22/07/2014

Rubem Alves: “Colecionei muitos jeitos de ser escola”

“Ainda não me decidi se morreu, acabou. Estou mais para [o poeta Mario] Quintana: morrer que me importa, o importante é viver”, afirmou o escritor, professor e educador Rubem Alves, em entrevista a Gilberto Dimenstein em 2006.

 

De lá pra cá, viveu, escreveu até que em 19 de julho, a vida decidiu por ele e se acabou, deixando de importante o vivido. Padrinho da Associação Cidade Escola Aprendiz –  além de colunista do Portal Aprendiz -, escreveu “Aprendiz de mim – o bairro que virou escola”, um misto de autobiografia, poesia e reportagem sobre o histórico da instituição.

“O filósofo Rubem Alves foi um grande apoiador e também inspiração para a Cidade Escola Aprendiz. Em 2004 ele passou vários meses convivendo com a equipe e o resultado foi o belíssimo “Aprendiz de mim: o Bairro que Virou Escola”, relembra Helena Singer, diretora pedagógica da Associação Cidade Escola Aprendiz.  ”Depois deste encontro encantado/encantador, a colaboração não se encerrou. Rubem Alves participou de debates, tornou-se colunista do site Aprendiz, esteve sempre, de alguma forma, como grande fonte de reflexão e inspiração”, encerra.

Deixamos assim nosso adeus e separamos abaixo alguns trechos da obra “Aprendiz de mim”.

“Que lindo e simples resumo da tarefa da educação: plantar jardins, construir cidades-jardins, mudar o mundo, torná-lo belo e manso. Aprender construindo. Aprender fazendo. Para que as crianças possam brincar. Para que os adultos possam voltar a ser crianças. E espalhar sonhos, porque jardins, cidades e povos se fazem com sonhos (…)

(…) As lições estão escritas nos muros, ao ar livre. Muros são lugares públicos, democráticos. Impossível não vê-los, ao caminhar. Um artista que coloca a sua arte no muro está fazendo uma declaração de confiança nos passantes: “Eles amarão a minha arte e a preservarão.” Como se fosse um convite à paz. O muro está dizendo: “Estou desarmado”. (…)

(…) A história da educação, eu imagino, poderia ser dividida entre tentativas para consertar, melhorar, modernizar esse modelo. E tentativas inspiradas na velha sabedoria de que “não é possível colocar remendos de pano novo em tecido podre”, e por isso tratam de procurar um modelo novo. Muitos têm sonhado esse sonho. Ivan Illitch [ educador, 1926-2002 ], creio que na década de 70, chegou a sugerir que as escolas fossem totalmente abolidas e substituídas por algo semelhante a um supermercado de saberes, abertas a todos os que quisessem aprender.

Aí aparece o Bairro-Escola Aprendiz. Não se trata de costurar um remendo de pano novo em tecido podre. Sua proposta: que o espaço-tempo da aprendizagem seja o espaço-tempo das ruas do bairro – porque é ali que a vida acontece. Praças, ateliês, oficinas, danceterias, cinemas, livrarias, cafés – todos esses são espaços de aprendizagem. Ali se encontram os mestres, ali se encontram os aprendizes.

É comum dizer-se que a função das escolas é preparar as crianças e os adolescentes para a vida. Como se a vida fosse algo que irá acontecer em algum ponto do futuro, depois da formatura, depois de entrar no mercado do trabalho. Mas a vida não acontece no futuro. Ela só acontece no aqui e no agora. Viver é aprender. É nisso que está a excitação do viver. Caso contrário, a vida é um tédio insuportável. A aprendizagem só pode acontecer no espaço-tempo em que a vida está sendo vivida. (…)

Colecionei muitos jeitos de ser escola. Mas foi então que me contaram de um bairro que se transformara numa escola. (…) Na minha coleção não se encontrava nada semelhante. Perguntei-me: como pode isso ser? Explicaram-me mas não entendi. Foi preciso que eu fosse lá, na rua Belmiro Braga, na Vila Madalena e visse o projeto Cidade Escola Aprendiz”.

Fonte: Portal Aprendiz

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