25/07/2018

Sistema de Atenção Especializada e seu Funcionamento

SISTEMA DE ATENÇÃO ESPECIALIZADA E SEU FUNCIONAMENTO

 

LUIZ HENRIQUE PIMENTA QUINTELA

 

1 INTRODUÇÃO

A organização do Sistema Único de Saúde (SUS) se dá através de uma rede de serviços encadeados de forma a suprir as necessidades da população. Frente ao tamanho do território nacional, e as divergências regionais, esta rede é dividida de forma regionalizada e hierarquizada, o que facilita o entendimento dos problemas de cada área, favorecendo a implantação de ações com vista a sanar estas deficiências.

A princípio, os usuários desta rede devem procurar a Atenção Primária, onde se podem encontrar profissionais qualificados para resolver as principais demandas de serviços de saúde da população. Os problemas não resolvidos neste nível, serão encaminhados para o serviço especializado, ambulatoriais ou hospitalares. Para este trabalho, iremos focar os serviços de Atenção Especializada.

Segundo Merhy (1997, apud SOLLA & CHIORO, 2008, p. 4), “os serviços de atenção especializada são espaços de saber-fazeres profissionais, onde se concretiza o encontro das tecnologias leves e leves-duras ofertadas sobre a infra-estrutura tecnológica dura”.

Diante do exposto, serão enfatizados os serviços da Rede de Atenção Especializada presente no Estado de Sergipe, com o objetivo de esclarecer o funcionamento e entrelaçamento da malha que faz parte o Sistema Único de Saúde, com vista a relacionar o que rege as diretrizes e o que efetivamente acontece nas unidades de atendimento.

 

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

O Sistema Único de Saúde (SUS) está voltado para uma máxima constante na Carta Magna de 1988 onde consta que “a saúde é direito de todos e dever do Estado”. Diante disto, foi-se elaborada uma lógica de organização escalonada, como mostra a figura 1 abaixo:

 

Figura 01 – Hierarquização e regionalização do SUS.

Fonte: Solla & Chioro (2008, p. 2).

O atendimento deve-se dar, primeiramente, pela Atenção Básica, que resolve mais de 80% dos problemas de saúde encontrados na população. O Ministério da Saúde (2009, p. 8) caracteriza este nível de atenção como:

um conjunto de ações de saúde, nos âmbitos individual e coletivo, que abrange a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde - ações que devem ser desenvolvidas por meio do exercício de práticas gerenciais e sanitárias democráticas e participativas, sob forma de trabalho em equipe, e dirigidas a populações de territórios bem delimitados, pelas quais assume a responsabilidade sanitária, considerando a dinamicidade existente nos lugares em que vivem essas populações.

Somente os problemas não sanados na Atenção Básica é que deve ser encaminhada para uma instância superior, que pode ser serviço especializado, ambulatoriais ou hospitalares, esta medida faz com que se tenha uma racionalização no uso dos serviços ambulatoriais especializados e hospitalares de maior complexidade tecnológica, minimizando os custos com a saúde.

Os serviços de Atenção Especializada, é responsável pelo atendimento de cerca de 15% dos problemas de saúde. Como a quase totalidade do processo de trabalho em saúde pressupõe a interação entre o usuário e o profissional da saúde que irá prestar os cuidados necessários, na rede básica os serviços ‘vão’ até os usuários. Já na atenção especializada deve-se dar o inverso: os usuários se deslocam até os espaços onde será realizada a produção do cuidado em saúde (SOLLA & CHIORO, 2008, p. 5). Para a especializada, a sua população é restrita àquela que necessita de cuidados diferenciados ou ainda mais intensivos. Diante disto é que podemos ressaltar a importância da Hierarquização e Regionalização, posto que com adoção deste regime é possível a racionalização do atendimento, garantindo a todos os usuários os procedimentos necessários para suprir suas necessidades com maior agilidade possível e um menor custo.

A Atenção Especializada compreende um conjunto de ações e serviços de saúde realizados em ambiente ambulatorial, que incorporam a utilização de equipamentos médico-hospitalares e profissionais especializados para a produção do cuidado em média e alta complexidade. Essa atenção contempla cirurgias ambulatoriais, procedimentos traumato-ortopédicos, ações especializadas em odontologia, patologia clínica, anatomopatologia e citopatologia, radiodiagnóstico, exames de ultrassonografia, diagnose, fisioterapia, terapias especializadas, próteses e órteses. Na tabela 01 abaixo podemos destacar os principais grupos de serviços de apoio diagnostico terapêutico disponibilizado pelo SUS.

Tabela 01 – Principais grupos de Serviço de Apoio Diagnóstico e Terapêutico do SUS.

Fonte: Solla & Chioro (2008, p. 7).

Para um bom funcionamento desta rede de atenção, faz-se necessária uma interação, relacionando os diversos focos em um mesmo sistema de saúde, proporcionando o sequenciamento da atenção aos usuários do sistema e a integridade do cuidado a ser prestado. Ressaltando que este processo inicia-se pela atenção básica, por onde se ordena os fluxos e contra-fluxos do sistema. Diante deste processo, percebemos uma melhoria da qualidade da atenção, aumento da eficiência do sistema com uma redução de custos.

A Política Nacional de Humanização (PNH) desenvolveu diretrizes norteadoras que regem o método de inclusão de gestores, trabalhadores e usuários na produção de saúde, a saber: Acolhimento, Visita Aberta, Clínica Ampliada, Ambiência, Saúde do Trabalhador, Redes de Atenção, Gestão participativa e Co-gestão. Para este trabalho, nosso foco foi Acolhimento, Clínica Ampliada e Ambiência, os quais detalharemos abaixo.

A busca por um acolhimento mais humanizado, ou seja, não devendo estar restrita à recepção dos usuários, mas também ser perpassadas por outras diretrizes que em conjunto irá encarar o usuário em sua plenitude. Este é um ponto de grande dificuldade, principalmente nos serviços de saúde, pois o acolhimento é mais que só “estar junto”, é uma potencialização deste encontro, fazendo-se compromissado com o reconhecimento do outro em sua plenitude.

Quanto à clínica ampliada, para PNH trata-se da ampliação da inter-relação entre os diferentes ramos de saberes em prol de uma atenção mais resolutiva, voltado a aumentar a autonomia de todos que compõem o serviço de saúde, bem como a integração da equipe multiprofissional da saúde, integrando diversas ciências, na busca de um melhor tratamento para cada paciente, respeitando suas especificidades, necessidades. Para isto é necessário que se faça a escuta de cada caso, pois está definirá como tratar deste paciente, ou seja, o usuário será ouvido e o profissional do Centro irá ter uma ideia mais holística de todo o problema, podendo entender melhor sua complexidade, o que auxiliará na tomada do meio mais adequado de sana-lo.

Já a ambiência, diz respeito ao espaço físico, social, profissional e de relações interpessoais que propiciam a humanização dentro das instituições de saúde, oferecendo saúde e acolhimento, não só para os usuários e acompanhantes, mas para os trabalhadores e todos os que estiverem envolvidos neste processo. Esta diretriz possui três bases norteadoras, a saber, confortabilidade, propiciando um ambiente com a iluminação e temperatura satisfatórias, livre de agentes nocivos, garantindo também a privacidade. Espaço facilitador do processo de trabalho possibilitando boa funcionalidade, flexibilidade e segurança para todos. E por fim, a ambiência envolvendo todos os membros da unidade de saúde, desencadeando na construção de novas situações nas relações de trabalho e convivência.

 

3 TRABALHO DE CAMPO

O trabalho de campo se deu em visitas a duas instituições de atenção especializadas do Estado de Sergipe, a saber: CASE – Centro de Atenção à Saúde de Sergipe e CEMAR – Centro de Especialidades Médicas de Aracaju. Nestas visitas pudemos conhecer mais detalhadamente e de um prisma prático, como se dá o trabalho da Atenção Especializada no Sistema Único de Saúde.

3.1 CASE - Centro de Atenção à Saúde de Sergipe

O Centro de Atenção à Saúde de Sergipe (CASE) trata-se de uma instituição governamental que oferece aos usuários do SUS acesso às tecnologias de alto custo, a exemplo de órteses, próteses, meios de locomoção auxiliares e remédios para o tratamento de patologias crônicas.

Sua missão, de acordo com a Secretaria do Estado da Saúde (2014), é produzir ações estratégicas para garantir o acesso às tecnologias de alto custo, de maneira universal, equânime, integral e humanizada às pessoas que vivem deficiência e/ou necessidades especiais e patologias crônicas, embasadas nas Portarias do Ministério da Saúde e Secretaria de Assistência à Saúde.

O CASE possui 23 mil usuários cadastrados no sistema e sua estrutura física dispõe de uma área de 1300 m². Estes pontos são importantes, pois o número de usuários só tem aumentado, de outubro de 2013 para janeiro de 2014 foram registrados mais de 3000 usuários, isto pode ser explicado pela mudança física ocorrida neste período, pois atualmente ele se localiza em um ponto de fácil acesso, próximo ao Hospital de Urgências de Sergipe e da Rodoviária.

Neste Centro são dispensados 309 tipos de medicamentos destinados à atenção especializada, que contempla insumos farmacêuticos indicados para o tratamento de patologias crônicas e degenerativas, dentro das diversas especialidades médicas contempladas na Portaria nº 2.577/2006 e nos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas. Além disto, dispõe de órteses, próteses e meios auxiliares de locomoção destinados aos usuários que vivem com deficiência, este programa fornece aparelhos auditivos, braços e pernas mecânicas, próteses oculares, bolsas de colostomia, cadeiras de roda, andadores, bengalas e muletas, entre outros, cuja concessão é normatizada e operacionalizada através das Portarias nº 818 e 1060. Outra inovação implantada em 1999 foi o tratamento fora do domicílio que garante aos pacientes, atendimento médico-hospitalar em unidades de saúde de outros Estados quando esgotados todos os meios de tratamento em Sergipe, desde que haja possibilidade de cura total ou parcial. O serviço está fundamentado conforme a Portaria nº 55/1999.

Este serviço está disponível para toda a população, onde o fluxograma do atendimento está ilustrado conforme a figura 02.

Figura 02 – Fluxograma de atendimento do CASE.

Fonte: Pesquisa de campo (2014)

Ao chegar no CASE, uma equipe está pronta para acolhimento, esta equipe é composta pelos atendentes, psicóloga e assistente social. Nesta fase, o usuário deve estar portando cópias de RG, CPF, comprovante de residência, cartão SUS, receita médica e laudo de solicitação excepcional preenchido pelo médico. Com estes documentos é efetuado o cadastro e agendada a Perícia com no máximo dez dias, que consta de um parecer da junta médica da instituição, que vai deferir o pedido ou não, conforme regulamentação legal. Sendo deferida a solicitação, no mesmo dia o paciente poderá recolher seus medicamentos e também terá as instruções de uma equipe de farmacêuticos que irá informar a melhor forma de utilizar o medicamento.

 

3.2 CEMAR – Centro de Especialidades Médicas de Aracaju

Inaugurado em 2004, o CEMAR é mantido pela Secretaria Municipal da Saúde da Prefeitura de Aracaju, é composto por mais de 60 profissionais, sendo responsável pelo atendimento de 405.883 pessoas, entre janeiro e julho de 2009, os serviços englobam exames, consultas, cirurgias, diagnósticos por testes rápidos, procedimentos de fisioterapia e reabilitação, tratamento odontológico e por acupuntura, eletrocardiogramas e doppler do sistema circulatório.

Para fazer uso dos seus serviços, o usuário é encaminhado inicialmente pelos profissionais que atuam nas Unidades de Saúde da Família (USFs), pois estas são a porta de entrada para o SUS. Este encaminhamento só se dá no caso de pacientes que necessitem de uma atenção mais especializada. Dentre as 17 especialidades médicas disponíveis, as mais procuradas podemos citar os exames laboratoriais, setores de cardiologia, endocrinologia e fisioterapia, além do atendimento, testagem e acompanhamento da AIDS.

 

4 CONCLUSÕES

A importância da rede de atenção que compõe o SUS vem suprindo às necessidades da população, entretanto a demanda tem sido crescente, e em alguns pontos podem ser percebidos como deficitários.

Um dos pontos mais carentes e criticados foi o acolhimento, que se mostrou aquém do ideal, pois mesmo que pudéssemos encontrar psicólogos ou assistentes sociais à frente desta atividade, estes não executavam o papel de escuta em sua plenitude, até mesmo pela quantidade de usuários que compareciam aos Centros, que giravam em torno de 700 pessoas. Esta realidade não se restringe ao CASE ou CEMAR, mas se estende para as USFs e Hospitais, como debatido em classe.

A ambiência é um dos pontos que vem se destacando, pois o CASE, por exemplo, deixou de funcionar em um ambiente com 700m² para funcionar em um ponto estratégico, próximo a Rodoviária e HUSE, além do Centro de Referência da Mulher, dispondo hoje de um novo ambiente com 1300m², que comporta melhor a demanda, com uma estrutura mais acessível, com corrimãos e rampas de acesso, o que era um gargalo em sua ultima estrutura. A questão da ambiência também pode ser percebida como em processo de melhoria continuada nos USFs, corroborando com a realidade da atenção especializada, posto que sua nova estrutura é recente, datada de outubro de 2013.

Frente a crescente procura pelos serviços dos serviços prestados pelo SUS, ainda podemos perceber uma insuficiência de trabalhadores nos pontos de atendimento, que mesmo com o crescimento quadriplicado do número de usuários, o seu quadro de pessoal permanece praticamente o mesmo. Defasagem esta, que pode ser percebido tanto no CASE, que dispõe de apenas um psicólogo, quanto nas USFs, a exemplo da USF José Quintilhiano, que não dispõe de psicólogo.

A relação da atenção primária com a secundária pode se ver de forma melhorada, posto que a busca pela melhoria continuada tem resultado em ações que minimizam falhas no fluxograma de toda a rede. No CASE, anteriormente, percebíamos pessoas que compunham seu corpo trabalhista fazendo papel de “preposto” para entrega de medicamentos, sendo isto desenvolvido de forma não registrada, quando um parente ou vizinho necessitava do medicamento. Hoje, com o sistema Horus, este tipo de desvio já não é mais possível, além de atrelar à obrigatoriedade da apresentação de um encaminhamento da atenção básica, sendo esta a porta de entrada para o SUS.

Mesmo diante das dificuldades encontradas no contexto da saúde no Brasil, e neste caso Sergipe, podemos ressaltar que o SUS tem buscado atender as demandas, mesmo cientes de que a saúde é dever do Estado, para atingir a maximização dos resultados trabalhadores, gestores e usuários devem voltar-se para a construção de uma Saúde Pública de qualidade, de forma eficiente e eficaz.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão do SUS. O HumanizaSUS na atenção básica. Brasília: Ministério da Saúde, 2009.

______. Ministério da Saúde.  Acolhimento nas práticas de produção de saúde. 2. ed. Brasília, 2006.

______. Ministério da Saúde. Cartilha Ambiência. 2. ed. Brasília, 2006.

______. Ministério da Saúde. Clínica Ampliada, Equipe de Referência e Projeto Terapêutico Singular. 2. ed. Brasília, 2007.

______. Ministério da Saúde. HumanizaSUS: documento base para gestores e trabalhadores do SUS. 4. ed. Brasília, 2008

SOLLA, Jorge; CHIORO, Arthur. Atenção ambulatorial especializada. In: GIOVANELLA, Lígia, et al (Org). Políticas e sistemas de saúde no Brasil. Rio de Janeiro:Fiocruz, 2008.

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