22/10/2013

O Discurso da Maconha: uma Autêntica Economia de Trocas Linguísticas

MARINHO CELESTINO DE SOUZA FILHO[1]

                            

O Conhecimento deve ser utilizado, sobretudo, para libertar

E não para oprimir

Porque, se o Conhecimento for utilizado só para oprimir

Ele, o Conhecimento, não teria razão de existir.

(Marinho Celestino de Souza Filho)

 

RESUMO: Nesse breve ensaio, pretendo mostrar como o discurso da “maconha” funciona e ainda como esse discurso gera, segundo o modelo filosófico de Bourdieu, uma verdadeira economia de trocas linguísticas. Para a realização desse trabalho utilizaremos dos seguintes procedimentos metodológicos: modelo filosófico de Bordieu: teoria da economia de trocas linguísticas, pesquisa de campo: questionário semidirigido aplicado a 50 colaboradores: usuários da maconha, História Oral, Análise do Discurso:  centrada na linha europeia e, por fim; modelo filosófico de linguagem proposto por Mikhail Bakhtin: teoria do dialogismo, a saber; a teoria da interação verbal.

PALAVRAS-CHAVES: Discurso. Maconha. Economia de Trocas Linguísticas. Teoria da Interação Verbal.

ABSTRACT: In this brief essay, I intend to show how the discourse of "marijuana" still works and how this discourse generates, according to Bourdieu's philosophical model: a real economy linguistic exchange. To conduct this work we use the following methodology: philosophical model of Bourdieu: economic theory of linguistic exchanges, field research: semi-structured questionnaire applied to 50 employees: marijuana users, Oral History, Discourse Analysis: European and centered on the line finally, philosophical model language proposed by Mikhail Bakhtin: dialogism theory, namely, the theory of verbal interaction.

KEYWORDS: Discourse. Marijuana. Economics of Linguistic Exchanges. Theory of Verbal Interaction.

 

1 INTRODUÇÃO

            Pretendo, nesse breve ensaio, mostrar como o poder do simbólico se comporta, alicerça-se, engendra-se no que tange à linguagem relativa ao uso da maconha.

            Pretendo, ainda, elencar as redes de relações que são tecidas por meio da “linguagem da maconha”, constituindo-se, assim, não um, mas vários discursos que engendram não uma, mas, várias linguagens, ou seja, mostrar as relações metafóricas e pragmáticas engendradas por esse discurso e os não-ditos depreendidos a partir dessas relações.

            Após os breves comentários feitos na introdução, abaixo, trataremos da dimensão do problema elencado acima.

2 DIMENSÃO DO PROBLEMA

            Sabe-se que a maconha, conhecida cientificamente como “Cannabis Sativa”, age no cérebro humano, ou começa a agir, a partir de um intervalo não inferior a três minutos aproximadamente, enquanto a cocaína age provavelmente em um intervalo de sessenta segundos, já o crack em mais ou menos trinta segundos.

            Dessa forma, percebe-se que dessas três drogas a maconha é a que “demora” mais a agir e ainda por ser uma das drogas mais baratas e, principalmente, de fácil acesso, por isso, a maconha é uma das drogas mais consumidas no Brasil.

            Esse fato foi constatado por um seminário internacional sobre drogas realizado em junho de 2004 em Brasília.

            Além disso, o usuário dessa droga, (bastar ler jornais, revistas, ou mesmo assistir televisão para constatar o que diremos a posteriori), muitas vezes, está disposto a fazer (quase) tudo para conseguir a droga: roubar, sequestrar, assaltar, enfim, até matar.

            Em vista disso, muitas pessoas que não usam a droga sofrem, principalmente, quando em suas casas há um viciado desse entorpecente, porque, o viciado, na maioria das vezes, não é bem visto pela sociedade e muitas vezes pela sua própria família que também pode ficar mal vista.

            Como se não bastasse isso, o uso da maconha pode causar sérios aborrecimentos, prejuízos, traumas, feridas tanto no usuário, quanto nas pessoas que o cercam, ou melhor, que se relacionam direta ou indiretamente com ele.

            Além disso, o mesmo seminário anteriormente citado ainda constatou que o sujeito começa pela droga mais fraca: a maconha, depois vai para as mais pesadas: cocaína e crack, por isso, o problema das drogas tem assolado com as famílias brasileiras e, pode ser considerado uma epidemia que as autoridades, especialmente, no que tange ao crack estão tomando trágicas atitudes: tirando os viciados das ruas, mesmo contra a vontade deles e internando-os em clínicas para tratamento médico.

            Esse fato infelizmente não resolve o problema, é paliativo, pois, muitos viciados (também constado pelo seminário citado anteriormente), depois de tratados, retornam às ruas e, novamente utilizam a droga.

            Assim, após os argumentos arrolados no item 2, mostraremos abaixo as linhas teóricas desse trabalho.

3 LINHAS TEÓRICAS DESSE TRABALHO

            Nesse trabalho, pretendemos abordar o discurso da maconha de acordo com o modelo filosófico de Bourdieu (1988), e, ainda sob as seguintes perspectivas metodológicas: linha europeia de análise de discurso, Bakhtin (1997), dialogismo: interação verbal e finalmente: História Oral.

                        Depois de mostrar as linhas teóricas desse trabalho, trataremos a seguir sobre as acepções do termo discurso e de cada linha teórica citada anteriormente.

4 CONCEPÇÕES DO TERMO DISCURSO

            Para execução de tão complexa tarefa, precisaremos, antes, conceituar o termo, a palavra discurso. E o que seria discurso?

            Esse termo pode assumir várias acepções, dependendo do contexto em que está inserido, já que existem de acordo com Orlandi (1983) vários tipos de discursos: religioso, pedagógico, científico, político etc.

            Apesar da complexidade que envolve a palavra discurso, tentaremos conceituar de forma adequada esse termo.

            Por isso, o critério que adotamos foi o seguinte: primeiramente, procuraremos o sentido dessa palavra em sua origem, ou seja, sua etimologia, dessa maneira, de acordo com Houaiss (2001, p. 1054) discurso seria “[...] 3. Série de enunciados que expressam a maneira de pensar e de agir e/ou as circunstâncias identificadas com um certo assunto, meio ou grupo <d. psicanalítico> <d. alternativo>[...]”.

            Logo, de acordo com o autor acima assinalado, o discurso seria um conjunto de enunciados linguísticos utilizado pelas pessoas, mostrando, assim, como elas agem e pensam.

            Dessa forma, o conceito de discurso anteriormente mencionado torna-se relevante para esse trabalho, uma vez que pretendo, justamente, analisar o discurso de 50 jovens de Vilhena, cidade localizada no Cone Sul do estado de Rondônia.

            Além da definição anteriormente elencada, interessam-me muito ainda os conceitos dados por Bakhtin (1997) e pela escola europeia de análise do discurso, doravante identificada por mim pela sigla A.D.

            Para a A.D., em conformidade com Brandão (1988, p. 11), o discurso seria a própria linguagem, ou melhor, estaria intrinsecamente ligado, relacionado, enviesado, enfim, atravessado pela linguagem, porque:

 A linguagem enquanto discurso não constitui um universo de signos que serve apenas como instrumento de comunicação ou suporte do pensamento: a linguagem enquanto discurso é interação, e um modelo de produção social; ela não é neutra, inocente (na medida em que está engajada numa intencionalidade) e nem natural, por isso o lugar privilegiado de manifestação da ideologia. Ela é o “sistema-suporte das representações ideológicas (...) é o ‘medium’ social em que articulam e defrontam agentes coletivos e se consubstanciam relações interindividuais” (Braga, 1980). Como elemento de mediação necessária entre o homem e a sua realidade e como forma de engajá-lo na própria realidade, a linguagem é lugar de conflito, de confronto ideológico, não podendo ser estudada fora da sociedade, uma vez que os processos que a constituem são histórico-sociais. Seu estudo não pode ser desvinculado de suas condições de produção. Esse será o enfoque a ser assumido por uma nova tendência linguística que irrompe na década de sessenta:  a análise do discurso.      

 

Nessa citação, Brandão (1988) nos mostra que estudar o discurso, seria estudar a própria linguagem, esta inserida num contexto sócio-histórico-ideológico.[2] Isto é, a linguagem estaria imanentemente ligada à História do sujeito, locutor/interlocutor, inseridos numa dada comunidade linguística; dentro de certo grupo social; afetado, influenciado e atravessado pela ideologia, ou melhor, o discurso não seria de acordo com Brandão (1988) algo inocente, sem intenção e tensões previamente estabelecidas,

Assim, falar seria uma verdadeira luta, cujo cenário seria uma autêntica arena de gladiadores lutando entre si para garantirem (nesse mundo cada vez mais competitivo, globalizado, capitalista em que uma das teorias de Darwin, a Seleção Natural, é levada ao extremo) a sobrevivência.

Já para Bakhtin (1997, p. 112-113), ao discurso se associa a enunciação, a saber; o discurso está para a enunciação, assim como a enunciação está para o discurso, senão observemos:

Com efeito, a enunciação é o produto da interação de dois indivíduos socialmente organizados e, mesmo que não haja um interlocutor real, este pode ser substituído pelo representante do grupo social ao qual pertence o locutor. A palavra dirige-se a um interlocutor: ela é função da pessoa desse interlocutor: variará se se tratar de uma pessoa do mesmo grupo social ou não, se esta for inferior ou superior na hierarquia social, se estiver ligada ao locutor por laços sociais mais ou menos estreitos (pais, mãe, marido, etc.) não pode haver interlocutor abstrato; não teríamos linguagem com tal interlocutor, nem no sentido próprio nem no figurado. Se algumas vezes temos a pretensão de pensar e de exprimirmos urbi et orbi, na realidade é claro que vemos “a cidade e o mundo” através do prisma do meio social que nos engloba.

Na maior parte dos casos, é preciso supor além disso um certo horizonte social definido e estabelecido que determina a criação ideológica do grupo social e da época a que pertencemos, um horizonte contemporâneo da nossa literatura, da nossa ciência, da nossa moral, do nosso direito.

O mundo interior e a reflexão de cada indivíduo têm um auditório social próprio bem estabelecido, constroem suas deduções interiores, suas motivações, apreciações, etc. Quanto mais aculturado for o indivíduo, mais o auditório em questão se aproximará do auditório médio da criação ideológica, mas em todo caso o interlocutor ideal não pode ultrapassar as fronteiras de uma classe e de uma época bem definidas.

Essa orientação em função do interlocutor tem uma importância muito grande. Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro.

Através da palavra, defino-me em relação ao outro, isto é, em última análise, em relação à coletividade. A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros. Se ela se apoia sobre mim numa extremidade, na outra apoia-se sobre o meu interlocutor. A palavra é o território comum do locutor e do interlocutor.

 

                                Dessa citação, percebemos que a teoria proposta por Bakhtin (1997) sobre a enunciação é confirmada, retomada pela A. D., é claro que Bakhtin (1997) já teorizava, filosofava sobre as questões discursivas bem antes da A.D. existir e ainda muito anterior ao texto de Brandão (1988) que ratifica o que Bakhtin (1997) assevera sobre a palavra, o discurso e a linguagem.

                        Nesse sentido, para Bakhtin (1997), o discurso estaria, intimamente, ligado à palavra e a palavra à enunciação, a saber, a enunciação além de ser um conjunto de palavras, é fruto de uma interação verbal entre locutor/interlocutor e estes inseridos no que Bakhtin (1997) chama de horizonte social, o qual na verdade seria o contexto-sócio-ideológico de que trata a A.D., conforme mostramos anteriormente.

                        Assim, devido a relevância não só desse horizonte social, mas também da Teoria da Interação Verbal proposta por Bakhtin (1997), que também servirá de base para analisar o discurso de 50 jovens de Vilhena – RO, que utilizam a maconha, acreditamos ser de suma relevância haver um item dedicado especialmente a essa teoria.

5 TEORIA DA INTERAÇÃO VERBAL PROPOSTA POR BAKHTIN                              É com Bakhtin (1997, p. 112-113), que veremos como se dá a Teoria da Interação Verbal e quais elementos estão contidos no bojo desta teoria, portanto, observemos:

Qualquer que seja o aspecto da expressão-enunciação considerado, ele será determinado pelas condições reais em questão, isto é, antes de tudo pela situação social mais imediata. Com efeito, a enunciação é o produto da interação de dois indivíduos socialmente organizados e, mesmo que não haja um interlocutor real, este pode ser substituído pelo representante médio do grupo social ao qual pertence o locutor. A palavra dirige-se a um interlocutor: variará se se tratar de uma pessoa do mesmo grupo social ou não, se esta for inferior ou superior na hierarquia social, se estiver ligada ao locutor por laços sociais mais ou menos estreitos (pai, mãe, marido, etc.).

[...] Essa orientação da palavra em função do interlocutor tem uma importância muito grande. Na realidade toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro, isto é, em última análise, em relação à coletividade.

 

                        Sendo assim, Bakhtin (1997) nos mostra que os elementos participantes da Teoria da Interação Verbal são: a enunciação, a situação social, os participantes imediatos, o signo ideológico manifestado através da palavra (esta orientada em função do locutor) e o diálogo.

                        Assim sendo, trataremos abaixo de cada elemento que forma a Teoria da Interação Verbal.

                        O primeiro desses elementos é  a enunciação, que seria o ato ou efeito de enunciar, ou melhor, apropriação da língua por dois interlocutores, estes inseridos em um determinado contexto social, ou seja, não há enunciação sem dois interlocutores e ainda sem que estes estejam inseridos num meio social do qual são participantes, então, a enunciação depende, a priori, de dois fatores: dois interlocutores e do meio social, sem os quais não haveria enunciação, porque, como nos mostra Benveniste (1989): o sujeito deixa pegadas, rastros, marcas de si mesmo nos enunciados por ele produzidos.

     Já o segundo elemento, a situação social, segundo Bakhtin (1997) seria a característica de que todo enunciado para ser plenamente realizável estaria imanentemente relacionado com a realidade social.

     E ainda, conforme Bakhtin (1997) os participantes imediatos pressupõem os interlocutores envolvidos no processo da Interação Verbal. E a palavra, ideologicamente, marcada é orientada em função do locutor.

     Por conseguinte, ainda em conformidade com Bakhtin (1997), toda palavra comporta em seu bojo duas faces, a saber, toda palavra por si só apresenta uma dicotomia: ela se determina pelo fato de proceder de alguém e de se dirigir a alguém.

                       Já o diálogo constitui uma das formas mais importantes da Interação Verbal.

                       Aliás, sem ele não haveria Interação Verbal. Portanto, é a Interação Verbal que, realmente, fundamenta a linguagem.

     Dessa forma, é bom enfatizar ainda que a linguagem só se realiza, plenamente, através de sua expressão verbal, visto que a expressão verbal determina a consciência e a atividade mental, e não o oposto.

     Sendo assim, a atividade mental estaria, intrinsecamente, relacionada com a tomada de consciência, ou melhor, a tomada de consciência seria a ação de duas atividades distintas; a atividade mental do eu e a do nós, as quais serão retomadas a posteriori, uma vez que, neste momento, interessa-nos mais descrever como se daria a interação pela expressão verbal.

Por isso, em sua filosofia sobre a expressão, Bakhtin (1997, p.12) nos mostra que:

A teoria da expressão que serve de fundamento à primeira orientação do pensamento filosófico-linguístico é radicalmente falsa. O conteúdo a exprimir e sua objetivação externa são criados, como vimos, a partir de um único e mesmo material, pois não existe atividade mental sem expressão semiótica.

 

                        Desse modo, a primeira orientação do pensamento filosófico-linguístico surge com Saussure (1916), um dos mais importantes estudiosos da linguagem, que confere à Linguística o status de Ciência da Linguagem humana. Sua doutrina influenciou sobremaneira todo o pensamento científico no século XIX. A influência foi marcante, tanto no campo das Ciências Humanas, quanto no das Ciências Naturais.

                        No entanto, talvez um dos maiores equívocos de Saussure (1916) tenha sido o de desvincular a língua do mundo. Apesar de priorizar a fala, manifestação individual da língua, Saussure dá mais relevância, ênfase ao sistema, isto é, à língua em si, tomada como um sistema abstrato herdado pelos falantes, porque a língua, mesmo sendo um fator social, não poderia ser mudada, criada; no máximo, a língua seria apreendida vagarosamente pelas crianças, pelas pessoas que se dedicassem, exaustivamente, ao aprendizado de línguas.

                        Apesar da importância da teoria de Saussure (1916) para a compreensão da linguagem humana, Bakhtin (1997) discorda radicalmente dele, denominando a teoria saussuriana de Objetivismo Abstrato, já que Saussure (1916) (estruturalista convicto) defendia uma visão de linguagem como elemento abstrato e objetivo, herdado pelas gerações, sem qualquer possibilidade de influência do sujeito sobre esse sistema.

Por isso, esse sistema teria um caráter monológico, no que tange à enunciação, e adia a ideia de que a expressão seria determinada, estruturada pela atividade mental o que para Saussure (1916) não fazia sentido algum.

Mas, Bakhtin (1997), ao contrário de Saussure (1916), mostra-nos o oposto: é a expressão que regula, estrutura a consciência, visto que não há atividade mental sem expressão semiótica, significativa, previamente, estabelecida. A expressão semântica-semiótica é que influencia a consciência e esta a atividade mental.

A atividade mental está, portanto, diretamente, relacionada com a sua orientação social que engendra os possíveis tipos de enunciação: súplica, pedido, ordem, solicitação, desejo etc.

Além disso, a partir da relação estabelecida entre a atividade mental com um ouvinte real ou em potencial (suposto ou pressuposto) é que se distinguem dois polos para a tomada de consciência e a elaboração ideológica intimamente inter-relacionadas com os dois polos acima mencionados, que são os seguintes: a atividade mental do eu e atividade mental do nós.

Para o autor de Marxismo e Filosofia da Linguagem (1997), a atividade mental do eu é reducionista, dado que a enunciação, neste caso, não sofre influência do caráter social sobre o qual a expressão está inserida; seria comparado a um grito qualquer de qualquer animal, que descontextualizado socialmente, não teria valor de expressão, por isso, considerado puramente fisiológico.

Não obstante, a atividade mental do nós, pode ser considerada a autêntica expressão, posto que é influenciada pela situação social da qual participa, sem esquecer que é a expressão que influencia, estrutura a consciência e toda atividade mental, principalmente, a realizada por nós.

No que concerne à segunda orientação filosófico-linguística, Bakhtin (1997) trata da teoria da linguagem proposta por Wilhelm Von Humboldt apud Ramanzini (1990), enfatizava que a linguagem deveria ser concebida como uma dinâmica e constante criação humana, por isso, talvez um dos maiores preceitos formulados por Humboldt [e depois mais tarde retomado por Chomsky (1999) ], teria sido o seguinte: o falante faz uso infinito da língua, utilizando um conjunto finito de regras, ou melhor, o falante com um conjunto de regras finitas, produz um conjunto infinito de enunciados.

Assim, de acordo com Kramer (1994), os teóricos do subjetivismo idealista afirmavam ainda que não existe linguagem sem pensamento, isto é, não há linguagem sem a participação efetiva do sujeito, tinham como expoente, segundo a autora acima assinalada (apesar das diferenças) Wundt, Vossler, Spitzer, Lorek e Lerck, por isso, Bakhtin (1997) classifica o tipo de linguística praticado por estes linguistas de subjetivismo idealista.

Desse modo, mostraremos como este movimento é visto pela Psicologia e depois como é abordado na linguagem.

Sendo assim, Freitas (1996, p. 61-62) nos revela que: “A Psicologia Subjetivista, partindo da concepção de homem como ser autônomo e livre, não determinado pelo ambiente social, vê como função do processo educativo a facilitação de situações favoráveis ao desenvolvimento pleno do educando, baseado em suas tendências e predisposições naturais”.

Apesar de Freitas (1996) desvelar a relação do subjetivismo abstrato com a educação na Psicologia, importa mais para este trabalho apenas o que diz sobre a teoria acima mencionada, ou melhor; o subjetivismo idealista considera tão somente a relação do sujeito com a linguagem, a saber, o mais importante nesta relação é que o sujeito age e reage através da linguagem, há uma ilusão do sujeito, que nesse caso, seria totalmente livre para pensar e agir.

Porém, Japiassu (1982, p. 182-183), revela-nos, justamente, o oposto:

 

Marx viu nesta doutrina do sujeito pensante, simbolizada no Cogito de Descartes, mas que também foi retomada pela filosofia de Hegel, a manifestação da ideologia burguesa clássica. Ao criticar a filosofia idealista clássica inaugurada pelo Cogito, Marx quer conduzir o espírito a uma atitude   de convicção relativa à realidade do sensível, mas depois da experiência de uma despossessão ilusória da convicção elementar. Ele não é nem pré-cartesiano nem pré-idealista, mas pós-hegeliano e, consequentemente, pós-idealista. Sua convicção realista não é mais ingênua. Para ele, é o idealismo que constitui uma aberração e uma ingenuidade. Daí passar a criticá-lo. E o resultado da crítica do ‘eu pensante’ filosofia idealista, apresenta-se de dois modos: como resultado dogmático e como resultado crítico:

a) Em primeiro lugar, o ‘eu’ do Cogito não pode ser reduzido ao simples ‘eu’ abstrato de um ato puro de pensamento, ao qual corresponderiam às realidades exteriores. Sem dúvida, ele é o eu pensante, consciente de si, embora solidário a um corpo individual e a um universo natural e social. A determinação da consciência não é apenas a atualização da vida mental. Tampouco se reduz à atualização do “pensamento”, como afirma Descartes, cortado do enraizamento efetivo no universo e no corpo vivo do ser consciente. Pelo contrário, a “determinabilidade” da consciência é a totalidade dessa atualidade condicionada, de fato, e determinada pela vida, e numa conexão com o universo natural-histórico de que podemos separar-nos sem tornar-nos filósofos abstratos. Não há autarquia do sujeito pensante, a não ser que a filosofia faça comédia. Eis o resultado dogmático da operação crítica do sujeito pensante;

b. Ao mesmo tempo, porém este sujeito pensante também é um sujeito vulnerável a essa ilusão de autarquia, ilusão que se produz naturalmente em virtude de suas pertenças afetivas e de sua educação prévia. Essa ilusão é tanto maior quanto mais se torna inconsciente e se incorpora à consciência de si do filósofo. O resultado consiste em convencer o “eu pensante” de ilusão, mais ou menos imbuído de autarquia idealista, e em demonstrar publicamente o mecanismo de sua ilusão. Eis o resultado crítico da mesma operação.

De acordo com esta citação, percebemos que o sujeito está condicionado ao universo natural, histórico e social do qual participa e Kramer (1994, p. 72) reafirma o que fora dito por Japiassu (1982) anteriormente:

Para o subjetivismo idealista, o fenômeno linguístico é ato significativo da criação individual: a língua é atividade ininterrupta, as leis da lingüística são as leis da psicologia individual e a criação lingüística é análoga à artística. A lingüística seria, assim, no entender de Humboldt, Wundt, Vossler, Croce (em que pesem as diferenças entre eles) uma ciência da expressão. Dicotomizadas vida interior – vida exterior, a primazia é do interior do polo subjetivo.

 

                  Por conseguinte, das duas correntes, anteriormente mencionadas, podemos inferir que o objetivismo abstrato nega, totalmente, o sujeito, isto é, nega a participação do sujeito na linguagem, porém, o subjetivismo idealista afirma a participação desse mesmo sujeito na linguagem, dando-lhe lugar de destaque, deiviticando-o, ou seja, a linguagem se dá, exclusivamente, pelo e no sujeito, já que para esta tendência a linguagem seria considerada uma superestrutura, completamente diferente da visão bakhtiniana, porque, para Bakhtin (1997) o discurso estaria ligado à palavra e a palavra à enunciação.

                  Sendo assim, o autor de Marxismo e Filosofia da linguagem busca um meio termo para tratar da questão acima mencionada, ou melhor, revela-nos que a linguagem não é desvinculada do mundo (como quer o objetivismo abstrato) e nem o sujeito é desvinculado do meio social – onde está inserido –  (como quer o subjetivismo idealista), a saber; o sujeito age, mas age em função da linguagem e do meio social sobre o qual está inserido, por isso, de acordo com Japiassu (1982) o sujeito não é assim tão independente como propalava Descartes (1973) em sua teoria do Cogito.

                  Depois dos argumentos arrolados anteriormente sobre a Teoria da Interação Verbal proposta por Bakhtin (1997), abaixo trataremos do modelo filosófico de Bourdieu (1988), teoria da economia de trocas linguísticas, que, consoante vimos na Introdução desse trabalho, também é um dos elementos participantes dos procedimentos metodológicos dessa pesquisa.

6 MODELO FILOSÓFICO DE BORDIEU

                  De acordo com Bordieu (1988), o discurso está inserido num mercado linguístico que determina o que pode e o que deve ser dito, seriam, justamente, as trocas linguísticas realizadas neste mercado, objetivando produzir lucros, mas, isto depende do discurso de cada sujeito, porque as relações linguísticas para a A.D., relações discursivas e ainda na A.D. o que Bordieu (1988) chama de mercado linguístico, a A.D. de acordo com Brandão (1988) chama de Formação Discursiva, já para Bakhtin (1997) as relações acima assinaladas estão contidas no bojo de sua teoria linguística conhecida como Interação Verbal.

                  Assim, em conformidade com Bordieu (1988) as relações do poder simbólico se dão dentro do chamado mercado linguístico e a questão do lucro ou do prejuízo, isto é, a questão de sermos bem sucedidos ou não, depende da relação de interação entre locutor, interlocutor, enunciação, sociedade, História e ideologia, porque para a A.D de acordo com Orlandi (2001) não há discurso sem sujeito e não há sujeito sem ideologia, já para Bakhtin (1997), a enunciação comporta sempre duas faces: toda palavra é determinada pelo fato de que procede de alguém e se dirige para alguém, esta relação se torna claramente explícita em Bordieu (1988, p, 23-24), quando assevera que: “[...] não se deve esquecer que as trocas linguísticas – relações de comunicação por excelência – são também relações de poder simbólico onde se atualizam as relações de força entre locutores ou seus respectivos grupos.”

                  Em vista disso, quaisquer que sejam os discursos, os locutores e o interlocutores no que tange ao que é dito, ou ao que se diz, esses sujeitos não dizem nada de maneira inocente, sem intenções previamente estabelecidas, porque, conforme nossas leituras no que se refere à linguagem e ao discurso, percebemos que além da ideologia, da História, do sujeito, da enunciação, da sociedade e dos interlocutores, o mercado linguístico também determina não só o que pode e o que deve ser dito, mas também, o sentido do discurso, consoante nos mostra Bordieu (1988, p. 24-25):

[...] Há também o fato de que o produto linguístico só se realiza completamente como mensagem se for tratado como tal, isto é, decifrado; além do fato de que os esquemas de interpretação que os receptores põem em ação em sua apropriação criativa do produto proposto, podem ser mais ou menos distanciados daqueles que orientaram a produção.

Por meio desses efeitos inevitáveis o mercado contribui para formar, não só o valor simbólico, mas também o sentido.

                      

                  Assim, depois de tratarmos da filosofia proposta por Bourdieu (1988), a teoria da economia de trocas linguísticas, também trataremos da História Oral, pois, ela, também participa dos procedimentos metodológicos que envolvem essa pesquisa.

                

7 HISTÓRIA ORAL

O uso da História Oral de acordo com Grudzinski (2001) remonta aos anos 50 do século XX, vista como meio, modo de deixar o sujeito excluído falar sobre os seus anseios, suas emoções, suas lembranças, enfim, sobre o seu passado, baseando-se para isso em suas memórias, dessa maneira, a História Oral garante ao sujeito o direito de contar uma outra História diferente da Oficial, uma vez que ele é quase sempre excluído pela história oficial, pelas fontes oficiais.

A História Oral trabalha exclusivamente com gravações de entrevistas cedidas pelos seus colaboradores, mas também com testemunhos de vida, cedidos por estas mesmas pessoas.  Além de considerar também as conjunturas, as instituições e, sobretudo os movimentos coletivos.

            Percebendo na Narrativa de seus colaboradores, o seu principal instrumento de trabalho, dando preferência à história de vida contada pelas pessoas entrevistadas, dessa forma, as histórias de vida se tornam um dos principais objetos de estudo da História Oral.

         Sendo assim, Grudzinski (2001) nos mostra ainda que o pesquisador que trabalha com fontes orais, não pode confiar totalmente no passado, nas lembranças de seu colaborador, porque essas lembranças podem carecer de certa fidelidade em relação aos fatos realmente acontecidos, por isso, não devem ser consideradas como única fonte de verdade, já que os relatos e as narrativas ocorridos não constituem literalmente o passado; são apenas algumas pistas dele, nem muito menos constituem a realidade. São representações mentais da realidade e do passado, por isso, o relato verdade não é a verdade, mas parte dela, representação dela, revelando, assim; pistas que somadas a outras, poderão, depois de avaliadas; servirem como uma interpretação aproximada do passado.

         Diante do exposto, veremos como se emprega adequadamente a metodologia proposta pela História Oral e sua importância para a construção dessa pesquisa no que tange à sua aplicação.

         Nesse aspecto, Paiva (1978) apud Caldas (2001, p. 32) nos revela os principais procedimentos empregados na coleta e no tratamento das informações provenientes da História Oral:

a) é preciso deixar o “depoente” falar livremente da vida e da sua vida, contar o que fez o que deixou de fazer e deixar que ele dê sua interpretação de tudo;

b) manter um tom coloquial, deixando a impressão de estar ouvindo o depoente, criando uma pontuação que mantenha a exata entonação da conversa;

c) deixar, no resultado final, o constante vaivém cronológico;

d) suprimir as perguntas proporcionando ao leitor um texto corrido e fácil de ser lido;

e) juntar os assuntos que se separem no vaivém das perguntas e das respostas.

 

           Além dos procedimentos citados anteriormente, devemos transcriar o texto gravado com os colaboradores. Transcriar segundo Meihy (2005) seria dialogar com o texto gravado, recriá-lo.

          Nesse sentido, adotar-se- à a metodologia acima proposta por Meihy (2005) para o   registro escrito das entrevistas gravadas e realizadas com os 50 colaboradores jovens, que utilizam a maconha em Vilhena-RO.

          Diante do exposto, analisaremos, a partir de agora o discurso da maconha ou o poder simbólico que o atravessa.

          Esse discurso não se constitui, apenas, numa maneira inocente de dizer, já que ele ou o poder simbólico que o regula estão inseridos num mercado linguístico definido, num certo horizonte social e num contexto sócio-histórico-ideológico de muitos usuários, simpatizantes e até traficantes.

          Por isso, tão referido discurso será visto sob estes três ângulos:

  1. A.D., na relação dos efeitos de sentidos entre os sujeitos e ainda na relação desses sujeitos com o contexto sócio-histórico-ideológico do qual participam.
  1. Bordieu (1988), na relação do produto discursivo do mercado linguístico com a economia das trocas linguísticas que este mercado determina.
  1. Bakhtin (1997), na relação da enunciação com o horizonte social definido pela Interação Verbal entre enunciado e enunciadores.

Assim, analisaremos agora o discurso da maconha proferido por 50 usuários da cidade de Vilhena-RO, pretendendo, dessa forma, visualizar como este discurso se constitui e ainda quais os efeitos de sentido desejados ou almejados pelos interlocutores, acima relacionados, envolvidos no processo de enunciação, ou seja, no processo de Interação Verbal.

    Além disso, verificaremos também como as relações entre as condições sociais de reprodução antecipadas e as condições sociais de produção podem afetar o mercado linguístico e, consequentemente, o discurso, por isso, ouçamos novamente de Bordieu (1998, p. 64) o que tem a nos dizer sobre estas relações: “[...] As condições de recepção antecipadas fazem parte das condições de produção, e a antecipação das sanções do mercado contribui para determinar a produção do discurso.”  Ou seja, é o mercado linguístico que determina o que pode e deve ser dito dentro de certas condições de recepção e de produção discursivas, em consequência, essas condições gerarão sanções negativas ou positivas.

     Positivas se o sujeito “respeitar o mercado linguístico”, isto é, dizer somente o que pode e deve ser dito, negativas se o sujeito “desrespeitar o mercado linguístico”, ou seja, se o sujeito dizer exatamente aquilo que não pode e não deve ser dito. É isso exatamente que os usuários da maconha fazem, por isso, infelizmente, o discurso deles recebe sanções negativas.

      Assim, após a exposição sobre o termo ou a palavra discurso embasados na A.D., em Bakhtin (1997) e em Bordieu (1998), abaixo trataremos da análise do discurso da maconha propriamente dito.

8 ANÁLISE DO DISCURSO DA MACONHA

      Diante do que fora dito, resta-nos, agora, analisar o discurso da maconha, linguagem metafórica, codificada e utilizada por alguns jovens (nesse caso específico, alguns jovens de Vilhena-RO) no que se refere ao uso da maconha, como se manifesta, o que se diz e até o que não se diz dizendo e ainda detectar a autêntica economia de trocas linguísticas que a este discurso subjaz.

      Contudo, antes de executar tão intrigante tarefa, gostaríamos ainda de enfatizar que o nosso corpus, material de análise, foi colhido junto a alguns jovens de Vilhena-RO [registrados de acordo com os procedimentos recomendados pela História Oral e analisados por três linhas distintas do conhecimento: A.D., linha europeia, modelo filosófico da linguagem proposto por Bordieu (1998), economia das trocas linguísticas e por fim, Bakhtin (1997), Teoria da Interação Verbal], que  utilizam ou utilizaram esporadicamente ou quotidianamente a maconha.

      Em vista disso, dentre os termos utilizados por esses sujeitos, merecem destaque, atenção especial, os seguintes:

  1. “Fazer uma parada.” Neste mercado linguístico (porque na linguagem de marginais, bandidos, seria; justamente; assaltar). Seria parar, “dá um tempo” e em companhia de algum colega, fumar um cigarro de maconha, em locais, previamente, estabelecidos por esses interlocutores.
  1. “Segurar uma maromba.” Esse termo, se o considerássemos em seu sentido denotativo, verificando o Houaiss (2001, p. 1857), teríamos a seguinte acepção: “s.f.(1844 cf. AGC)1 – vara utilizada pelos equilibristas para manter o equilíbrio sobre a maromba (‘corda bamba’); contrapeso”[...] Conforme se nota, marombar segundo o Houaiss (2001), seria equilibrar, mas, no contexto do discurso da maconha, marombar seria, justamente, o sentido avesso, a contramão do que está nos dicionários, seria de acordo com os nossos colaboradores, ficar “ligado”, “doidão”, o que geraria uma total perda do equilíbrio.
  1. “Vê qualequié da Kátia” Este discurso (não só este, mas todos analisados neste trabalho) nos remeteria à questão de fumar maconha, consumir essa droga e, não se refere a uma determinada pessoa do sexo feminino, como o nome sugere, esse enunciado, consoante nossos informantes, é utilizado pelas pessoas de fora do município de Vilhena-RO, ou seja, o termo acima mencionado não é comum, os jovens pesquisados não o  utilizam, pois, quando disseram utilizado “pelo pessoal de fora”, perguntei se era utilizado por usuários de maconha fora do Estado de Rondônia, entretanto, disseram que tanto fazia, isto é, usuários tanto fora do Estado de Rondônia, quanto dentro dele, com exceção do município de Vilhena.
  1. “Cadê a ponta.” A ponta se refere à sobra do cigarro de maconha que deverá ser consumido mais tarde, ou em outra ocasião pelos sujeitos que fazem uso dessa droga. Parece que ponta seria um termo uniforme, utilizado em Vilhena-RO e também em outras cidades do Brasil.
  1. “E aí? Cadê a Tereza? Por onde anda?” Este enunciado para um ouvinte que não esteja inserido no mercado linguístico da maconha, pode parecer, à primeira vista, que se refere  a uma pessoa cujo nome é Tereza, passa “batido”, isto é, as pessoas que não conhecem o discurso da maconha e nem estão inseridas neste horizonte social ou neste mercado linguístico ou nessa formação discursiva, poderão dá a este enunciado, a este discurso o sentido ao qual, anteriormente, nos referimos, todavia, quem está inserido em um dos elementos anteriores negritados, calculará, exatamente, o sentido que se pretende, deseja alcançar: preparar-se para consumir um cigarro de maconha. Além disso, conforme apuramos dos jovens pesquisados, o discurso mencionado no item 5 é utilizado, principalmente, por algumas pessoas de Porto Velho-RO que estão inseridas no contexto da maconha.
  1. “Pegar um Brau.”  Esse enunciado, ou troca linguística, ou discurso pode ser associado ao cantor norte-americano James Brown, de origem afrodescendente, ou seja, nesse mercado ou nesse horizonte ou nessa formação, parece haver uma forte relação com o referido cantor afrodescendente e com a maconha, pois, depois de queimada apresenta uma coloração escura, dessa forma, a droga se assemelha ao cantor no que tange, especialmente, à cor e ainda pelo ritmo do Funk, tipo de música cantada por James Brown, ser agitado, badalado, também, por isso, se faz esta apologia entre o cantor e a droga. E “Brau” já seria uma pronuncia abrasileirada.
  1. “Acender uma vela.” Seria também consumir maconha, parece que os efeitos de sentidos desejados ou pretendidos pelos enunciadores, usuários da maconha de Vilhena-RO, estariam interligados com a semelhança de sentidos que há entre acender uma vela (iluminar) e acender um cigarro de maconha, ficar “iluminado”, “inteligente”, “cabeça e mente abertas”.
  1. “Pegar um Back.” To back é um verbo no infinitivo da Língua Inglesa que teria os seguintes sentidos: apoiar, retornar, voltar etc. Dito dessa forma, deve-se entender: voltar, retornar ao que estariam fazendo antes, ou seja, voltar a acender, fumar um cigarro de maconha.
  1. “Segurar um Blazer.” Neste horizonte, ou mercado, ou formação, o enunciado ou troca linguística ou discurso se esfacela, se quebra, porque, pelo sentido “original” Blazer seria um tipo e roupa, inclusive, uma indumentária muito elegante, utilizada não em todas, mas, em algumas situações sociais muito especiais, na situação acima, o discurso assume uma nova roupagem, se transfigura, se configura no discurso da maconha, servindo para os interlocutores (conhecedores desse tipo de discurso) se comunicarem com o intuito de fumarem um cigarrinho “do capeta”, ou seja, cigarro de maconha.
  1. “Dar umas bolas.” Este enunciado, ou troca linguística, ou discurso, também (como todos os outros termos anteriormente mencionados) ser refere ao uso, consumo da maconha, pois, os sujeitos dessa pesquisa disseram que fumam a maconha e ao soltarem um pouco de fumaça, essa fumaça pode formar pequenos círculos semelhantes a bolas.
  1. “Pegar um fino.” Talvez o uso desse enunciado se justifique pelo motivo de que no momento de preparar a droga, deve-se enrolá-la como se fosse um cigarro e, de acordo com os nossos colaboradores, quanto mais fino o cigarro de maconha ficar, mais apreciado ele se torna e, esse fato justifica o uso desse discurso.
  1. “Vê qualequi é a do Fumo.” O cigarro da maconha, assim como o fumo (pelo que apuramos) deve ser bastante enrolado para ser melhor apreciado e a apologia ao fumo se justifica também, porque, o fumo depois de queimado apresenta uma coloração negra também semelhante ao cigarro de maconha, quando aceso, preparado para o consumo.
  1.  “E aí qualequi é a da Bia?” À primeira vista, parece que este enunciado se refere a um nome próprio de uma pessoa do sexo feminino, não obstante, este enunciado nos remete à sobra do cigarro de maconha que não fora de todo consumido, conforme se pode notar “Bia”, neste caso, não é uma pessoa e nem é ou pode ser uma suposta redução vocabular de um nome, Beatriz, pois, foi exatamente isso o que apuramos com os nossos colaboradores por meio da realização dessa pesquisa.
  1. “Pegar um baseado.”  Esta expressão corresponde, semanticamente, à mesma expressão citada no item nove deste trabalho, todavia, a forma mais econômica, linguisticamente, falando, seria a mostrada no item nove, ou seja, “segurar um blazer.”
  1. “Pegar uma Tora.” Refere-se ao ato de enrolar um cigarro de maconha muito grosso, pesado para a mente, como se o indivíduo que consome esse tipo de droga ao fumá-la, sentisse ou ficasse com a cabeça superpesada, isto é, a cabeça ficaria pesada parecendo uma tora.
  1. “Segurar um Mary Jean.” Talvez, dos discursos analisados, este seja o mais importante, porque, de acordo com Bakhtin (1997), este enunciado não apresenta somente uma voz, mas, outras vozes, várias vozes, ou melhor, a questão da polifonia para o referido teórico, porém, para a A.D. em conformidade com Brandão (1998), seria um fenômeno conhecido por interdiscursividade, um discurso citando outro discurso, um discurso dentro de outro discurso, um discurso atravessado por outro, isto é, não são mais os jovens de Vilhena-RO que falam entre si, todavia, há outras vozes presentes nessa enunciação, já que o termo “Mary Jean” faz parte da letra de uma das canções de uma banda brasileira de rock, conhecidas como “Planet Hemp” cuja tradução seria, provavelmente, “Planeta Maconha” e o principal vocalista dessa banda era “Marcelo D2”, que não só fazia apologia ao uso da maconha em suas canções, como também utiliza a droga e a defende com “unhas e dentes”, ou melhor, “prega”, incentiva abertamente o uso deste tipo de entorpecente; apesar disso, este vocalista esteve presente quase sempre na mídia, em programas de grande audiência, principalmente, programas da Globo, tais como: Programa do Jô, Domingão do Faustão, Altas Horas – “Vida Inteligente na Madrugada” etc, pois, suas canções encantam muitos jovens, adultos e até adolescentes, podendo ainda por meio dessas canções incentivar e inclusive induzir ainda mais pessoas a consumirem maconha.
  1.   “Segurar uma Maryuana.” Escrit

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