08/11/2014

RECONSTITUIÇÃO DOS ESPAÇOS DO MOSTEIRO DE SÃO BENTO DA BAHIA ATRAVÉS DOS VESTÍGIOS ARQUEOLÓGICOS

RECONSTITUIÇÃO DOS ESPAÇOS DO MOSTEIRO DE SÃO BENTO DA BAHIA ATRAVÉS DOS VESTÍGIOS ARQUEOLÓGICOS
Leila Maria Ribeiro Alemida – arqueóloga do Laboratório de Arqueologia do Metrô Salvador.

Estudado o perfil dos ocupantes do Mosteiro, analisaram-se os detalhes evolutivos da edificação, porque através deles poderíamos vir a identificar elementos escondidos por intervenções posteriores, fossem estas de reforma ou demolição. Nosso maior obstáculo foi tentar remontar as diversas transformações feitas nos anos subseqüentes à construção inicial, pois, a maioria das alterações, não foram documentadas.
Resumidamente, as alterações construtivas referidas em documentos foram:
• Após a expulsão dos holandeses, os beneditinos retomam o mosteiro e iniciam a reconstrução da igreja destruída pelos ocupantes.
• Ajudado por doações, de 1681 a 1684, Frei Bento da Vitória constrói o pórtico e coro.
• Entre 1690 a 1694, Frei Manoel do Nascimento, assoalha o coro e reboca as paredes da Igreja.
•  No período de 1742 a 1745, no comando de Frei Antônio da Luz , é edificada a capela-mor. A comunidade beneditina decide pela demolição da igreja e inicia a construção do atual templo, inaugurado em 1871 No entanto, as obras continuam com a construção da torre do lado do Evangelho (1877), e a torre do lado da Epístola, em 1880.
• Desde 1895 até o ano de 1994, várias reformas foram feitas no monumento, como a demolição do coro em 1913; retirada da abóbada de vinhático e substituição pela atual, em 1933; reparos de fendas no frontispício, em 1940 entre outras.
Durante o trabalho escavaram-se três áreas do entorno do Convento. No Pomar, sob uma camada de lixo e pedras, encontraram-se vestígios de um antigo acesso para rua do Paraíso: restos de um forno para queima do material da antiga enfermaria (como indicam os restos de vasilhames e frascos de medicamentos queimados): e restos de pisos e alvenarias podem ter pertencido a uma das antigas capelas da cerca, todos de alguma forma reaproveitados para novos usos e acrescidos por materiais modernos.
No Claustro I identificaram-se diversas funções do espaço e uma menor dimensão original. A presença de dois enterramentos primários de pessoas que não pertenciam á comunidade monástica, colocados um em frente ao outro, formando um L, configura uma divisão de espaços.
Localizou-se também uma trincheira com largura de 1,00m, que segue o alinhamento do andar superior e corta o jardim separando-o em dois espaços constituídos por aterros de características bastante distintas.
 
 
Claustro com indicação da trincheira e enterramentos Trincheira ao fundo, marcada por uma seta branca.
Nenhuma estrutura ou organização de vestígios foi identificada deste lado e, a única ocorrência significativa, está ligada à presença de enterramento secundário (ossuário), aos 80cm das quadras situadas ao Leste.
A ocorrência de materiais construtivos no lado oeste, foi identificada como pertencente à construção da igreja e verificada através da presença de materiais idênticos aos utilizados no templo.
No Claustro II, onde está implantado o atual Colégio de S. Bento, encontrou-se uma calha de água ou esgoto que passa bem próximo do poço e segue a leste, em direção à Rua do Paraíso/Rio das Tripas e do lado oposto, em direção à sacristia atual. É interessante notar a presença de um lavatório trabalhado em pedra, localizado no mesmo ângulo em que se encontra o conduto .
Ainda no mesmo Claustro, encontraram-se, ao lado do capítulo, vestígios de dois cômodos com de piso de tijoleira, voltados para a Av. Sete de Setembro e, atrás do último cômodo, uma trilha formada por seixos rolados. A presença de uma janela pressupõe a existência de área aberta fronteira, assim, no período em que o capitulo foi construído, já não existia a edificação correspondente ao piso de tijoleira.
  
Superposição das duas etapas do mosteiro Detalhe do mapa holandês, mosteiro voltado p/o mar

As evidências levaram à busca de dados que auxiliassem na interpretação dos espaços e localizou-se um mapa holandês do séc XVII que mostra a igreja virada para oeste e não para o norte como a atual.
Sabíamos que no seu testamento Gabriel Soares de Souza determina que seria enterrado na Capela Mor do Mosteiro, mas a sua campa de encontra na entrada do Capítulo, junto com a do primeiro Abade do Mosteiro, isso nos dá um indício de que o altar mor poderia, antes, estar localizado naquela área.
Uma descrição existente no Livro Velho do Tombo, referindo-se à porta de entrada da igreja ou do Mosteiro narra que “desce em frente ao Mosteiro para o poente até o mar...”,induzindo a pensar que era uma entrada voltada para a Av. Sete de Setembro, ou seja, tendo o poente e o mar, em sua frente.
Confirmam-no a certeza de que o sobrado, hoje transformada em parte administrativa do Mosteiro, foi construído após a invasão holandesa e o fato de que seu alinhamento concorda com o da trincheira do Claustro I, dividindo-o em dois espaços cujos entulhos indicam momentos distintos de deposição e utilização.
Reforçando esta hipótese, verifica-se que os enterramentos primários de pessoas externas à comunidade beneditina, pela posição em que se encontram entre si e em relação ao limite do terreno, deveriam estar em espaço externo à clausura.
Por fim, observando-se que as medidas de um mosteiro, seguem rigorosamente as medidas da igreja, através de modelos geométricos, que traduzem, regularidade, ordem e proporção (Jorge, 1999), pode-se verificar que as últimas camadas de aterramento, localizados nestes dois claustros, se encaixam em um mesmo momento construtivo.
Assim sendo, teríamos, o atual Claustro I dividido em dois espaços, tanto a norte como a leste, sendo um externo e outro interno e este último, seria de fato, o antigo claustro.
Desta forma, a área do vestígio de edificação do Claustro II, pode pertencer a antiga igreja e/ou anexos desta, o que justificaria também, a presença das lápides de homens ilustres naquela altura. Por fim, a presença da caixa d`água, assinalada no mapa do séc XVII, situada atrás da igreja, faz com que as medidas encontradas naquele mapa, sejam semelhantes e lógicas.
A pesquisa arqueológica realizada no Mosteiro de São Bento trouxe à tona bem mais problemas do que soluções, entretanto, a escavação permitiu verificar que tanto o mosteiro antigo, como as suas cercas eram menores. Há indícios de que se localizaram a área da botica, casas de serviçais, a senzala e uma possível capelinha e podemos ter uma idéia da riqueza de informações ainda existente em variados vestígios, em todo o mosteiro.

 

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