01/07/2015

O dinheiro da educação está na curva do rio

Ainda que por um dia, Senhor, estará presente em nossa sociedade a crença de que o que eu poderia ensinar ainda terá algum valor.

Mesmo que o mundo seja hostil e descompromissado com o saber, a longo prazo, não haverá mesmo jeito: o Brasil é algo inevitável e maior ainda que todas as ganâncias.

Presentes em nossas telas, já que o papo e o café dos fins de tarde acabaram, vejo inúmeros intelectuais discorrendo sobre como será o Brasil se perder o grau de investimento. Fico mesmo é pensando como o dinheiro pode perder o Brasil. Na vida tudo é uma questão de referência espacial, a não ser a fé.

Por mais de quinhentos anos fomos esfolados vivos, os que aqui estavam, os renegados, os marginais e os pobres europeus ou os homens livres acorrentados nos porões dos navios negreiros. Quem pode mais sangrar a terra e nos tornar, enfim, um bando de antas tentando cruzar o lamaçal.

Embora possamos discorrer sobre tais antas e para dizer pouco, resta-nos a certeza de que estamos aqui sentados em montanhas de hematita, mas algumas coisas nos desencantam.

Há muito tempo - muito tempo mesmo -  vejo as pessoas dizendo que “essa coisa de conteúdo é bobagem o importante é ensinar as pessoas a pensar”. Então fico me perguntando se o Senhor nos criou sem essa capacidade de pensar, porque se isso for verdade é uma grande falha. Pensar é pré-requisito para digerir conteúdo e é obra da genética, já nasce do ovo, mesmo que essa seja transmitida pelo homem.

Como disse Ariano Suassuna “que me perdoem; é mais fácil acreditar na história de Adão e Eva do que na de que a inteligência do homem evoluiu do macaco: macaco nasce macaco e homem nasce homem, a distância é grande demais”.

E aí o povo fica abobalhado nas redes sociais, como se isso fosse relacionamento e comunicação e é tudo o que não é: um palco para exposição de vaidades e projeções pessoais. Se continuar bobeando até a foto é falsa. As pessoas se reúnem, em última análise, não para se relacionar, mas por suas causas. De repente aparece aquele primo que Você não vê há anos dizendo que te ama, mas nunca veio te ver, aliás veio sim “por ocasião do enterro de seu pai”.

O mundo mudou! É, e nesse caso então eu não faço parte desse mundo? Não existe um novo ser humano, todas as coisas evoluíram juntas. Enquanto ocorriam as mudanças a Terra continuava rodando, o que acontece é que talvez alguns não tenham sido avisados. Na média, a informação agora é muito maior, rápida e mais compartilhada do que no passado. E compartilhar traz para esse cenário outras fontes de conhecimento disponíveis em todos os lugares e nos mais variados momentos.

Pipocam por todo lado celulares e outros mecanismos de compartilhar: nas mesas dos bares, no jantar em família, nas festas e também nas salas de aula. Hoje é mais fácil falar com alguém pelo celular do que pessoalmente. O que fazer? A verdade é que essa relação pessoal é de baixa relevância, é só isso. Quando o que tiver para transmitir nesse tempo imediatista gerar nas pessoas a percepção de valor aplicável, talvez possamos aprender mais sobre a inclusão de todas essas mídias na formação do conhecimento.

Vivemos é uma falta de causa. Nascemos em um País jovem e ainda não somos capazes de lutar por aquilo que é senso comum, porque na verdade isso ainda não existe. Nossa diversidade étnica é tão grande que gramaticalmente fazemos parte dos chamados sujeitos indeterminados ou no mínimo ocultos.

Nós não somos. Nós estamos e isso dá ainda mais margem para se dividir o País. Um povo dividido perde todo o seu poder e agora estamos: menores de idade, mulheres, portadores de necessidades especiais, índios, afrodescendentes, quilombolas, comunidades tradicionais, gays, lésbicas e transexuais, idosos, dentre outros grupos. Todos com os seus direitos especiais. Estes recriados para serem descumpridos, passam a impressão da “cura” de todas as mazelas específicas. Parece que a sociedade quer proteger direitos, mas não é verdade. Esses direitos estão por lei ou deveriam estar por prática a disposição de todos. Esta divisão é fruto de um projeto político, uma estratégia de Estado: um povo dividido perde todo o seu poder.

E então, do alto de seu cavalo branco, como em uma história Suassunística, portanto fantástica, Joaquim Levy gritou: independência ou corte! Aí o dinheiro para as federais, para o FIES, para os programas do FNDE, enfim para a educação, desceu morro abaixo e ficará encalhado na curva do rio, onde os garimpeiros sonham encontrar uma mulher toda de branco com as mãos cobertas de diamantes.

É melhor procurar por nossa independência porque sempre me pergunto: como seremos um País com esse descaso? Como ser relevante apenas com um giz na mão? Será que a nossa única esperança é sonhar com a mulher de branco na curva do rio? Somos professores e não atores do Cirque du Soleil. Nós não sabemos dar mortal de costas ou andar na corda bamba, aliás minto: nessa última andamos sempre.

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