05/07/2016

SINPASES.

Dênio Mágno da Cunha*

Decidi que hoje  neste texto aconteceriam sinapses. A primeira ação foi procurar o significado de sinapse, obviamente. Depois de explicações do processo e tudo o mais que acompanha as explicações científicas fiquei com a última frase: “Disso é feito o funcionamento do cérebro: da transmissão constante de sinais elétricos e químicos de um lado para outro. O que você faz, pensa ou sente a cada instante depende de quais neurônios estão mais ou menos ativos a cada instante”. Leigamente falando, sem sinapse, sem transmissão de impulsos elétricos, nada é feito.

Aqui, farei a sinapse de pensamentos diferentes, distantes entre si mas que no final serão reunidos como que movidos por impulsos elétricos.

Há um filme: Madadayo, dirigido por Akira Kurosawa. A história, com “H”, narra o relacionamento entre alunos e professores no Japão em plena Segunda Guerra Mundial. O professor após 32 anos de sala de aula, de formar gerações, decide parar e viver de escrever seus livros, que estão naquele momento fazendo sucesso. Seus alunos, que o reverenciam como se ele fosse “ouro puro”, não deixam de com ele conviver ajudando-o na nova vida e em momentos futuros que se revelaram difíceis. Madadayo é uma oportunidade de reflexão sobre a relação entre professores e alunos.

Há um livro: “O Artificie”, escrito por Richard Sennet, sobre o qual tenho me referido várias vezes. Nele se louva o trabalho dos artesãos, peça a peça, num desenho lógico, que encanta a todos desde tempos imemoriais. Oposição à produção em massa, às vezes descuidada. O Artifície fala da relação entre mestre e aprendiz, na formação de gerações de profissionais dedicados à arte do artesanato. Mas não somente isto, fala da qualidade do ensino-aprendizagem que deve se sobrepor a qualquer outro fator, na educação.

Há uma palavra: profissionalização. Utilizada a torto e à direita significa que os processos aos quais é aplicada, devem ter a excelência que só a repetição cotidiana pode garantir. Melhoria contínua. Profissionalização significa também ser profissional em oposição direta a ser emocional. É razão pura aplicada à gestão de qualquer organização, industrial, comercial, social, estatal, incluída ai aquela a qual nos referimos sempre, a organização educacional. Ser profissional significa seguir códigos, regras, procedimentos em busca da qualidade de produtos e serviços. Ser profissional é qualidade daqueles que sabem lidar com as variáveis e variações do que é humano nas organizações, reduzindo a possibilidade de falhas. Nas organizações altamente profissionalizadas não há espaço para emoções.

A Sinapse.

Nesta semana assisti a uma cerimônia de passagem. Um amigo, depois de (coincidência ou não) 32 anos em uma escola, despediu-se das aulas regulares. Madadayo. Reduzirá sua ação acadêmica por motivos que lhe são caros. A instituição à qual ele pertence, contrariando a máxima da profissionalização, ofereceu-lhe uma homenagem cheia de sentimento e emoções. Estavam lá o Reitor, Diretores, Professores, Alunos, Parentes, Amigos. Todos em volta do professor a prestar-lhe a justa homenagem pelos anos e anos dedicados à formação de gerações. Emocionados, todos demonstraram a gratidão, a admiração, o respeito. Fizeram reverência.

Tendo a honra de ter convivido com o Professor, durante alguns anos dentre estes trinta e dois, não pude deixar de relacioná-lo ao “O Artificie”. Mestre, presenciei várias vezes a dedicação fora da sala de aula, atendendo aos alunos em suas dúvidas e dificuldades; dando oportunidades de refazerem o aprendizado, esclarecendo, repetindo quantas vezes fosse necessário. Lembro-me de uma certa vez em que ele me consultou sobre vir à escola em dia não letivo para dar aula a uma aluna, para ajudá-la em determinado assunto. Contrário a todo e qualquer princípio da profissionalização, em acordo total com o princípio do artesanato. Em outra oportunidade, me pediu que entregasse à minha filha, que nem aluna dele era, um material para estudo. Ainda de outra feita, cedeu seu material de aula para que eu pudesse transmitir o conhecimento a outros alunos, dos quais seria eu o professor. Generosidade de quem sabe.

No momento em que muitos de nós somos chamados à profissionalização da profissão de professor, vale a pena a reflexão destes temas aqui reunidos numa sinapse só possível graças à inspiração do amigo que se despede da Academia. Momento ideal para refletirmos sobre nosso papel na sociedade e sobre como estamos conduzindo nossos alunos em sala de aula.

Por outro lado, é também momento para que alunos reflitam sobre o significado da sala de aula em suas vidas.

Até a próxima.

Madadayo: https://www.youtube.com/watch?v=0dzGKzaylxI

* Professor em Carta Consulta e Una/Unatec. Doutorando Universidade de Sorocaba. Acredita na relação Mestre-Aprendiz e escreveu este texto em reverência ao Professor Osvaldo Castanheira. 

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