13/09/2016

ORDEM E PROGRESSO.

Dênio Mágno da Cunha*

            Ouvi, de passagem, a divulgação de um destes rankings da educação que existem no mundo. Ouvi que o Brasil não está bem, ouvi que a Finlândia é o primeiro colocado no ranking. Então procurei sobre os motivos desse posicionamento finlandês. Encontrei uma entrevista da ministra da educação Sanni Grahn-Laasonen que é claro, aconselho todos lerem. Não resolve, não esclarece o suficiente, mas fornece uma direção.

            Após a leitura, fiquei pensando nas diferenças. São muitas, mas eu não vou falar sobre elas. Vou falar sobre um fator que me incomoda na operação da educação brasileira: a ordem e o progresso.

            Temos de ter ordem? Sim, sem dúvida. A nossa vida tem de ser ordenada? Não. Qual a diferença? Temos de ter parâmetros orientadores da educação – matrizes, temas etc. Mas não devemos ter uma educação ordenada, mandada, enviada, empurrada goela a dentro. E é assim que funciona. Tanto que ainda utilizamos muito a expressão “grade” para definir o conjunto das disciplinas e conteúdo de nossas escolas. Não usamos a palavra conhecimento, mas sim, disciplinas (prefiro não comentar). Some: grade + disciplina = educação brasileira. Em todos os níveis. Nas faculdades federais e na pós-graduação, conquistamos créditos. Isto é, começamos devendo. Grade + disciplina + dívida = educação brasileira. Debaixo desse ordenamento, não há como conseguir o progresso. Porque não? Porque o progresso é alcançado com a criatividade, a inovação, com a problematização, com a reflexão, com o ato de pensar. Nossos alunos pensam? Não. Eles respondem a perguntas de forma certa ou errada. São avaliados pelo percentual de acertos e não pela demonstração de conhecimento na solução de situações reais.

            E para piorar, nossa educação parece algo ligado à economia: cheia de índices. Nosso aluno é, mais uma vez, pressionado, ordenado em seu caminho por uma educação seriada por índices.  Pera aí, mas a Finlândia também participa dessa história, tanto que ocupa o primeiro lugar no ranking. Então o problema não está no ranking?. Certo. O problema está na filosofia que emoldura a ordem.

            A nossa filosofia é autoritária e exploratória; a da Finlândia é democrática e libertadora.

            Podem copiar o modelo finlandês, coreano, ou outro qualquer. Enquanto tivermos uma filosofia surda, autoritária e exploratória, não vamos fazer a mudança que o governo diz querer fazer. Enquanto os líderes da educação não foram os professores e os alunos e sim os que estão sentados em gabinetes em Brasília, nada vai mudar. Na Finlândia, o foco é o aluno e o professor; a aprendizagem e o conhecimento; a reflexão e a solução. No Brasil é a regulação, a norma, o poder de mandar sobre. Fazemos o caminho inverso: primeiro a regra, depois a prática; na Finlândia, primeiro a prática, depois a regra.

            Não vou cair na vala comum de dizer aqui que a diferença está na valorização financeira do professor ou sobre a sua valorização social; ou de como é a preparação para o ofício.  Na entrevista isso é mostrado. Antes, temos de filosofar para compreender.

            Queria abordar um outro lado das palavras ordem e progresso.

            No vídeo desta semana, minha amiga Ingrid Vieira (Me in the world) fala da expressão “ser feliz ou ter razão”. Já estava com a ideia do texto sobre ordem e progresso quando assisti ao vídeo. E disse a ela que escreveria sobre este tema. Mas qual a relação? Bem, na educação é melhor ser feliz ou ter razão? Entendendo razão como, “estar certo sobre um assunto que gere dúvida”. Eu escolho ser feliz. Isto é, podem dizer que a estrutura da educação brasileira está coberta de razão; que a pedagogia está correta e baseada em estudos, cheia de razões; enquanto nossos alunos e professores não estiverem felizes em estudar e ensinar... e não compreenderem os motivos (e não as razões) e objetivos (e com eles concordarem) do sistema: nada feito.

            Ainda outra observação e um outro enfoque para o tema. Razão contrapõe-se, popularmente, a emoção. Isto é, nosso sistema de educação é todo baseado na racionalidade da razão. Analise: a emoção não entra na história. Onde é que a emoção entra? Na relação entre o professor e o aluno. E onde é que está o elo fraco da equação? Na lógica do sistema que privilegia o racional. Mais uma vez: é hora de equilibrar. Por que? Porque emoção pura e razão pura (me desculpe Kant), não resolvem nada. É preciso o objetivo do racional, da razão, unida à imprevisibilidade, à liberdade, o envolvimento que só a emoção é capaz de ter. Nosso aluno e nosso professor, dentro de um sistema racional, deve ser apaixonado um pelo outro. Entremeados e a uni-los: a busca pelo conhecimento e não a disciplina.

            Se você estiver entendendo o que estou emocionalmente dizendo, leia de forma racional a entrevista da ministra finlandesa. Aí, tudo o que eu tenho escrito nessas impressões, começará a fazer sentido. E daí, (como diz minha sobrinha Laura) podemos começar a conversar em busca de um caminho que nos permita ter como consequência, a liderança de algum ranking internacional. Você vai perceber: o que menos importa é a liderança no ranking, e sim a alegria da jornada até ele.

            Ah! antes de terminar quero louvar aqui as nossas escolas, professores e alunos finlandeses. Felizmente vocês existem e demonstram cada vez mais como é possível transformar a educação e através dela, o país. Sim, temos professores finlandeses, mas são exceção à regra. São ilhas de excelência, cercada de regras por todos os lados.

            Um quiz: Quais são as palavras que ouvimos quando falamos em educação no Brasil? Veja no final do texto.

Continua na próxima semana...

 

* Dênio Mágno da Cunha, professor em Carta Consulta, em Uma-Unatec, Doutorando em  História da Educação pela Universidade de Sorocaba. Acredita que é melhor ser feliz que ter razão.

Resposta a Quiz? Se você usou: sacrifício, sacerdócio, missão, herói, pobreza, avaliação, ignorância. Você acertou. 

Se você usou: alegria, prazer, valor, vitória, conhecimento, inovação, reconhecimento, você errou. 

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