29/10/2020

Vida Emocional do Feto e as Fisiopatologias Associadas

VIDA EMOCIONAL DO FETO E AS FISIOPATOLOGIAS ASSOCIADAS

Rafaela Canassa - Miriam de Magalhaes Oliveira Levada

FUNDAÇÃO HERMÍNIO OMETTO - UNIARARAS

INTRODUÇÃO

O estudo do psiquismo fetal, realizado de maneira sistemática e científica, é recente. Foi somente com o avanço das técnicas de diagnóstico pré-natal, principalmente da ultrassonografia na década de 70, que se pôde ter acesso direto ao feto, possibilitando estudos precisos de seu comportamento no meio intrauterino (Quayle, 2011).

Até bem pouco tempo, acreditava-se que o Psiquismo Humano entrava em funcionamento no instante em que ocorria o nascimento, no momento da cesura do cordão umbilical, quando o bebê perdia a segurança uterina e tinha que procurar oxigênio e alimento de forma independente. Contudo, com o advento da ultrassonografia e da ecografia, pôde-se observar que não apenas o trauma do nascimento marca inconscientemente o indivíduo, mas também o modo como o feto percebe suas experiências pré-natais, confirmando-se a frase de Freud: “Há uma continuidade muito maior entre a primeira infância e a vida intrauterina do que a impressionante cesura do ato do nascimento nos permite supor” (Freud, 1926/1976, p.162).

A vida psíquica é uma continuidade da vida intrauterina. Atualmente, entende-se que o feto é possuidor de sensações, percepções, sensibilidade e traços rudimentares de personalidade. Todas as vivências pelas quais passa o ser no período pré-natal irão fazer parte de sua bagagem inconsciente, exercendo influência tanto sobre a personalidade pós-natal como sobre sua conduta e seu comportamento, influenciando no desenvolvimento bioevolutivo e psicoafetivo do indivíduo.

As atividades executadas pelo feto não são aleatórias, possuem um objetivo, exemplo: realizam movimentos para desenvolver as articulações e os ossos. Desta forma, seu período dentro do útero é marcado por diversas interações feto-mãe, feto-meio, tais como: o feto escuta a voz materna e paterna, os sons internos e viscerais da mãe (batimentos cardíacos, digestão), a sonoridade do mundo externo que chega um pouco abafada.É pelo cordão umbilical que surge a inter-relação física e emocional entre mãe e filho, portanto os primeiros contatos com o meio externo são através das reações emocionais da mãe (devido ao que ela pensa, sente e vivencia). Com isso, alterações neurais, hormonais e humorais da mãe, são levadas ao feto pelo cordão umbilical agindo diretamente no seu estado emocional, registrando assim marcas em seu psiquismo. Se o feto encontra-se em contínuo e profundo sofrimento, este envia uma mensagem avisando a mãe que, não podendo suportar por mais tempo, vai ser necessária a separação, podendo determinar um final mais conturbado da gravidez: aborto ou nascimento prematuro.

De acordo com Souza-Dias em Considerações sobre o psiquismo do feto (1996, p.116):

“As investigações feitas através das observações ultrassonográficas mostram-nos que fator de importante interferência na vida fetal é o stress da gestante, poderoso estímulo desencadeante de sofrimento fetal. A sua intensidade e a sua duração, se crônico ou agudo, são fatores que marcam profundamente o feto e o predispõem a angústias já na vida prénatal e que podem reaparecer na vida pós-natal”.

Angústia, ansiedade da gestante, dependendo da intensidade ou mesmo traumas emocionais ou stress, crônico ou agudo, podem desencadear sofrimento fetal, marcando-o profundamente, acarretando problemas orgânicos e psíquicos, decrescendo até o desenvolvimento físico. Apesar de não haver ligação direta entre o Sistema Nervoso da mãe com o do feto, emoções como ira, medo e ansiedade fazem o sistema nervoso autônomo materno liberar certas substâncias químicas (ex.: adrenalina), na corrente sanguínea, alterando a composição do sangue, que, ao atravessar a placenta, modificam a bioquímica do ambiente dentro do útero. Um exemplo experimental: níveis elevados de norepinefrina em recém-nascidos de mães com depressão na gestação de classe social menos favorecida foi observado em um estudo nos Estados Unidos da América (Field et al, 2002), bem como elevação do cortisol e norepinefrina e diminuição de dopamina neonatal em outra pesquisa no mesmo país (Lundy et al, 1999). Na busca do alívio das tensões, o feto desenvolve mecanismos psíquicos de defesa movimentando-se hiperativamente, reações parecidas com o choro de um recém-nascido, por exemplo. Caso a situação seja crônica, o feto substitui o mecanismo de defesa, que já não serve para aliviar a tensão, pela diminuição das atividades motoras (hipoatividade) – podendo chegar à imobilidade- , dos batimentos cardíacos e possibilidade de depressão e de decréscimo de energia vital. Em casos de depressão fetal ou de sofrimento fetal agudo, destacam-se importantes Fisiopatologias causadoras de asfixia, sendo algumas delas: diminuição da pO2 no sangue (hipoxemia), diminuição do pO2 nos tecidos (hipóxia), diminuição do pH (acidose). Especificamente, no caso do O2, como possíveis causas, destacam-se: aporte materno deficiente, dificuldade na troca gasosa, aumento da demanda fetal e incapacidade fetal de transportar o gás.  Dentre os casos de problemas emocionais durante a gestação, destaca-se o do sono. Normalmente, o feto, nos momentos de sono, permanece imóvel e nos de vigília, produz muitos movimentos corporais. Todavia, em uma situação que lhe aparente risco, o sono torna-se um momento de desligamento para se encontrar refúgio ou um mergulho para se fugir da situação dolorosa.

Resultado experimental

As pesquisas sobre o desenvolvimento de crianças expostas à depressão perinatal surgem a partir de um conjunto de trabalhos que consideram o contexto mais amplo no qual a depressão perinatal está inserida. Os pesquisadores centralizaram suas questões nos efeitos da depressão pré-natal ou da depressão pós-parto sobre o bebê e seu desenvolvimento posterior, sendo que poucos analisaram os efeitos combinados dos dois tipos de depressão. Entre as questões essenciais abordadas estão: (a) efeitos da exposição pré-natal, pós-parto ou dupla sobre o bebê e seu desenvolvimento posterior; (b) principais mecanismos ou mediadores que ajudam a explicar tais efeitos; (c) moderadores dessas associações. O resultado foi o de que a depressão pré-natal está associada com a regulação do comportamento neurológico de recém-nascidos, inclusive sua capacidade de prestar atenção a estímulos visuais e auditivos e seu estado geral de alerta, conforme avaliações feitas  pela Neonatal Behavioral Assessment Scale (Escala de Avaliação de Comportamento Neonatal). Outros resultados adversos observados nos recém-nascidos avaliados são: níveis mais altos de nervosismo/choro e maior incidência de problemas relacionados ao sono (que persistem dos 18 aos 30 meses de idade); maior assimetria no traçado do eletroencefalograma (EEG) na região frontal; níveis mais altos de cortisol e níveis mais baixos de dopamina, e tom vagal mais baixo.

Conclusão

A qualidade do vínculo entre os parceiros, no momento da concepção e durante a gravidez, é fundamental para o equilíbrio da relação mãe-bebê, pois o feto consegue captar os estados afetivos maternos.

Caso a mãe esteja passando por um momento de crise ou esteja inserida em um ambiente hostil à gestação, é de suma importância que a mesma procure um acompanhamento psicológico para ser acolhida e para conseguir expressar as suas angústias e ansiedades, beneficiando o estado emocional e físico do bebê.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Quayle, J. (2011). Emoções compartilhadas. Coleção A Mente do Bebê - Revista Mente e Cérebro, 1(3), 34-41.

Souza-Dias, T. G. (1996). Considerações sobre o psiquismo do feto. São Paulo: Escuta.

Azevedo, E.C.; Moreira, M.C. Psiquismo fetal: um olhar psicanalítico Fetal. Revista da Sociedade de Psicologia do Rio Grande do Sul. Rio Grande do Sul: Ago/Dez. Disponível em: <file:///C:/Users/racan/AppData/Local/Packages/Microsoft.MicrosoftEdge_8wekyb3d8bbwe/TempState/Downloads/73-292-1-PB.pdf>. Acesso em: 21 de maio 2018.

Field T, Diego M, Hernandez-Reif M, Schanberg S, Kuhn C, Yando R, Bendell D. Prenatal. Depression effects on the foetus and neonate in different ethnic and socio-economic status groups. J Reprod Infant Psychol 2002;20(3):149-57.

Lundy BL, Jones NA, Field T, Nearing G, Davalos M, Pietro PA, Schanberg S, Kuhn C. Prenatal depression effects on neonates. Infant Behav Dev 1999;22 (1):119-29.

LIMA, Marlise De Oliveira Pimentel; TSUNECHIRO, Maria Alice. Repercussões materno-fetais da depressão na gravidez: uma revisão sistemática. O MundO da Saúde, Sao paulo, p. 530-536, jun. 20. Disponível em: <https://www.saocamilo-sp.br/pdf/mundo_saude/65/15_Repercussoes_baixa.pdf>. Acesso em: 22 mai. 2018.

SILVA, Ana Maria Morateli Da. A vida emocional do feto. Guia do bebê, Cidade, p.111-222, 2./mai. 2018. Disponível em: <http://www.guiadobebe.com.br/a-vida-emocional-do-feto/#tp>.Acesso em: 22 mai. 2018.

Goodman SH, Rouse MH. Depressão perinatal e a criança: uma perspectiva desenvolvimentista. Em: Tremblay RE, Boivin M, Peters RDeV, eds. Enciclopédia sobre o Desenvolvimento na Primeira Infância. Disponível em: <http://www.enciclopedia-crianca.com/depressao-materna/segundo-especialistas/depressao-perinatal-e-crianca-uma-perspectiva>. Publicado: Fevereiro 2010 (Inglês). Acesso em: 22 mai. 2018.

 

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