19/11/2018

A Subnotificação de Doenças e Agravo à Saúde dos Profissionais da Educação: uma análise do caso do magistério público do Distrito Federal

Antonio Gomes da Costa Neto

Mestre em Educação; Doutorando em Ciências Sociais UnB

 

 

RESUMO

O artigo versa sobre a subnotificação de doenças e agravos à saúde nos casos de Lesões Por Esforços Repetitivos/Distúrbio Osteomuscular relacionado ao trabalho - LER/DORT e Transtornos Mentais em Profissionais da Educação do Distrito Federal. Método. Foi realizado por meio de pesquisa exploratória no sistema Vigilância do Ministério da Saúde, da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, observados a partir de dados de Auditoria realizada pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal. Resultados. Verifica-se a diferença entre os dados informados no Sistema de Vigilância Sentinela do Ministério da Saúde e Distrital, bem como do órgão de controle externo.  Conclusão. Constatado a existência de subnotificação de acometimentos de doenças laborais em Profissionais da Educação – docentes – do Distrito Federal, gerando violação do direito à saúde, do cidadão, e a qualidade da Educação, cujo principal resultado é a ausência de monitoramento e risco de agravo à saúde do trabalhador.

 

Palavras-chave: Educação; Doenças Profissionais; Subnotificação.

 

INTRODUÇÃO

O artigo versa sobre a subnotificação de doenças e agravo na saúde dos trabalhadores do ensino, quando observados os dados dos órgãos de controle externo (controle governamental) e fiscalização da saúde do trabalhador (sentinela), a partir da análise de informações recolhidas do acometimento de Agravos dos Profissionais da Educação do Magistério Público do Distrito Federal publicizado em 2016.

Tem como objetivo discutir a subnotificação de Agravo a Saúde dos Trabalhadores no sistema educacional do Distrito Federal, em relação àquelas verificadas no período de 2013 em relação às Doenças do Sistema Osteomuscular e Tecido Conjuntivo e Transtornos Mentais coletados a partir de informações em Auditoria Operacional realizada Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF - Processo 1130/2014), bem como da estratégia de vigilância Sentinela.

De acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU, 2010, p. 11) Auditoria Operacional “é o exame independente e objetivo da economicidade, eficiência, eficácia e efetividade de organizações, programas e atividades governamentais, com a finalidade de promover o aperfeiçoamento da gestão pública”, portanto, o órgão de controle externo distrital buscou verificar o corpo funcional dos operadores de ensino da rede pública.

Conforme dispõe o regulamento do Ministério da Saúde (Portaria n. 205/2016) tanto LER/DORT e Transtornos Mentais quando relacionados ao trabalho devem ter sua notificação compulsória ao sistema de vigilância em unidade sentinela, logo, acometimentos à saúde do trabalhador que devem ser inseridos no sistema de monitoramento e acompanhamento como doenças profissionais ou acidentes de trabalho.

Segundo o Protocolo (SAÚDE, 2012), as lesões por esforços repetitivos quando relacionadas ao trabalho, têm implicações legais, seu reconhecimento é regido por legislação desde 2004 e “abrangem quadros clínicos do sistema musculoesquelético adquiridos pelo trabalhador submetido a determinadas condições de trabalho” (idem, p. 10).

Andrade e Dantas (2014) asseveram que o trabalho desempenha como importante causa no desenvolvimento de transtornos mentais, especialmente, em distúrbios como “sono, licenças e afastamentos da atividade laboral por problemas psicopatológicos, transtornos depressivos e ansiosos e até ideacão suicida” (idem, p. 505).

Por sua vez o Decreto n. 6.957/2009 estabelece o rol de doenças consideradas relacionadas à saúde do trabalhador, ou seja, o “nexo entre o trabalho e o agravo quando se verificar nexo técnico epidemiológico entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade, elencada na Classificação Internacional de Doenças – CID” (BRASIL, 2009).

Justifica-se nossa análise em relação ao exercício de 2013, cujo resultado foi sido levado ao conhecimento público no ano de 2016, todavia, informações complementares sobre as doenças e as notificações de agravo da saúde do trabalhador foram extraídas do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF), Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (SESDF) e Ministério da Saúde (MS), com o fito de conhecer a realidade do objeto de nossa análise.

Bem como da extrema importância em razão do estatuído na Lei n. 6.259/1975, quando assevera o dever do Estado, Cidadão, Profissionais da Saúde e Ensino a obrigação de notificar os eventos de agravamento à saúde das quais estão inseridas no rol definido pelo Ministério da Saúde conforme propõe os programas de saúde em nível internacional e nacional.

Nesse tocante, versa o presente artigo sobre o Direito à Saúde, em especial, daqueles da área do ensino, quando observado a baixa notificação ao Sistema de Notificações Compulsórias pode refletir de forma significativa as condições laborais, bem com na melhora da oferta do ensino, além da necessidade do fiel cumprimento das políticas públicas da área de saúde.

MÉTODO

Trata-se de um estudo exploratório, por meio de análise de legislação governamental, documental, e informações de caráter público, tendo como principal mecanismo de coleta de dados a Lei de Acesso a Informação (LAI), em relação aos agravos acometidos ocorridos no período de 2013 e a coleta de material no período de 2013 a 2017.

Nossa análise circunscreve-se tão somente aos profissionais da educação integrantes do magistério público do Distrito Federal, ou seja, professores e orientadores educacionais amparados por regulamento próprio no Distrito Federal (Lei 5.105/2013), ou seja, em relação aos operadores do ensino (atividade-meio) excluídos os operadores da educação (atividade-fim).  

Em relação aos Orientadores Educacionais não integravam o magistério público distrital até o advento de lei (829/1994), essa ação foi contestada perante o Supremo Tribunal Federal (STF) por ADIN 3341, porém, perdeu seu objeto em razão de norma superveniente, ou seja, não implica que a ilegalidade tenha sido corrigida, apenas não existiu nenhuma outra contestação judicial tendo como mesmo argumento a irregularidade apontada na ação.

Os quantitativos de servidores ativos da educação pública do Distrito Federal são compostos de 41.262 servidores (DISTRITO FEDERAL, 2013), cuja força de trabalho está dividida entre duas Carreiras distintas, Magistério Público (Lei 5.105/2013 – Professores e Especialistas em Educação - Orientadores) e Técnicos Administrativos ou Assistência à Educação (Lei 5.106/2013 – Técnicos e Apoio Escolar), além de servidores cedidos e requisitados, esses últimos não foram objeto de análise pelo órgão de controle governamental.   

De acordo com a Auditoria, os dados de nossa análise se referem ao corpo funcional de 26.586 professores e 751 especialistas de educação, nesse ponto a Auditoria operou em apenas 66,8% da força de trabalho ativa em exercício no órgão público, já excluídos os 391 servidores na condição de cedidos, ou seja, sem exercício efetivo no órgão pesquisado em 2013, eis que seus acometimentos são registrados nos órgãos requisitantes.

Para a pesquisa selecionamos na Auditoria do TCDF as 03 (três) maiores causas de afastamento dos profissionais do magistério ao trabalho (TCDF, 2014 [2016]) a primeira são os Transtornos Mentais (53 tipos de CID), a segunda o acompanhamento de pessoa doente (apenas o CID Z76) e a terceira as doenças do Sistema Osteomuscular e Tecido Conjuntivo (71 Ttios de CID), conforme (Tabela 1).

Tabela 1- Total de Afastamento dos Profissionais do magistério público do Distrito Federal

CID

QTDE

Total de dias

Transtornos Mentais

7096

313621

Acompanhamento de pessoa doente

5176

27751

Doenças do Sistema Osteomuscular e Tecido Conjuntivo

4865

104020

TOTAL

17137

445392

Fonte: Auditoria Operacional TCDF - Processo 1130/2014 [2016]– PT 28

Nesse artigo trabalhar-se-á com os agravos Transtornos Mentais (1ª) e Doenças do Sistema Osteomuscular e Tecido Conjuntivo (3ª), eis que ambas na dicção do Decreto n. 6.957/2009 possuem relação ou nexo de agravo com o trabalho, utilizando-se do Código Internacional de Doença (CID) localizamos àquelas que figuram de forma igualitária na legislação e no relatório de Auditoria do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF).

Como foram produzidas para informação junto ao órgão de Controle externo (Tribunal de Contas) para aferição em Auditoria Operacional, as subcategorias estão incluídas nos valores totais, partimos da mesma premissa, logo, as subcategorias fazem parte para efeito de comparação com a legislação (Tabela 2).

A partir do Código Internacional das Doenças (CID) e a categoria das Doenças do Sistema Osteomuscular e do Tecido Conjunto, verificamos aquelas que figuram de forma conjunta no Decreto e na lista elaborada pelo órgão de Educação, incluída as subcategorias, chegando aos achados pelo CID (Tabela 2), quantidade de pedidos e o total de dias de afastamento, porém, dividimo-las para efeito de melhor compreensão de acordo com o Código Internacional de Doenças (CID).

Tabela 2 – Quantidade de Afastamentos pelo CID do Magistério Público em 2013 – LER/DORT

CID -TCDF

CID DECRETO

QTDE

Total Dias

M54

M54

1379

22070

M65

M65

670

10041

M75

M75

417

13716

M70

M70

26

319

M77

M77

139

2122

M19

M19

46

1639

M87

M87

1

15

TOTAL A - CATEGORIAS

2678

49922

M25

M25.5

447

6475

M79

M79.1

330

7451

M53

M53.1

206

4253

M72

M72.0

70

1262

M05

M05.3

30

1125

M10

M10.1

15

121

M93

M93.1 e M93.8

3

213

M89

M89.5

3

213

M83

M83.5

1

19

TOTAL B - SUBCATEGORIAS

1105

21132

TOTAL A + B

3783

71054

Fonte – Auditoria TCDF - Processo 1130/2014 [2016]- Decreto 6.957/2009

Em relação a LER/DORT àquelas que figuram como doenças profissionais de acordo com o Decreto 6.957/2009 e Portaria de Notificação Compulsória do Ministério da Saúde, a partir do Código Internacional de Doenças (CID) foram identificadas 07 (sete) ocorrências igualitários por categoria e 09 (nove) por subcategorias, de um total de 71 (setenta e um) situações de acometimentos.

Significa que em relação à quantidade por categoria correspondem a 55,04%, e por subcategoria a 22,71%, revelando que juntas são responsáveis por 77,75% daqueles que compõem os acometimentos com possível relação de causalidade com o trabalho, considerando constarem do Decreto e da Portaria do Ministério da Saúde, observando a existência de 4.865 ocorrências.

Em relação aos dias de afastamento do trabalho correspondem a 68,30% dos dados identificados, sendo que 47,99% são relacionados à categoria e o restante, 20,31% responde pela subcategoria, comparando com o total de 104.020 dias de afastamento.

Buscamos identificar em relação aos Transtornos Mentais, quando observado o Código Internacional de Doenças (CID), dos quais constam como afastamentos ao trabalho e figurava na lista enviada a Corte de Contas, presente na legislação (Decreto 6.6957/2009), incluindo categoria e subcategoria.

A partir do Código Internacional das Doenças (CID) em relação aos Transtornos Mentais àquelas que figuram de forma conjunta no Decreto e na lista elaborada pelo órgão de Educação, além de outras que constam da subcategoria, chegando aos seguintes achados pelo CID, quantidade de pedidos e o total de dias de afastamento (Tabela 3):

Tabela 3 – Quantidade de Afastamentos pelo CID do Magistério Público em 2013 – TRANSTORNOS MENTAIS

CID -TCDF

CID DECRETO

QTDE

Total Dias

F32

F32

2131

96104

F43

F43

856

32766

F06

F06

10

397

F07

F07

1

86

F09

F09

1

30

TOTAL A - PRINCIPAL

2999

129383

F10

F10.2

77

4795

F51

F51.2

12

121

F48

F48.0 e F48.8

6

239

TOTAL B - SUBCATEGORIAS

95

5155

TOTAL A + B

3094

134538

Fonte – Auditoria TCDF - Processo 1130/2014 [2016]- Decreto 6.957/2009

Notadamente, o número de doenças relacionadas ao trabalho que devem ser objeto de Notificação Compulsória por transtornos mentais está restrito a 05 (cinco) tipos de doenças ou patologias e 03 (três) por subcategoria, em relação ao total de 53 apresentadas na lista da Auditoria do Tribunal de Contas do Distrito Federal.

Ou seja, por categoria a quantidade de afastamentos corresponde a 42,26%, e por subcategoria a 1,33%, revelando que juntas são responsáveis por 43,60% dos casos de acometimentos com possível relação de causalidade com o trabalho, considerando constarem do Decreto e da Portaria do Ministério da Saúde em comparação com as 4.865 ocorrências registradas.

Em relação aos dias de afastamento do trabalho correspondem a 42,89% das situações identificadas, sendo que 41,25% são relacionados à categoria e o restante, 1,64% responde pela subcategoria, do montante de 313.621 do total de dias.

Por derradeiro, consultamos o sistema Distrital e Federal (Sentinela) sobre as notificações compulsórias registradas, nesse passo, buscamos trabalhar para o presente em relação aos dois fatos em análise sobre Transtornos Mentais e Lesão por Esforço Repetitivo (Tabelas 6 e 7).

Tabela 6 –  Número de notificações de LER/DORT no Distrito Federal de 2006 a 2016

 

UF de Notificação

Ano de Notificação

 

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

2014*

2015*

2016*

Total

Distrito Federal

0

30

85

40

31

3

81

77

36

87

28

498

Fonte: MS/SVS/SINAN (banco atualizado em 23/01/2017)

               

* dados de 2014, 2015 e 2016 sujeitos a revisões.

                 

Tabela 7 –  Número de notificações de TRANSTORNO MENTAIS no Distrito Federal de 2006 a 2016

 

UF de Notificação

Ano de Notificação

 

 

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

2014*

2015*

2016*

Total

 

Distrito Federal

0

0

5

26

0

0

1

4

7

7

0

50

 

Fonte: MS/SVS/SINAN (banco atualizado em 23/01/2017)

           

 

* dados de 2014, 2015 e 2016 sujeitos a revisões.

             

 

                                                   

Procedemos à análise das Portarias do Ministério da Saúde que tinham por objetivo disciplinar a Lei 6.259/1975, em que estabelece o rol de doenças de Notificações Compulsórias desde o exercício de 2004 (Portaria n. 777/2004), atualmente, regulamentada pela Portaria n. 205/2016, entre aqueles quadros selecionamos os dois agravos para análise: Lesões por Esforços Repetitivos/Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (LER/DORT) e Transtornos Mentais relacionados ao trabalho.

Desse total os Acidentes de Trabalho graves registrados (594) não foram contabilizados para efeitos de cálculo, eis que como não há informação se os mesmos são derivados de LER/DORT ou Transtornos Mentais e tendo como enfoque a relação laboral, dessa forma foram excluídos dos acometimentos considerados consensuais, logo, em razão dos acidentes Graves não constarem da lista da LER/DORT e Transtornos Mentais, afastam a sua incidência como mais gravosa, nesse passo um registro exclui o outro.

RESULTADOS

Inicialmente, devemos considerar a Notificação Compulsória consiste em determinação legal, portanto, dever do profissional que realiza o atendimento em fazer consignar nos registros do Sistema de Acompanhamento Sentinela os fatos relacionados às doenças ou patologias, e como se trata de servidores públicos o registro nos assentamentos individuais.

Notadamente, quando se trata de doença laboral e acidente de trabalho se constitui em medida de caráter obrigatório, a sua não emissão viola a legislação (Lei n. 6.259/1975 c/c Lei n. 6.437/1977 e Código Penal), do mesmo modo em relação às Notificações Compulsórias do sistema Sentinela (Portaria 205/2016-MS), bem como os princípios gerais que norteiam a administração pública, bem como cumpre ao gestor do ensino, todavia, não registrado como acidência de trabalho, evidencia-se a problemática levantada nesse artigo.

No tocante aos dados analisados verifica-se quando do atendimento pelo profissional de saúde pelo órgão de educação haveria duas situações distintas que devemos a analisar, a primeira, quando do registro do CID haver-se-ia configurado um acidente de trabalho grave ou acometimento com relação laboral, ambos de notificação compulsória, porém, o profissional público somente pode atuar em conformidade com a lei.

Todavia, em nossa análise encontra-se em de órgão público, considerando o princípio da legalidade do qual o servidor está obrigado a cumprir somente poder-se-á utilizar de registros que cumpram o normativo legal, nesse sentido, selecionamos aqueles estabelecidos pelo Decreto n. 6.957/2009 cujo código, obrigatoriamente, demonstra o possível nexo de causalidade, sem prejuízo de abertura de procedimento de acidente de trabalho para averiguação.

Logo, se o profissional da saúde no momento de seu contato com o educador (professor e orientador) utiliza-se do Código Internacional de Doenças (CID) atribuindo-lhe alguns daqueles definidos pelo Decreto n. 6.957/2009, em tese, reconhece sua relação com as doenças profissionais, pois o de acidente de trabalho grave a notificação é imediata, ainda que haja necessidade de procedimento administrativo de apuração do nexo de causalidade.

Nesse aspecto, haver-se-ia de proceder a uma análise técnico-burocrática do procedimento administrativo após a análise clínico-médico, todavia, quando o sistema educacional utiliza-se do CID previsto no Decreto n. 6.957/2009 deve de imediato afastar ou não o acidente de trabalho, ou seja, ao utilizar o referido código com relação laboral leva-nos a obrigatoriedade de verificar a ocorrência dos Agentes Etiológicos ou Fatores de risco de natureza ocupacional, i.e., acometimento laboral não considerado acidente de trabalho grave.

Outro ponto de extrema importância da análise quando se trata de servidor público, desde o advento da Resolução do Conselho Federal de Medicina (Resolução CFM 1.973/2011), que tratou de regulamentar o profissional da Perícia Médica, a quem após as hipóteses de identificação de possível nexo deve proceder às medidas administrativas à consecução da notificação.

Porém, para análise e compreensão dessa informação de forma precisa devemos compulsar o sistema de notificações compulsórias no exercício de 2013, o órgão de saúde do Distrito Federal ou Ministério da Saúde, todavia, escolhemos o serviço Sentinela no Distrito Federal em relação às Notificações de Agravo a Saúde do Trabalhador, dados esses recolhidas pela LAI entre 2013 e 2017.

Selecionamos para nossa amostragem as Lesões por Esforços Repetitivos/Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (LER/DORT) e Transtornos Mentais relacionados ao trabalho, bem como Acidente de Trabalho Grave, eis que serão necessárias para incluir o excluir as patologias no exercício de 2013 (Tabela 4).

Tabela 4 –  Número de notificações de TRANSTORNO MENTAIS no Distrito Federal de 2006 a 2016

AGRAVOS

ANO – 2013

Acidente de Trabalho Grave

594

LER/DORT

77

TRANSTORNO MENTAL

04

Fonte: Secretaria de Saúde do Distrito Federal - Subsecretaria de Vigilância à Saúde - Diretoria do Centro Distrital de Referência em Saúde do Trabalhador

Todavia, para melhor compreender a forma dos registros no sistema, indagado o Sistema de Controle de Saúde Sentinela do Distrito Federal, em relação ao período de 2013, os dados obtidos pela LAI foi-nos narrado que “as notificações são relacionadas ao Agravo e não ao órgão”, porém, “desse montante teremos apenas 02 casos relacionados a professores [...] sendo 01 no ano de 2012 e outro em 2013” (SECRETARIA SAÚDE, 2014).

Dessa maneira, podemos considerar a existência de apenas um único acometimento de LER/DORT na área do ensino, com isso deveríamos então fazer uma análise pormenorizada dos Acidentes de Trabalho Grave, porém, seu registro é dificultado como se extrai do relatório da Auditoria:

Em relação à incompletude dos lançamentos do campo ‘CID’, a SEDF informou que em cumprimento ao previsto no Código de Ética Médica, o referido campo não é mais alimentado por se tratar de informação sigilosa, de interesse apenas do próprio servidor, tendo em vista que a tela disponibilizada para o lançamento de licenças médicas é compartilhada com setores não pertencentes à área da saúde, quando realizam registros de outros afastamentos. (TCDF, 2014 [2016], p. 593)

Notadamente, a decisão proferida pela Corte de Contas em 2016 em relação a essa restrição afastou a plausibilidade desse recurso de não preenchimento, pois não se coadunaria com a Política de Atenção a Saúde do Servidor (Decreto n. 33.653/2012), utilizando-se de precedentes de julgados, eis que os dados estatísticos para fins de controle governamental devem ser divulgados.

Doenças do Sistema Osteomuscular e Tecido Conjuntivo

Ocorre que devemos estabelecer um consenso entre os dados analisados, desta feita, utilizamos para efeitos de concordância das informações reconhecidas pelo órgão de educação constante da Auditoria do Tribunal de Contas, Decreto n. 6.957/2009 por meio da lista do Ministério da Saúde (2012) que trazem aquelas doenças relacionadas ao trabalho, com os respectivos códigos (CID) – categorias e subcategorias -, estabelecendo a lista consensual de possíveis doenças laborais (Tabela 5).

Tabela 5 –  CID identificados na Auditoria e Decreto 6.957/2009

CID – EDUCAÇÃO – TCDF

Decreto n. 6.957/2009

CID – MINISTERIO SAÚDE

TOTAL DE CASOS

M54

dorsalgia (M54.); cervicalgia (M54.2); ciática (M54.3); lumbago com ciática (M54.4);

1379

M65

 dedo em gatilho (M65.3);  tenossinovite do estiloide radial (De Quervain) (M65.4);  outras sinovites e tenossinovites (M65.8);  sinovites e tenossinovites não especificadas (M65.9)

670

M53

síndrome cervicobraquial (M53.1);

206

M70

bursite da mão (M70.1);  bursite do olecrano (M70.2);  outras bursites do cotovelo (M70.3);  outros transtornos dos tecidos moles relacionados com o uso, o uso excessivo e a pressão (M70.8); transtorno não especificado dos tecidos moles relacionados com o uso, o uso excessivo e a pressão (M70.9);

26

TOTAL

 

2281

Fonte – Auditoria TCDF - Processo 1130/2014 [2016] - Decreto 6.957/2009

Portanto, 2.281 ocorrências de DORT/LER no ano de 2013 são consideradas de forma consensual como relacionados ao Trabalho por figurarem figuram na Lista do Ministério da Saúde, na Auditoria do Tribunal de Contas, e no Decreto n. 6.957/2009, em razão da necessidade de Notificação Compulsória.

Logo, em relação às Doenças LER/DORT, considerando a informação do Ministério da Saúde, daqueles totais de ocorrências identificadas com o respectivo CID, podemos considerar como a hipótese de consenso entre àqueles identificados o total de 2.281 ocorrências como possíveis doenças profissionais.

Porém, o órgão de saúde nos relata que no ano de 2013 houve apenas uma única ocorrência em profissional da Educação registrado como LER/DORT e 77 seriam os totais no Distrito Federal, ou seja, 2.281 ocorrências que podem ser consideradas com relação laboral por força da legislação (Decreto 6.957/2009).

Com o fito de trabalhar com valores consensuais, excluiremos situações de LER/DORT (77) chegando ao total de 2.204 ocorrências sem qualquer forma de contestação, pois atendem aos requisitos do Decreto, a Portaria do Ministério da Saúde e ratificados pela Auditoria, isto é, 58,26% dos registros são de notificação compulsória e correspondem a 45,30% do total geral de doenças inseridas na Auditoria.

Verifica-se na hipótese vertente que não só ocorre a subnotificação, na situação em tela é expressamente verificada a inexistência de registros no sistema sentinela ou qualquer outro mecanismo de controle, cujo principal motivo é revelado pela Auditoria está no argumento do sigilo profissional imposto pelo Código de Ética, fato rechaçado pela decisão de 2016.

Tal argumento não encontra amparo na análise de Políticas Públicas, especialmente, quando se trata de órgão da administração pública, fato demonstrado pela Auditoria Operacional do Tribunal de Contas, não pairando dúvida sobre a omissão e a ausência de responsabilização.

Transtornos Mentais

No tocante aos transtornos mentais relacionados ao trabalho, de acordo com o Sistema Sentinela em relação ao ano de 2013 são apenas 04 notificações registradas, porém, utilizando-se tão somente do Decreto n. 6.957/2009, em relação àquelas patologias que figuram na legislação, chegamos a 3.094 ocorrências, diferentemente dos 04 casos registrados no sistema, todavia, poderiam ou não está figurando como acidente de trabalho.

De acordo com o Ministério da Saúde (2001), o mesmo relacionou alguns acometimentos e seus códigos que tem relação com a saúde do trabalhador, nesse passo, utilizando-se do mesmo procedimento fizemos a comparação com a lista do Tribunal de Contas e Decreto n. 6.259/2009 (Tabela 6).

Tabela 6 –  CID identificados na Auditoria e Decreto 6.957/2009

CID – EDUCAÇÃO – TCDF

Decreto n. 6.957/2009

CID – MINISTERIO SAÚDE

TOTAL DE CASOS

F07

Transtorno orgânico de personalidade (F07.0)

1

F09

Transtorno mental orgânico ou sintomático não especificado (F09.-)

1

F10

Alcoolismo crônico (relacionado ao trabalho) (F10.2)

77

F32

Episódios depressivos (F32.-)

2131

F43

Estado de estresse pós-traumático (F43.1)

856

F48

Neurastenia (inclui síndrome de fadiga) (F48.0); Outros transtornos neuróticos especificados (inclui neurose profissional) (F48.8)

6

F51

Transtorno do ciclo vigília-sono devido a fatores não-orgânicos (F51.2)

12

 

 

3084

Fonte – Auditoria TCDF Processo 1130/2014 [2016]–   e Decreto 6.957/2009

Note-se que a quantidade de ocorrências com códigos similares alcança o número de 3.084 – categoria e subcategoria - excluídos as notificações registradas (04) nesse aspecto são 3.080 ocorrências sem registro, notadamente, o que nos levaria a trabalhar com esse número de ocorrências como hipótese consensual, i.e., 99,5% dos casos são de notificação compulsória e correspondem a 43,60% do total de registros como causas de afastamento.

CONSIDERAÇÕES

Verifica-se, em tese, que os Acidentes Graves de Trabalho, por certo, não se relacionam com LER/DORT e Transtornos Mentais, primeiro, se considerado como acidentes graves não figuram na lista individual, ou seja, um dado exclui o outro.

Por outro lado somente pela análise pormenorizada de cada situação poderia solucionar essa questão, mas como são protegidos pelo sigilo pessoal e não profissional tal informação deve figurar para efeitos de avaliação geral, mas torna imperiosa essa relação, pois havendo doenças laborais consideradas graves entre a LER/DORT e Transtornos Mentais, a grande incidência dessas situações seriam necessárias medidas preventivas.

Os números de acometimentos profissionais são extremamente superiores aos relatados ao órgão de vigilância, logo, não existe registro, fato comprovado pelo sistema de monitoramento, consequentemente, o que indica possível anomalia nos registros que podem ser alterados em futura auditoria.

O fato que existem 4.865 ocorrências de Doenças do Sistema Osteomuscular e Tecido Conjuntivo, e 7.096 registros por Transtornos Mentais, bem como no Sistema de Notificação Compulsória apenas o registro de 77 de LER/DORT e 04 Transtornos Mentais.

Entretanto, estabelecemos como números consensuais aqueles acometimentos – categoria e subcategoria - que figuram na legislação (Decreto 6.259/2009), na Auditoria do TCDF (Processo n. 1130/2014) e na Portaria do Ministério da Saúde (Portaria 205/2016), significa que 58,26% das circunstâncias de LER/DORT e 99,5% os Transtornos Mentais não foram objeto de registro no sistema de monitoramento.

Compulsando as informações colhidas, verificamos que a subnotificação das doenças e agravo do trabalhador indica algumas situações que podem ser evidenciadas a partir dessa análise, a ausência de Notificações Compulsórias de LER/DORT e Transtornos Mentais, notadamente, tem relação com a própria condição de Acidente de Trabalho ou não.

A questão é demasiadamente simples, quando relacionado e admitido à existência de Acidente de Trabalho em relação ao ambiente público de ensino há de se estabelecer o possível nexo de causalidade, portanto, as causas e motivos que levaram a esse acometimento, bem como nexo entre a patologia e a atividade laboral, obrigatoriamente, gera o dever de se fazer medicina preventiva.

Do mesmo modo, como o acidente garante a uma possível indenização, ocorrendo dano à saúde ou mesmo a integridade do servidor, além do risco de diminuição da sua capacidade laborativa, ou seja, a redução de mobilidade, consequentemente, pode influenciar em uma aposentadoria precoce por possível doença profissional.

De igual forma, demonstra que a subnotificação como dever de todos, porém aquele acometido não conhece se a mesma consta ou não do registro de acompanhamento, portanto, impende verificar as razões da ausência de gestão de recursos humanos.

O fato que a subnotificação de acometimentos de doenças laborais compromete o direito à saúde, o profissional da educação, o Estado, ao cidadão e a prestação dos serviços, patente o prejuízo à sociedade como um todo.

O não cumprimento do dever de ofício de registro está sujeito algumas penalidades, desde a infração sanitária, administrativa e violação do Código Penal, da Lei de Improbidade Administrativa e mesma a Lei de Responsabilidade, além das violações de normas internacionais, porém, a ausência de responsabilização são características dessas situações, todavia, não se tem notícia de medida tentando reverter esse fato.

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

ANDRADE, Gabriela Oliveira; DANTAS, Rosa Amélia Andrade. Transtornos mentais e do comportamento relacionados ao trabalho em médicos anestesiologistas. Brazilian Journal of Anesthesiology, Volume 65, Issue 6, November–December 2015, pp. 504-510.

BRASIL. Lei 6.259, de 30 de outubro de 1975. Dispõe sobre a vigilância epidemiológica.

BRASIL. Lei 6.437, de 20 de agosto de 1977. Dispõe sobre a legislação sanitária.

BRASIL. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM 1.973/2011. Especialidades Médicas.

BRASIL. Decreto 6.957, de 09 de setembro de 2009. Dispõe sobre o Regulamento da Previdência Social para aplicação, acompanhamento e avaliação do Fator Acidentário de Prevenção - FAP.

BRASIL. Lei de Acesso a Informação. Protocolo n. 25820000353201733. Informações sobre o Sistema de Vigilância SINAN do Distrito Federal. 2017.

BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria 205, de 17 de fevereiro de 2016. Define a lista nacional de doenças e agravos, na forma do anexo, a serem monitorados por meio da estratégia de vigilância em unidades sentinelas e suas diretrizes.

BRASIL. Ministério da Saúde do Brasil. Organização Pan-Americana da Saúde no Brasil. Doenças relacionadas ao trabalho: manual de procedimentos para os serviços de saúde / Ministério da Saúde do Brasil, Organização Pan-Americana da Saúde no Brasil; organizado por Elizabeth Costa Dias; colaboradores Idelberto Muniz Almeida et al. – Brasília: Ministério da Saúde do Brasil, 2001.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador. Dor relacionada ao trabalho: lesões por esforços repetitivos (LER)/distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT). Brasília: Editora do Ministério da Saúde, 2012.

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Manual de auditoria operacional. Tribunal de Contas da União. 3. ed. Brasília: TCU, Secretaria de Fiscalização e Avaliação de Programas de Governo (Seprog), 2010.

DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Contas do Distrito Federal. Auditoria Operacional. Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal. Processo n. 1130/2014.

DISTRITO FEDERAL. Lei 5.105, de 06 de maio de 2013. Reestrutura a Carreira Magistério Público do Distrito Federal.

DISTRITO FEDERAL. Lei 5.106, de 06 de maio de 2016. Reestrutura a Carreira Assistência a Educação do Distrito Federal.

DISTRITO FEDERAL. Secretaria de Administração Pública do Distrito Federal.  Portaria n. 173, de 25 de setembro de 2013. Consolidação das informações relativas à força de trabalho do Governo do Distrito Federal.

DISTRITO FEDERAL. Memorando 117, de 05 de agosto de 2014. Protocolo da Lei de Acesso a Informação n. 110201471. Quantitativo de registros de LER/DORT no SINAN.

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Volume/Edição

Autores

  • COSTA NETO, Antonio Gomes

Páginas

  • 1 a 10

Áreas do conhecimento

  • Nenhuma cadastrada

Palavras chave

  • Educação; Doenças Profissionais; Subnotificação.

Dados da publicação

  • Data: 19/11/2018
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