14/06/2016

O direito. O dever. A indiferença.

Dênio Mágno da Cunha*

Alcanço a décima impressão. Na primeira impressão falei sobre o dever do professor em deixar sua positiva) na vida do marca (de forma aluno. Nesta falarei de como é também dever do aluno deixar sua impressão na vida do professor.

Estranho não? Usar a palavra dever como algo que diz respeito ao cotidiano dos alunos de hoje. Sim, porque nos alunos de antigamente, dever era uma palavra que estava presente o tempo todo, até metia medo: o “dever de casa”; “o cumprimento com os deveres de aluno”; “o dever social”.

Percebo uma grande diferença, pois me parece que a palavra dever foi banida do dicionário estudantil. O aluno não deve nada. Se alguém souber de alguma coisa que um aluno deve fazer em uma sala de aula... de algum comportamento que seja definido como dever, me avise. O aluno deve, mas não faz, não se comporta como deve. O verbo mudou de tempo a sua conjugação, suavizou-se no tempo. Hoje o aluno “deveria”. Deveria que é bem diferente de deve. Não há mais o dever.

Alguns exemplos de frases com a conjugação antiga e a atual: “O aluno deve prestar atenção à aula” – deveria. “O aluno deve estudar além daquilo que o professor dá em sala de aula” – deveria. “O aluno deve respeitar os direitos de seus colegas” – deveria. “O aluno deve participar das aulas” – deveria. E finalmente, “o aluno deve pensar criticamente” – deveria.

Olhe que estou falando de posturas ou comportamentos que auxiliam minimamente o trabalho do professor e o aprendizado do próprio aluno. Estou falando de conselhos, que se o aluno seguisse... Não estou falando do dever, relacionado a obrigações como por exemplo, “o dever de cumprir prazos”; “o dever de não matar aulas”; “o dever de não comer em sala de aula”; “ o dever de respeitar os direitos dos demais”. Isto deve ser a obrigação, o dever mínimo... deveria.

Bem, isso significa que a sala de aula é então um território sem lei? Não, de modo algum. É um território em que, quem quer aprender deve lutar pelo seu espaço com aqueles para quem, estar em sala de aula ou não, estudar ou não, não faz a mínima diferença. Os indiferentes.

Nesse meio, a grande discussão sobre os Direitos individuais e o Direito Coletivo. Esse último inexistente porque dificilmente uma turma de alunos consegue se enxergar como algo coletivo. A individualidade campeia e é a tônica. O EU predomina livre e saltitante pela campina da terra em que a palavra DEVER perdeu todo e qualquer sentido que poderia ter.

Presenciei em duas semanas a discussões justamente porque não se considera que dentro de uma sala de aula deveria predominar o DIREITO, o DEVER e a DIFERENÇA. Sim, a sala de aula é o espaço privilegiado para cuidarmos da vida coletiva e harmônica nas diferenças. E é onde a sociedade é refletida na sua falta de respeito às diferenças, infelizmente.

O primeiro direito sacrificado dentro de uma sala de aula é o Direito ao Estudo. Não falo daqueles que abdicam deste direito em prol da imersão nas redes sociais: esse é um direito sagrado da livre escolha. Falo daqueles que entabulam conversas como se estivessem na mesa de um bar, rodeados de pessoas falando sobre outros assuntos, o que os obriga a falarem cada vez mais alto. Como estudar, prestar atenção, concentrar-se nos estudos, na leitura, com alguém conversando sobre “sabe-se lá o que”, do seu lado. Impossível. Isso gera reações: do professor que tem de ficar perdendo tempo de aula pedindo silêncio; de outros alunos que desejam prestar a atenção e não conseguem.

O segundo direito sacrificado dentro de uma sala de aula é o “Direito de Ser Como Eu Sou” confundido com “Eu tenho o direito de fazer o que eu quero”, sempre exaltado na expressão popular: “Tô paganu”. Somos diferentes; temos níveis culturais diferentes; aprendemos de formas diferentes; portanto, temos o direito de perguntar; de não saber; de aprender de forma diferente; de ser diferente. Há aqueles que se acham no direito de ser diferente, mas não permitem aos outros este mesmo direito. Então ridicularizam, fazem chacota, são indiferentes, ignoram as diferenças, não aceitam, não compreendem e por aí vai.

Pode parecer, e não é por acaso que assim parece, que tenho uma visão míope do ambiente da sala de aula. Mas me defendo, afirmando que são raras as exceções. As nossas salas de aula não são um ambiente colaborativo, social, moderno, avançado, produtivo; onde a sociabilidade, o respeito e o dever social existem naturalmente. São locais, assim como na nossa sociedade, em que estamos lutando para construir algo que já deveria existir como fundamento: o respeito aos direitos humanos básicos, aos direitos da vida em sociedade.

Há momentos em que duvido que saibamos o que é viver coletivamente – na sala de aula e na sociedade. Observem e verão o tamanho do trabalho que temos pela frente.

* Professor: MBA Carta Consulta. Una/Unatec. Doutorando Universidade de Sorocaba.

 

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