POKEMON
Dênio Mágno da Cunha
O tema do texto de hoje não é fácil para o autor e também não será para o leitor dado a seu grau de complexidade gasosa.
Atravessamos uma semana surpreendente, o que para mim não é surpresa quando se trata do mês de agosto. Não falo do ponto de vista da superstição popular que taxou o mês de agosto como um mês de azar. Posso demonstrar estatisticamente: na minha vida agosto sempre foi um mês a ser temido. Já entro com o pé direito (mesmo não sendo supersticioso) para garantir que nada de mal acontecerá, mas acontece invariavelmente alguma surpresa.
Essa surpresa, mesmo que triste, pode ter consequências positivas ou negativas no futuro. Lembrando que definir ou julgar algo como positivo ou negativo é uma tomada de decisão: tudo na vida “poder ser que sim ou pode ser que não”. A nós cabe aceitar e compreender essas possibilidades. O certo, certíssimo e verdade é que cada um de nossos gestos compõe o cenário de nossas vidas no passado, no presente e no futuro. Estamos nos construindo continuamente, não somos obra acabada.
A propósito, o tema de hoje é a vida vista como um jogo ou a gameficação da vida.
Para marcar posição já digo: considero que a vida não é um jogo, mas acredito piamente que é útil olhá-la como tal. Cada uma das nossas decisões, cada um dos nossos gestos, cada segundo que vivemos pode ser considerado uma jogada. E o que significa uma jogada? Jogada significa tomada de posição, trazendo em si consequências.
Esse pensamento vai ao encontro do que nos dizem filosofias e tratados científicos: o mais famoso deles a “Hipótese Gaia”, a nos ensinar que a Terra é um organismo vivo interligado, sendo o Homem o seu sistema nervoso. Como tal, uma ação de desmatamento na Amazônia, por exemplo, afetaria negativamente o nível de desgelo na Groelândia. Isso significa que todos nós somos conectados uns aos outros, interdependentes, corresponsáveis por tudo aquilo passado ao nosso redor.
Trazendo essas considerações para a educação, posso pensar seja esse o motivo – aprender a compreender a vida – para ouvirmos falar tanto em gameficação. Palavra que a princípio me incomodou profundamente, pois (novamente) me recuso a acreditar que a vida seja um jogo, mas acredito sim que ganhamos ao vê-la como se fosse um jogo. A diferença é grande, mesmo que sutil no jogo das palavras.
Ao olharmos a vida como se fosse um jogo, vamos compreender que há um lado extremamente lógico, com regras estabelecidas, previsíveis e um outro, totalmente imprevisível, dinâmico, surpreendente. Tudo disposto num tabuleiro no qual você não é peça, mas jogador. De pirar a cabeça, por isso vou ser didático (comigo mesmo) para que possamos entender. Como sempre, trazendo para o contexto do espaço de estudo.
Vamos supor: hoje é o seu primeiro dia de aula e você está na porta do espaço de estudo. Você olha para dentro e faz o seu julgamento. A partir desse julgamento, você estará estabelecendo um parâmetro, a partir do qual seu futuro e de seus colegas se desenvolverá.
Continuando a suposição: você gostou do que viu; acho simpático o professor (ele sorriu para você e te deu as boas-vindas); seus colegas te deram atenção; você respondeu ao sorriso do professor e cumprimentou a todos com um “boa noite”. A partir daí, sem você saber, muitos outros acontecimentos serão influenciados por sua decisão. Imagine.
Ao contrário: você não gostou do que viu; achou aborrecido o professor (ele te olhou como quem diz, “mais um atrasado”); seus colegas continuaram na deles, sem nem perceberem sua presença; você fez o mesmo, entrou calado e foi direto ao fundo da sala, sem cumprimentar ninguém. Da mesma forma, a partir daí, sem você saber, muitos outros acontecimentos serão influenciados por sua decisão. Imagine.
Este é o lado previsível, lado lógico da vida vista como um jogo. Na primeira situação, no futuro próximo você será acolhido por todos. Pode ser que sim, pode ser que não. Na segunda situação, você será esquecido por todos – pode ser que sim, pode ser que não.
Felizmente, a vida é uma caixinha de surpresa também. Assim como existe essa lógica do previsível existe a lógica do imprevisível. É lógico, independentemente de a situação ter sido a primeira ou a segunda, (você não percebeu isso) um dos alunos, o mais belo deles, o mais inteligente, levantou os olhos quando você chegou à porta e imediatamente se apaixonou por você. Sua vida mudará a partir daí. Pode ser que sim, pode ser que não.
Fato, fato mesmo, é que se vermos a vida com raciocínio lógico, compreendendo que as surpresas são lógicas e previsíveis, pois fazem parte da dinâmica da vida, teremos condições de compreender melhor a nós mesmos, de entendermos os motivos de nosso momento atual, além de aumentarmos consideravelmente nosso grau de aceitação praticando o “pode ser que sim, pode ser que não”. Pode acreditar no que estou dizendo.
Quais as lições e interpretações possíveis? Estude raciocínio lógico, entendendo que há a possibilidade da lógica do ilógico (inesperado) acontecer; exercite seu raciocínio lógico (Kumon, Sudoku); monte quebra-cabeças; olhe a vida como se fosse um jogo e avalie suas ações diariamente, reveja, refaça, perdoe-se se achar que errou; peça perdão se o erro afetou o outro; avalie seu comportamento social e suas consequências para os demais; viva a Hipótese Gaia; e depois disso tudo, aja positivamente e serenamente porque você nunca dominará a amplitude das consequências de seus atos. As lições são muitas.
Una inteligência a seu coração pois a vida não é um, a vida são dois e muito mais. A vida é coletiva.
* Professor em Carta Consulta e Una/Unatec. Doutorando Universidade de Sorocaba. Acredita que a Hipótese Gaia não é uma hipótese.