22/09/2016

Repensando a formação continuada de professores.

Resumo: O presente artigo tem como objetivo refletir sobre a formação continuada de professores da rede básica de ensino da região de Pelotas/RS. Possibilitando através de uma entrevista online mostrar o parecer dos professores sobre as formações que estão recebendo em suas escolas. A partir da análise dos dados se percebe uma divisão de opiniões entre os entrevistados, mostrando que a maioria dos professores consultados está descontente com a forma com que estes encontros de formação continuada estão sendo organizados pelas escolas. Muitos deles não geram mudanças nas ações pedagógicas; e outros são ofertados para cumprir as imposições externas, gerando um descontentamento por partes dos docentes, que tem que se dividirem entre seus afazeres pedagógicos e os encontros de formação continuada, que na maioria das vezes ficam somente na teoria e pouco reflete na prática em sala de aula. A intenção do artigo é contribuir para melhorar os cursos de formação continuada de professores da rede básica, para que estes cursos atinjam seus objetivos que é a ampliação da formação pedagógica e formação humana integral.

 

Palavras-chave: Capacitação, Formação de Professores, Prática Docente. 

 

Introdução

 

A sociedade do conhecimento e da informação vem originando novas exigências ao sistema educacional, nas diferentes etapas do ensino, no entanto é preciso saber conviver com este bombardeio de informações que vem através das diferentes tecnologias chegando a escola e aos professores exigindo  flexibilidade no fazer docente. Daí a necessidade da formação porque o professor deve estar preparado para enfrentar essas mudanças nas instancias, cultural, política, econômica e social.

Nesta perspectiva, cabe ao professor estar em constante atualização que acontece por meio de diversos cursos de formação[1] inicial (graduação, especialização, mestrado e doutorado), que se complementa com o desenvolvimento da profissão e da capacitação continuada, que tem como proposta colocar o professor em contato com novos modelos educativos, podendo assim realinhar sua prática pedagógica conforme as necessidades emergentes do século XXI.

            Pestalozzi no século XVIII alertava para a importância da formação da capacidade humana. Segundo ele, o não desenvolvimento do conjunto das capacidades humanas – cabeça, coração e mão tem como consequência uma má formação geral e faz o gênero humano artificial. (PESTALOZZI, 2003,p. 55).  Nesta colocação ele está se referindo a formação integral do ser humano, que só poderá acontecer quando se aprender a fazer uso do conhecimento (cabeça), sentimentos (coração) e da prática (mãos). Portanto a formação profissional como a formação humana é um constate aprendizado na vida dos sujeitos e nem uma deve se sobrepor a outra, ambas devem se desenvolver de forma linear através da formação constante para dar conta de uma formação para a sociedade do conhecimento.

            No entanto, é preciso que se comece a pensar que tipo de  formação os professores do século XXI precisam e qual a melhor forma de oferecer  essa formação. Porque parece que as atuais formações não estão despertando o interesse dos professores, mas sim causando uma desmotivação e uma enorme resistência por parte dos professores em participarem de novas capacitações por não se perceberem parte desse processo? Pois a fragilidade das capacitações e a desvinculação dessa com a realidade dos sujeitos pode acarretar em desmotivação e falta de interesse por parte dos professores em vir a participar de novas capacitações. A pesquisa tem como propósito investigar como os professores estão avaliando a formação continuada que está sendo oferecida nas escolas da rede estadual e municipal na região de Pelotas/RS.

O estudo busca analisar a partir das entrevistas a visão que os professores estão tendo do próprio processo de formação na educação básica, buscando ressaltar a importância da formação dos professores, bem como mostra o que os professores da região de Pelotas/RS, estão percebendo desse processo de formação continuada.

 

Metodologia

A metodologia esteve alicerçada na pesquisa qualitativa Minayo (2010), com imersão nos cursos de formação continuada, onde percebemos as percepções dos sujeitos sobre os processos de formação nesta modalidade de educação. Realizou-se entrevistas (via questionário on-line) com os professores da rede municipal e estadual de ensino de quinze escolas no ano de 2015, sendo que estes pertencem a licenciaturas distintas, visando pesquisar como os docentes estão recebendo a proposta apresentada pelos gestores, tanto do município como do estado quanto a capacitação em serviço.

A pesquisa foi realizado via questionário aberto com aproximadamente 15 professores. Os sujeitos participantes (MINAYO, 2010) analisaram suas próprias vivências no contexto dos cursos de formação que participaram e a relevância desses para sua formação. O questionário foi enviado e respondido  por meio de plataforma moodle/UFPEL, pois os professores consultados moram em diferentes cidades, dificultando o contato direto. Cada professor recebeu o questionário  com as perguntas e explicações referentes à pesquisa; ao organizarem sua resposta, devolveram por meio virtual. As respostas do questionário foram analisadas a partir do mapeamento das mesmas, o que possibilitou a organização para elaboração das considerações finais.

 

A Formação de professores – O professor neste processo

Umas das questões mais atraentes e discutidas na atualidade no meio educacional e a formação de professores, que não é nem uma inovação nos meios educacionais, pois são muitos os autores que pesquisam e teorizam sobre esta temática, destacando sua importância para os profissionais da educação. Entre eles destacam-se, Candau (1997), Nascimento (2000), Garrido & Pimenta & Moura (2000), Pimenta (2002), Imbernón (2000), Nóvoa (1992), Benincá (2004), entre outros, que se dedicam a pesquisar a formação de professores de longa data e apontam a escola como campo diversificado para  a formação e desenvolvimento profissional dos professores.

Por vezes o debate sobre formação de professores parece esmorecer ao mesmo tempo em que tem prioridade entre alguns autores, o que de certa forma reanima as discussões sobre os processos formativos, expondo a realidade dos professores, cuja formação é repleta de incertezas, de conflitos frente às mudanças dos saberes e das novas tecnologias.

No entanto é preciso deixar claro o que estamos chamando de formação, pois há uma diferenciação necessária entre formação continuada (formal) e permanente (informal). A segunda é realizada constantemente, mesmo que o sujeito não tenha consciência que ele está realizando. A leitura de jornais, revistas, livros; e o diálogo e reflexão sobre o que se vive e se enfrenta no dia-a-dia, faz parte desse processo permanente de formação pelo qual passamos ao longo de nossa vida. Conforme Benincá (2004, p.103), a “educação informal garante a formação para o sistema vigente, ou seja, da educação para o consumo, para o passivismo e para o mercado”. A educação informal que se adquire  através dos diversos meios de comunicação esta voltada na maioria das vezes  para  a formação de interesses pessoais, que  se diversifica ao longo da vida .  

Porém a formação continuada (formal), por sua vez, exige o esforço concentrado num curso específico, com tematizações precisas ligadas ao projeto de curso. Esta é muito importante, pois com ela o sujeito se apropria de conceitos e métodos de uma área específica, o que tende a qualificar suas ações profissionais. Assim, sendo um bom projeto de educação continuada poderia se aproveitar os espaços-tempos de trabalho e potencializar a formação permanente, de modo a impactar de maneira consistente na ação-reflexão do sujeito e de seu grupo, através de assuntos, temas, conceitos, categorias relevantes para o desenvolvimento do trabalho cotidiano. Até porque, com o desenvolvimento da ciência e tecnologia se tem acesso a muitas informações, o que não garante conhecimento, pois para que se aprenda “algo”, é necessário que esse “algo” seja incorporado aos conhecimentos previamente existentes para depois gerar  novos saberes.

A formação ocorre sempre quando essa transformação gera uma modificação no processo de vida pessoal e profissional, quando estes se fazem visíveis na pratica pedagógica em sala de aula, gerando novos projetos que venham resignificar a prática pedagógica desses profissionais. Que segundo Schõn (1994 in Pimenta,2006, p.20)  denomina de “reflexão sobre a reflexão na ação”. Com isso, abre perspectivas para a valorização da pesquisa na ação dos profissionais, colocando as bases para aquilo que convencionou denominar de professor pesquisador de sua prática. Conforme Schõn, há uma forte valorização da prática na formação dos profissionais; mas uma prática refletida, que lhes possibilite responder às situações novas, nas situações de incerteza e indefinição.

 Entretanto, Sacristán (1999) enfatiza que a prática não deve ser entendida num sentido restrito da sala de aula, mas em sua diversidade e em seus variados contextos: o pedagógico, o profissional e o sócio- político-cultural. O autor defende uma formação politizadora, não só baseada na prática de sala de aula, mas sim numa visão de conjunto para que a formação seja completa em todos os domínios, sociopedagógico, sociocultural e sociopolítico.

No entanto, sabe-se que o conhecimento adquirido no meio acadêmico através dos cursos de graduação acaba ficando desatualizado frente às novas mudanças educacionais e tecnológicas. Portanto o professor que não se atualiza, fica pedagogicamente ultrapassado frente ao mercado de trabalho. O professor que não buscar inovar sua prática, acaba realizando sempre as mesmas aulas, que se tornam cansativas e rotineiras para os alunos. É preciso inovar, trocar experiências com  outros colegas,  criar novos mecanismos que visem a inovação da prática pedagógica com o uso da tecnologia. Porque a formação inicial não consegue dar conta de todos os saberes necessários para as demandas existentes na prática educativa da atualidade.

Nesse sentido a formação continuada poderá ser uma alternativa de formação rápida, econômica e facilitadora que pode ajudar o professor a sanar suas dúvidas, dificuldade e medos diante das novas exigências do século, além de expor seus projetos de pesquisa para os demais colegas, realizando assim, a socialização do conhecimento e a trocas de experiência no coletivo, através de cursos diversos, palestras, jornadas acadêmicas e seminários.

 

Formação continuada: A percepção dos professores nesse processo.

A política educacional tem apostando e incentivado nas ultimas décadas  na formação continuada dos professores através de várias plataformas On-line e  presenciais com o propósito de assegurar ao professor a inovação de sua prática, aperfeiçoando seu conhecimento frente aos novos desafios que a escola apresenta em termos culturais, políticos, econômicos e tecnológicos, bem como na busca pela cidadania. A formação continuada ingressou no Brasil e tomou forma a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), nº9394/96, que visa a valorização dos profissionais da educação, assim como uma política para o magistério de melhor qualidade.

A LDB em seu artigo 64 assegura a formação continuada a todos os profissionais que prestam serviço a qualquer rede de ensino, porque ela possibilita o crescimento profissional dos professores, que articulam suas ações em projetos de ensino em diferentes instituições para melhorar a educação no país. Tendo como principal objetivo o de adaptar a formação dos professores aos novos tempos e as novas demandas educacionais, porque não se pode mais aceitar profissionais da educação com formação estável. O que se busca com a formação continuada é crescimento profissional dos professores e seu domínio sobre a cultura letrada, dentro de uma visão critica e humanitária que leve ao desenvolvimento das múltiplas competências  profissionais. Conforme Perrenoud,

 

A formação de professores é, portanto, necessariamente uma formação global da pessoa[2]. Será preciso alargar a noção de competências para nela incluir todos os saber-ser e traços de personalidade requeridos pelo exercício da profissão docente. (PERRENOUD,1997,p.180).

 

 Na hodiernidade, a formação docente tem sido foco de interesse das secretarias estaduais e municipais em promoverem programas institucionais de formação continuada, para melhorar a qualidade do processo educativo na rede de educação básica.

Pimenta (1999. p.16) relata que “no que se refere à formação contínua, a prática mais frequente tem sido a de realizar cursos de suplência e/ou atualização dos conteúdos de ensino. Esses programas têm se mostrado pouco eficientes para alterar a prática docente.” O relato de Pimenta vai ao encontro do depoimento da professora da rede municipal que ao responder a pergunta sobre qual sua visão da educação continuada revela,

 

Os resultados da formação no dia (a) dia sinceramente pouco eu via, pois eu participava da prática de muitos colegas e não via avanço, ao contrário eu via métodos velhos e pouco atrativos, intolerância com aqueles alunos com mais dificuldade de aprendizagem (professor 4).

 

Como podemos observar, os resultados nem sempre têm gerado alterações na prática docente. Pois mesmo diante de cursos, palestras, jornadas, seminários e cursos On-line, muitos  professores  não modificam sua metodologia de trabalho, são professores que resistem às mudanças e à  inovação tecnológica, o que os leva dar aulas tradicionais, enfadonhas e cansativas, levando os alunos ao não aprendizado. Nesse caso o professor “acaba se tornando mais um executor de tarefas do que um mediador dos processos pedagógicos” (Tardif e Lessard, 2009, p. 193). Segundo Nóvoa: (2009, p.23) [...] insisto na necessidade de devolver a formação de professores aos professores, porque o reforço de processos de formação baseadas na investigação só faz sentido se eles forem construídos dentro da profissão. Enquanto forem apenas injunções do exterior, serão pobres as mudanças que terão lugar no interior do campo profissional docente.

Entende-se que o processo formativo para ser algo prazeroso tem que partir do interesse e desejo do professor de buscar a qualificação profissional, porque somente ele é capaz de saber das suas reais necessidade em sala de aula. Daí a importância da escola propor ações conjuntas com seu corpo docente. Porém é preciso que a direção da escola propicie momentos de formação dentro e fora dela, que vá ao encontro dos interesses das diversas áreas, liberando os professores para essas atividades. A formação deve ser ofertada em diferentes momentos, e nunca de forma centralizada unicamente na figura do professor, deve procurar estender-se a toda equipe escolar envolvida no processo ensino aprendizagem, porque o sucesso do ensino aprendizagem é responsabilidade de todos que fazem parte da escola; professores, gestores e família.  A escola deve ser um “locus” de formação coletiva onde todos sejam responsáveis pela qualidade do ensino e das formações por ela ofertada. Do contrário esses  momentos de formação  podem se tornar desestimulantes e estressantes, como declara uma das entrevistadas.

 

Sou professora da Rede Estadual de Educação do Rio Grande do Sul. Avalio que a formação continuada é ineficiente, pelo formato em que se apresenta nas escolas, ou seja, de forma obrigatória, fora do horário de trabalho dos professores, o que causa desconforto e estresse junto ao grupo levando a discussão das temáticas propostas a se tornar uma questão secundária, o que deveria ser ao contrário.  Penso que uma avaliação que tenha impacto real para a educação deve passar pela valorização do profissional, financeira e também de trabalho, pois veja, hoje em dia a cada 20 horas de trabalho, trabalhamos 14 horas em sala de aula (quando se fala em área do conhecimento), as 6 horas restantes tem que se dividir em preparação de aulas, pesquisa, avaliação e reuniões. Não existe um momento que seja oportuno no calendário escolar não propicia o debate de temáticas. (professor-2).

 

Na verdade, é preciso escutar os professores, para descobrir suas necessidades, dúvidas, inquietações e as suas perspectivas em relação à formação continuada; facilitaria sem dúvida a organização e elaboração de novas propostas de aprimoramento na formação continuada, mais condizentes com o tempo e com a realidade dos professores em serviço. Porém as colocações feitas pela professora estão muito ligadas às políticas públicas[3],  para que essa realidade mude é preciso que as políticas que regem a formação continua de professores e as condições de trabalho sejam reavaliadas. Conforme relata a professora entrevistada, quando expõe suas vivências e suas expectativas em relação a formação continuada de professores da rede básica.

 

Trabalho na rede estadual de ensino, com Anos Iniciais desde 2011. Nestes anos de estado participei de formações nos anos de 2012 e 2013. De modo geral as "formações continuadas", vem gerando para os cofres públicos um desperdício de dinheiro, pois, constituem-se em momentos de pouca contribuição em nossa formação continuada, visto que nessas formações as informações pouco ou quase nada acrescentam naquilo que já sabíamos de antemão, por outro lado as pessoas responsáveis por esses encontros trazem em suas falas um total desconhecimento da realidade de nossas escolas o que faz com que haja momentos de muito constrangimento e desinteresse de nossa parte, ainda mais que depois dessas formações precisamos recuperar tais aulas. A esse respeito, isto é, formação continuada, penso que necessitaríamos de espaço de discussão e construção coletiva. (Professor 3).

 

Como se percebe, parece haver um descontentamento por parte dos professores quanto a organização e planejamento no processo de formação contínua sem a colaboração e participação dos maiores interessados, os docentes. Além desse fato, podemos recorrer a Benincá (2004, p.108) quando afirma que “o discurso que não brota da prática não gera transformação, sendo utilizado para justificar o próprio discurso, principalmente o legal e o institucional”, o que remete a fala da seguinte professora quando se refere aos resultados da formação que participou,

 

O que discutíamos na formação continuada, as ideias de projetos para a escola ficavam somente no papel e se caso algum professor ousasse fazer diferente era mal visto. Isto tudo me serviu de lição de que a escola poderia ter um rendimento educacional bem melhor e assim ajudaria bem mais os educandos da escola e a comunidade já que o entorno da escola é de um lugar com muitas carências  A escola tem um ponto positivo, ela valoriza e traz para dentro dela a comunidade escolar, conhece bem a realidade do entorno, faz cursos para pais de alunos e vizinhos, porém não privilegia as discussões das formações nem as coloca em prática. (Professor 4).

 

É possível detectar nesse relato que houve uma resistência tanto por parte dos professores como da gestão em implantarem novos projetos nas escolas, mesmo depois de terem concordado com a possibilidade de implantarem uma nova proposta pedagógica que melhoraria o processo de ensino aprendizagem. Ficaram somente no discurso teórico, o que de certa forma prejudica os professores que estão abertos a novas propostas educativas e que gostariam de testar na prática e não o fizeram por medo ou represália. Descaracterizando assim o objetivo principal da formação continuada que é ajudar na construção de novos saberes pedagógicos.

Cabe aos professores aproveitarem esses seminários de capacitação para proporem temas e atividades que sejam do interesse do grupo e que os mesmos possam utilizar esses momentos formativos para resignificar suas ações tanto teóricas como práticas. Para Nóvoa (1992, p. 25), “a formação não se constrói por acumulação conhecimentos ou de técnicas”, mas sim pela (re)construção permanente da reflexão crítica sobre as práticas”. Daí a importância da formação continuada e dos momentos de trocas de experiência entre os  professores.

 Outro ponto que aparece na fala dos professores foi que a escola pareceu não se importar muito com as propostas geradas via formação, neste caso a formação é realizada somente para cumprir protocolo. O que gera uma controvérsia porque não privilegiou os projetos da capacitação, mas, no entanto procura capacitar os pais dos alunos. Nesse caso parece que a escola está mais preocupada em instruir os pais do que por em prática os projetos acordados via formação de professores, que sem dúvida geraria novas perspectivas pedagógicas e mais qualidade no ensino a ser ofertado aos alunos. Nóvoa (1992, p.9) “enfatiza que não há ensino de qualidade, sem uma adequada formação de professores”. Para que a escola melhore significantemente o processo de ensino aprendizagem, precisa considerar os resultados apontados e sugeridos pelos professores a partir das discussões das capacitações por ela oferecida a seu corpo docente. Segundo Baladeli (2012, p.163) a formação e/ou capacitação que “repousa na formação profissional do professor, não pode acontecer apenas na graduação. [...]. Acreditamos que a melhoria do processo educativo se dá também pelo investimento na formação continuada do professor”.

Afirmação esta que nos leva ao depoimento de outra professora da rede estadual que por sua vez fala da importância de se pensar e aprofundar as discussões teóricas a partir das vivências dos professores para melhor aproveitamento desses espaços de formação dentro das escolas, procurando unificar os fazeres pedagógicos, na busca pela valorização do trabalho no coletivo. De acordo com a entrevistada,

 

Acredito que ainda seja necessário aprofundar algumas formações continuadas no sentido de trazer a discussão teórica a partir da vivência cotidiana dos professores. Em geral se pede muita oficina com atividades práticas. Penso que é fundamental uma maior compreensão da função social da escola enquanto instituição pública e a compreensão do fazer pedagógico comprometido com a função social da escola. Há muitos fazeres "soltos" dentro da escola. Nem sempre existe um reconhecimento do trabalho coletivo no espaço escolar, o que fragmenta o todo. (Professor 14)

 

Neste depoimento, se percebe que a professora tem uma preocupação com a função social da escola, assim como trazer para as formações a junção da teoria e prática, pois ambas devem andar juntas propiciando o desenvolvimento profissional dos professores. O professor reflexivo tem consciência que seu aprendizado se dará por toda sua vida, por isso busca seu aperfeiçoamento profissional e pessoal através do contexto o qual está inserido, no coletivo escolar e na pesquisa da sua própria prática. Pois entende que na junção do campo teórico e prático ele consegue transformar sua práxis.  NÓVOA (1992, p.27) vai dizer que o grande desafio da atualidade está na “valorização de paradigmas de formação que promovam a preparação de professores reflexivos, que assumam a responsabilidade do seu próprio desenvolvimento profissional e que participem como protagonistas na implementação das políticas educativas”. Portanto nada melhor que a articulação entre os saberes docentes para construir caminhos coletivos de participação e reconstrução de novos saberes, a partir da remodelagem de velhas práticas que se transformam a luz dos novos saberes. Nesse sentido, podemos compreender que a formação continuada desde que construída com a participação dos educadores possibilita a produção de novos conhecimentos docentes que passam a refletir e pensar sua prática em sala de aula, provocando mudanças que repercutirá no aprendizado do aluno, como aponta o depoimento da professora a seguir,

 

Sou professora na rede pública municipal há 15 anos, trabalhando com Educação Infantil, anos iniciais e finais do Ensino Fundamental. Penso que no decorrer dos anos a oportunidade de formação continuada tem melhorado muito, a oferta de cursos pelas próprias secretarias de educação tem facilitado este acesso aos professores. Quando ingressei no magistério a liberação para um curso era muito difícil, os professores não eram dispensados nem para cursar a graduação e isso acabava afastando os profissionais deste objetivo. Hoje na realidade a qual atuo há uma formação continuada para cada área específica e esta ocorre durante o ano letivo com encontros presenciais e aplicação de projeto na escola. Sinto que esta é uma oportunidade muito valiosa, porém penso que isso não deve ocorrer como imposição, afinal é preciso que estejamos receptivos ou será um curso sem validade, porém o importante é que está sendo oferecido e quem tem interesse está aproveitando e realizando projetos muito importantes dentro das nossas instituições. Os professores são liberados para participar de cursos fora das formações oferecidas pelas secretarias e ainda para cursar graduação, especialização e pós-graduação. Percebo a formação continuada como essencial na vida de um professor, é um momento de troca de saberes, de construção de conhecimento, de troca de experiências e com certeza estas formações refletem na formação dos alunos. (professora 7).

 

Sem dúvida podemos perceber que esta professora sinaliza como positiva a formação continuada que vem recebendo, assim como é visível o incentivo da escola na formação dos seus professores, sendo acessível nas liberações para que os mesmos possam participar desses espaços de aperfeiçoamento permanente, sejam em cursos de curta ou longa duração. Conforme Imbernón (2011, p.72) “não podemos entender a formação permanente apenas como atualização científica, pedagógica e cultural do professor, e sim, sobretudo como a descoberta da teoria para organizá-la, fundamentá-la, revisá-la e combatê-la, se preciso” Assim sendo, o professor só conseguirá fazer esta análise se estiver em constante aperfeiçoamento profissional, seja em capacitação ou formação continuada.

No contexto dessa pesquisa alguns professores apontam como positiva suas vivências em curso de formação continuada que realizaram para sala de recursos, apontando esses como responsáveis pela qualificação que tiveram em suas atividades. Conforme declara uma das professoras entrevistadas.

 

Estou a vinte e dois anos no magistério estadual, com 40h/semana. Durante vinte anos trabalhei com turmas de alfabetização, 1º e 2º anos. A dois anos atuo em Sala de Recursos e por isso, trabalho direto com os professores de sala de aula, acompanhando de perto o crescimento dos alunos. Acredito cada vez mais que, não só o professor de sala de aula precisa da formação continuada, como todos os profissionais de educação. Este não é um processo estanque, está sempre em construção e, portanto todos os envolvidos devem acompanhar as mudanças e aperfeiçoarem-se. Os educadores precisam refletir sobre suas práticas, tornando seus planejamentos atrativos para os educandos. Acredito que a formação continuada seja um momento para repensar o trabalho desenvolvido e agregar conhecimento juntos a outros colegas. (Professor 1)

 

Outra entrevistada também se pronuncia favoravelmente à capacitação recebida para atuar em sala de recursos e se mostra muito otimista quando a importância dessas formações para o aprendizado dos professores, por elas favorecerem as trocas de experiências entre os colegas, fortalecendo as discussões e o aprendizado no coletivo. Nas palavras da entrevistada,

 

Sou professora na E.E.E.F.N.S.G, a 14 anos, numa Sala de Recursos Multifuncional e também professora Pesquisadora do CLPD/UAB/UFPel, desde 2006. Penso que a formação continuada é extremamente necessária para desenvolver uma boa práxis. No caso do estado do Rio Grande do Sul passamos por um longo período, 8 anos, praticamente sem formação, quando tínhamos reunião, eram apenas de indicações do que e de como deveríamos fazer nossa prática, sem reflexões, trocas ou estudos com teoria que pudessem contribuir para a nossa efetiva prática cotidiana. Posso inclusive afirmar que essa opinião não é só minha, pois no começo desta semana fazíamos esta discussão no grupo da educação inclusiva e, do mesmo modo temos feito em nossa escola. Hoje temos a autonomia de escolher na escola sobre o que precisamos e queremos discutir e temos feito isso muito seguidamente, diminuindo angústias e ansiedades dos professores e promovendo uma prática melhor. É interessante ressaltar que as opiniões entre os professores são muito variadas e que esta não é uma construção fácil, no entanto fortalece e qualifica o coletivo. (Professor 10)

 

Na visão dessa professora a formação continuada favoreceu a troca de informações, sanou dúvidas, anseios e possibilitou a reflexão coletiva na escola, que lhe deu autonomia para gerir o processo de ensino aprendizagem de forma participativa e reflexiva. Segundo Benincá (2004, p.108) “o discurso que nasce da prática, observada e refletida, pode transformar o sujeito da prática e, consequentemente, a própria prática pedagógica”. Trata-se do processo de formação continuada; que vem gerando divergências entre os professores por não partir da realidade pensada, observada e refletida entre os professores e seus gestores.

 

Considerações finais

 

Observa-se que a formação continuada que está sendo oferecida em certas escolas precisa ser refletida e analisada para melhor cumprir seu papel enquanto espaço de formação. Precisa ser priorizada dentro do calendário letivo, levando em conta o tempo e carga horária dos professores para que estes sejam capazes de aproveitarem a formação continuada para refletirem sobre os diversos problemas que rodam o fazer pedagógico a luz da realidade local e das novas demandas educacionais. Acredita-se que as formações devem ser realizadas por áreas ou por centros primeiramente para depois ser refletida coletivamente no grande grupo para que haja uma troca de saber refletido, pensado e analisado num contexto micros para macros onde todos os professores possam discutir seus respectivos interesses formativos de forma individual e coletiva.

Portando a formação continuada só se tornará interessante quando os professores conseguirem articular o campo teórico com o prático através da ação-reflexão. Para tal fim é preciso que a escola organize as formações juntamente com os professores, além de dar autonomia para que estes possam transformar suas ações pedagógicas por meio de projetos coletivos e emancipatórios, que visem também uma modificação nos processos ensino -aprendizagem dos seus alunos, sendo profissionais competentes dotados de fundamentação Teórico-Prática capaz de analisar e refletir criticamente a escola e a educação de forma contextualizada e globalmente.

 

 

Referencial

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[1] Palavra formação tem mais de uma dezena de acepções. Porém, “formação de docentes», duas coisas se podem entender: 1 – Ação de formar pessoas no sentido de estas virem a tornar-se docentes. 2 – Sujeição de pessoas que já são docentes ,a ações de formação, no sentido de ganharem novas habilitações. Esta segunda hipótese aproxima-se mais da ideia de «capacitação de docentes». Pois já temos os docentes, e a ação pretende dotá-los de mais capacidades, aptidões e habilitações, torná-los ainda mais capazes do que a sua formação de docentes faria supor (ARATES,Ruth.2014). Neste artigo usaremos as duas definições, respeitando as respectivas denominações.

[2] Grifos do autor.

[3] Para Ball (1994, p. 10) a política assume uma “economia de poder”, um conjunto de tecnologia e práticas as quais são realizadas e disputadas em níveis locais. Política é texto e ação, palavras e fatos, tanto o que é praticado, quanto o que é pretendido. O autor alerta que a política é um processo de mediação nas prática onde cada um  tem que adaptar a sua realidade. Mainarde (2006, p. 49) afirma que o “ciclo de Políticas é uma abordagem complexa e controversa da política educacional, enfatiza os processo micropolíticos e a ação dos profissionais que lidam com as políticas no nível local e indica a necessidade de se articularemos processos macro e micro na análise de Políticas educacionais”. A política em si não diz o que deve ser feito, mas propõe situações a serem executadas e analisadas. Ball, (2009 Apud, Mainarde e Marcondes, 2009, p.305) nos diz que primeiramente “as políticas são escritas, enquanto que a prática é ação, inclui o fazer coisas. Assim, a pessoa que põe em prática as políticas tem que converter/transformar essas duas modalidades, entre a modalidade da palavra escrita e a da ação, e isto é algo difícil e desafiador de se fazer. [...]. E este é um processo de interpretação e criatividade e as políticas são assim. A prática é composta de muito mais do que a soma de uma gama de políticas e é tipicamente investida de valores locais e pessoais e, como tal, envolve a resolução de, ou luta com, expectativas e requisitos contraditórios – acordos e ajustes secundários fazendo-se necessários.

 

 

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