16/10/2017

Resenha Juventudes e Cidades Educadoras

Resenha do livro Juventudes e Cidades Educadoras

 

Deivid de Souza Soares[1]

Lilian Soares Alves Branco[2]

 

O livro “Juventudes e Cidades Educadoras”, de Paulo César Rodrigues Carrano que vem a ser uma adaptação da primeira parte da sua tese, divide-se em seis capítulos, além de introdução e conclusão. Na presente resenha no primeiro momento será discutido cada capítulo do livro, após será apresentada uma reflexão sobre a obra e suas implicações na educação e em pesquisas.

No capítulo 1 - Práticas sociais educativas na cidade o autor apresenta a ideia de cidade educadora, inicia o livro salientando a importância de pensarmos a educação como práticas sociais, pois isso significa o reconhecimento dos múltiplos fatores que influenciam na construção das identidades. De encontro a esse pensamento para ele, pensar a discussão de educação formal, não-formal e informal “são rígidas demais para dar conta da mobilidade do processo social” (p. 18), pois segundo o autor a educação não se resumo aos cotidianos institucionais. Além disso, é importante compreender as cidades não apenas como resultantes de operações estratégicas, decisões políticas, mas sim nas relações de cidadania ativa dos habitantes e os espaços não são um dado, mas uma relação social.

A organização democrática de espaços e tempos das idades identifica-se com a instauração de práticas educadoras orientadas para a produção continuada do humano segundo as necessidades sociais concretas e as trocas comunicativas que produzem os sentidos culturais. (CARRANO, 2003, p. 27)

No capítulo 2- Corporicidade, o autor discute a relação do corpo com as cidades, onde a educação, no seu sentido ampliado, se faz através dos corpos e se dirige a eles. O autor apresenta o conceito de corporicidade como “o processo instituído pelo conjunto das práticas humanas que se evidenciam em relações políticas de influência recíproca, entre os corpos/sujeitos e os complexos sociais urbanos que chamamos de cidades.” (p. 41) Através de um relato da sociedade xinguana dos Yawalapíti, o autor exemplifica que todas as sociedades elaboram estruturas simbólicas de fabricação de corpos. Ainda neste capítulo é feito uma retomada histórica, onde o autor aborda os períodos históricos sobre a corporicidade em cada período.

No terceiro capítulo, o autor aborda a ludicidade jovem, iniciando com uma discussão sobre a busca das sociedades em caracterizar a juventude como um momento biológico e cronológico, mas salienta que é mais adequado entender a juventude como uma complexidade variável, que se diferenciam por suas muitas maneiras de existir em diferentes espaços e tempos. “A idade biológica da adolescência termina, mas isso não significa que alguns traços característicos se ausentem em idades futuras.” (p.115).  Para o autor é essencial a existência de espaços públicos nas cidades que potencializem a identidade juvenil. O autor destaca que a identidade não é estática, que na realidade é um eu múltiplo que não é a mesma coisa, um processo de identização, de negociações entre as diferentes experiências de vida.

O capítulo 4, aborda a juventude como um desafio simbólico, apresenta que a complexa organização das cidades, faz com que os jovens enfrentem o desafio da definição e afirmação de si. Para o autor a juventude virou um modelo cultural (Peralva, 1997), para as outras gerações.

Segundo Carrano (2003), ainda existem pouco estudos que pretendem perceber como os jovens vivem e elaboram suas situações de vida. “Só recentemente vem ganhando certo volume o número de estudos voltados para a consideração dos próprios jovens e suas experiências, (...)” (p. 129). Ainda em relação às pesquisas sobre juventude, a dificuldade em se definir os contornos da juventude como objeto social, está no fato dos estudos associarem juventude com violência. Sobre o cotidiano dos jovens Carrano (2003) afirma que:

(...) pode ser mais caracterizado, entretanto, por inúmeras redes de interesses cotidianos com os grupos e redes de relações elaborando seus próprio estilos e pontos de vista. A procura pela realização pessoal também se coloca como um sucedâneo ao entusiasmo social que caracterizaram os anos da contracultura. (CARRANO, 2003, p. 133-134)

Sobre os jovens e o trabalho existe uma relação de ambivalência de desejo e desconfiança. Pois a realidade do trabalho precário, reserva para o jovem um vínculo entre trabalho e incerteza. No capítulo Tempo livre, lazer e sociabilidade o autor apresenta o lazer como um campo potencial de liberdade, essencial para a constituição das sociedades democráticas. Os fenômenos relacionados com o lazer, estão no centro dos processos de formação de subjetividade e valores sociais das sociedades atuais. Além de as atividades de lazer serem um espaço/tempo privilegiado de construção da identidade pessoal e coletiva.

O autor retoma a questão da violência e a juventude, ao falar sobre o tempo livre e a liberdade do lazer, ainda salienta que as atividades de lazer são atividades de tempo livre, mas nem todas de tempo livre podem ser de lazer. Nas atividades de lazer é possível a experimentação das múltiplas identidades necessárias ao convívio social.

Finaliza o capítulo trazendo a discussão de que as condições de ludicidade se apresentam alternativas, fazem escolhas, se efetivam relações e experimentam subjetividades. E é esse diálogo social que faz as práticas de lazer serem decisivas para a elaboração das identidades urbanas da juventude.

No último capítulo o autor, destaca a temática dos jovens radicais, que segundo ele as referências aos jovens radicais não são poucas, por estarem associados a esportes radicais e da música, em especial ao rock. Sobre o jovem rebelde o autor utiliza os estudos de Foracchi (1966), onde o autor discute que o jovem esperança e o jovem rebelde são criações do sistema e sancionados pela ciência, sendo vista por setores da esquerda revolucionária como uma válvula que mistificaria as tensões do sistema, marginalizando-as. Retomando a idéia de tempo livre e lazer, Carrano (2003) afirma que:

Nos diferentes conflitos sociais urbanos que contam com o envolvimento direto e majoritário da juventude é possível perceber uma nítida presença de grupos de identidades referidos a práticas culturais de tempo livre e lazer. Torna-se cada vez mais difícil estabelecer identidades de grupos que possam ser catalogados como unicamente políticos ou de contestação. Os jovens que estabelecem vínculos sociais, culturais e afetivos nos grupos de lazer também são aqueles que constituem a “reserva” política das mobilizações nos territórios das cidades.  (p. 148, grifo do autor)

As relações sociais dos jovens essencialmente se organizam em torno dos gostos, amizades, no divertimentos coletivos entre outros e as cidades seriam espaços de celebração, um contraponto de casa, lugar privilegiado do corpo no mundo (IBÁÑEZ, 1997). Ainda dentro da discussão dos grupos sociais e amizades dos jovens, o autor apresenta que a localização física e inserção dos sujeitos em alguma estrutura social afetam na constituição dos grupos sociais, não sendo apenas fruto da ação social e política das tribos autônomas. 

O autor finaliza o livro abordando a ideia de grupo de atitude compartilhada, sendo uma forma de perceber os múltiplos sentidos que conferem identidades às práticas culturais da juventude.

REFLEXÃO:

O livro “Juventudes e Cidades Educadoras” apresenta temáticas relevantes para a educação e pesquisas na área, pois apresenta a educação como práticas sociais e desconstrói a ideia de algo institucionalizado, inclusive o autor afirma que os conceitos de educação formal, informal e não formal, seriam rígidas demais para dar conta do processo social. E ao pensar a educação como práticas sociais, percebemos a cidade como espaços educativos.

As práticas sociais que ocorrem nas cidades incorporam-se ao conceito de educação, uma vez que compreendem em suas dinâmicas culturais próprias de realização, a formação de valores, a troca de saberes e, em última instância, a própria subjetividade. (CARRANO, 2003, p. 20)

Além disso, o autor apresenta no seu livro que as sociedades constroem estruturas simbólicas de fabricação de corpos e que a juventude seria uma construção social e histórica, evidenciado no conceito de corporicidade “com a expressão corporicidade entendo o processo instituído pelo conjunto das práticas humanas que se evidenciam em relações políticas de influência recíproca, entre os corpos/sujeitos e os complexos sociais urbanos que chamamos de cidades.” (p. 41). Assuntos que propiciam momentos de reflexões ao realizarmos a leitura do livro e ao pensarmos em pesquisas que envolvam a temática juventude.

Particularmente destacamos como muito significativo o capítulo cinco, onde o autor discute “Tempo livre, lazer e sociabilidades”, pelo fato do autor apresentar os momentos de lazer, como a experimentação das múltiplas identidades necessárias ao convívio social. Além disso, faço nesse momento relação com a minha pesquisa, pois Dayrell (2002) apresenta que a aderência dos jovens ao funk, está relacionada à própria condição juvenil, a falta de pré-requisitos, a atração pelo ritmo, mas o principal fator seria a alegria dos espaços.

Os lazeres são vividos pelos jovens como uma oportunidade de afrouxamento ou suspensão das tensões impostas pelos processos de regulação moral e da denominada educação civilizante. Nos momentos de lazer os jovens podem encontrar a oportunidade de concentração sobre si próprios e de interação não obrigatória com o grupo de amigos. (CARRANO, 2003, p. 140, grifo do autor)

Concluímos a presente resenha acreditando que o livro “Juventudes e Cidades Educadoras”, é uma leitura interessante para nós professores, para desconstruir conceitos e repensar a nossa prática como educadores. Creio que a leitura para os pesquisadores que estudam juventude, seja necessária também, pois o autor salienta alguns equívocos que ocorrem ao desenvolver pesquisas com jovens.

REFERÊNCIAS:

CARRANO, Paulo R. C. Juventudes e Cidades Educadoras. Petrópolis: Vozes, 2003.

DAYRELL, Juarez. O rap e o funk na socialização da juventude. Educação e Pesquisa, São Paulo, v.28, n.1, p. 117-136, jan./jun. 2002.

 


[1] Mestrando em Educação pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu da Universidade La Salle em Canoas/RS. Pertencente à Linha de Pesquisa "Culturas, Linguagens e Tecnologias na Educação". Pós-graduando do Curso de Especialização em Alfabetização e Letramento pela PUCRS. Possui graduação em Pedagogia - Séries Iniciais e Educação infantil pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (2012). Professor dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental na Prefeitura Municipal de Canoas. E-mail: deividdesouza@yahoo.com.br.

[2] Mestranda em Educação pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu da Universidade La Salle em Canoas/RS. Pertencente ao grupo NETE. Pós Graduada em Gestão Escolar (UFRGS), Recursos Humanos (FAPA), Administração de Empresas (FGV) e Orientação Educacional (UNINTER). Graduada em Pedagogia Multimeios e Informática Educativa pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (2005). E-mail: lilian.sab@gmail.com.

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