

Concluída a fase de diagnóstico e através de uma gestão com foco na integração, a equipe gestora do curso – NDE deve propor um projeto para atender as demandas elencadas considerando diversas metas de desenvolvimento necessárias ao alcance do objetivo. O plano de ação devidamente divulgado e entendido pelos stakeholders deverá conter métricas definidas para o acompanhamento das metas propostas (pontos de controle), onde estas serão avaliadas, comemoradas e/ou redefinidas visando o cumprimento do cronograma.

Devido à complexidade e diversidade de cursos e de IES, e de acordo com os objetivos estabelecidos, poderão ser necessários diversos planos a fim de tornar viável o projeto. Independentemente do grau de maturidade em que se encontrem, para uma eficaz gestão e prolongamento do seu ciclo de vida, cada curso deve ser entendido pela IES como uma Unidade de Negócio gerida pelo “Coordenador de Curso” que deverá assumir o papel de Gerente do Projeto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os desafios da gestão de cursos de graduação transcendem à atuação de um trabalho de coordenação. Como exposto, a atuação esperada de um Coordenador de Curso de Graduação equivale em todos os aspectos à de um Gerente de Projetos, com o diferencial de que o seu sucesso será medido em grande parte pela agregação de qualidade de desenvolvimento humano facilitado pela IES durante a capacitação profissional buscada pelo discente, além é claro, dos mecanismos de regulação do Estado.

 

BIBLIOGRAFIA:

BEER, Mike. Gerenciando mudança e transição; tradução de Cristina de Assis Serra. Rio de Janeiro: Record, 2003.

CURY, Carlos Roberto Jamil. Evolução da Educação superior no Brasil: a participação do setor público e da iniciativa privada. UFMG.

DELORS, Jaques; eat al. Educação um tesouro a descobrir: relatório para a UNESCO da comissão internacional sobre educação para o século XXI, pág. 101-102. 1998.

MURIEL, Wille. Fundamentos e Orientações Gerais para o: o trabalho de coordenação de cursos. Carta Consulta.

____________. Marketing para instituições de ensino realmente superiores. Carta Consulta.

____________. Composto mercadológico. Carta Consulta.

____________. NDE e Equipes de Alto Desempenho.  Carta Consulta.

PINTO, Luiz Fernando da Silva. MBA em executivo em gerenciamento de projetos: estratégia empresarial; Fundação Getúlio Vargas. Petrópolis, RJ.

VARGAS, Ricardo Viana. MBA em executivo em gerenciamento de projetos: gerenciamento das comunicações; Fundação Getúlio Vargas. Petrópolis, RJ.

ROLIM, Marcelo Henrique Knust. MBA em executivo em gerenciamento de projetos: negociação e administração de conflitos; Fundação Getúlio Vargas. Petrópolis, RJ.

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